São Paulo, 19 - Um novo laudo pericial da Polícia Federal aponta que em quatro contratos vencidos pela Andrade Gutierrez dentro do esquema de cartel e corrupção na Petrobras pode ter havido um prejuízo de R$ 1,98 bilhão. São contratos assinados entre 2006 e 2009 nas refinarias Replan, em Paulínia (SP), Regap, em Minas Gerais, Rlam, na Bahia, e no Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), que analisados dentro de um conjunto de licitações, confirma a cartelização e o favorecimento ao grupo das 16 empreiteiras que fatiavam obras na estatal.
"É possível concluir que as licitações que deram origem aos contratos (...) foram frustradas mediante a atuação direta do cartel composto pela organização criminosa denominada 'Clube dos 16'. Esses contratos, vencidos pela Construtora Andrade Gutierrez (isoladamente ou consorciada a outras empresas), ocasionaram, em valores atuais, um prejuízo direto de R$ 1.983.185.853,45 à estatal", informa o laudo 158/2016.
O prejuízo direto é "decorrente de propostas com preços artificialmente majorados" informa o documento, datado de 2 de fevereiro e foi anexado nesta segunda-feira, 18, ao inquérito que investiga a participação da Andrade Gutierrez no esquema de cartel e corrupção. Os executivos da empreiteira fecharam neste mês acordo de delação premiada com a Procuradoria Geral da República.
"Nas licitações contaminadas pelo cartel há forte tendência de que a empresa escolhida para ser a vencedora tenha como alcançar o maior valor de contrato". O valor do prejuízo não inclui ainda o que os peritos chamam de prejuízo residual e prejuízo indireto. O primeiro referente ao aumento geral dos preços no mercado, provocado pela cartelização, e o segundo gerado pela falta de competitividade e a decorrente queda na qualidades dos serviços.
"O presente trabalho demonstrou que há evidências suficientes para concluir que o chamado 'Clube dos 16' atuou em cartel para elevar artificialmente seus lucros em licitações da Petrobras", informam os peritos criminais Fábio Augusto da Silva Salvador, João José de Castro Baptista Vallim e Regis Signor.
O documento analisou possibilidade de sobrepreço nos contratos e pagamentos para empresas que podem ter ocultado propina. São contratos realizados via setor de Engenharia da Petrobras, que era uma área controlada pelo PT, segundo descobriu a Lava Jato. Os peritos analisaram licitações vencidas pela Andrade Gutierrez, individualmente ou em consórcio, no período entre 2003 e 2014, com valores de contrato acima de R$ 100 milhões.
O prejuízo apontado trata de apenas quatro contratos que somados chegam ao valor total de R$ 4,76 bilhões - um contrato na Refinaria Gabriel Passos (Regap), em Minas Gerais, um contrato na Refinaria de Paulínia (Replan), em São Paulo, um na Refinaria Landulpho Alves (Rlam), na Bahia, e um contrato no Comperj, no Rio.
"Este superfaturamento potencial pode ter sido transformado em lucro excessivo, pagamento de propinas, repasses a empresas do grupo cartelizado, contrato de consultorias fraudulentas e até mesmo consumido por má gestão contratual das empresas executoras dos contratos destacadas, uma vez que a Petrobras podem ter deixado de contratar empresa mais competitiva para cada obra."
Na análise, os peritos identificaram o comportamento esperado para os preços oferecidos em licitações de "ampla concorrência" e também de licitações "restritas ao Clube dos 16". A conclusão é de que "o comportamento de um grupo difere estatisticamente do comportamento de outro, fato fundamental para embasar a concluso de que as licitações 'restritas ao Clube dos 16' são cartelizadas e visam aumentar artificialmente os preços das obras". "Confirmando o teor das delações premiadas amplamente divulgadas."
Em depoimento prestado na semana passada na Justiça Federal no Rio, o ex-presidente da Andrade Gutierrez Otávio Marques Azevedo - mais novo delator da Lava Jato - confessou que a empreiteira pagava propinas, em média de 1%, nos contratos com o governo federal. O laudo anexado ao inquérito que investiga a empreiteira em Curitiba - sede da Lava Jato - ajudará a embasar documentalmente as confissões dos empreiteiros e confrontar dados.
"Considerando o resultado do teste estatístico, os peritos concluem que os dois grupos de licitações são efetivamente diferentes e não representam o mesmo fenômeno. Esta comprovação estatística, aliada às demais características já descritas para as licitações 'restritas ao Clube dos 16', leva os peritos a concluir que a hipótese de cartel está comprovada", informa o laudo 158/2016.
"A maioria das licitações apresentadas acima contém propostas de preços bastante elevadas em relação aos valores estimados pela Petrobras. Esse cenário é condizente com a hipótese de formação de conluio entre as empresas concorrentes no intuito de fraudar as licitações da estatal."
Dois laudos anteriores sobre as obras da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e Comperj, tomados como base para essa nova análise, haviam apontado sobrepreço de até 28,5% e 35% em contratos, nas respectivas obras.
"O Laudo 157/2016-SETEC/SR/DPF/PR apontou sobrepreço de 35% na contratação do Consórcio TE-AG para construção da Unidade de Coqueamento Retardado do Comperj, decorrente de preços artificialmente majorados", ressaltam os peritos.
Ao todo, a PF analisou contratos em que a Andrade Gutierrez participou que totalizaram R$ 7,2 bilhões - R$ 1,54 bilhão em contratações diretas e R$ 5,6 bilhões por meio de consórcios. No laudo 158/2016 foram considerados apenas alguns desses contratos, para comprovação de cartel e fraude nos contratos.
Procurada por meio de sua assessoria de imprensa, a Construtora Andrade Gutierrez informou que não comentaria o caso.