A decisão do presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), de acatar o recurso da Advocacia-Geral da União (AGU) anulando a sessão em que o impeachment de Dilma Rousseff foi aprovado, reacendeu o debate entre juristas sobre a tramitação do processo. O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), ironizou a postura de Maranhão. “É mais uma ‘Operação Tabajara’. Se não fosse um ato circense, seria realmente um ato criminoso, de tentativa de fraude”, criticou. Para ele, “não faz sentido” um presidente da Câmara revogar a decisão tomada pelo plenário da Casa.
A decisão de Maranhão terá de ser cassada pelo plenário da Câmara ou pelo STF, sob pena de gerar nulidade do processo. Esta é a avaliação de alguns juristas. Sem consenso, outros constitucionalistas sustentam que o ato de Maranhão foi precluso, fora do tempo, portanto sem consequência. As opiniões se dividem. “A decisão de Maranhão foi proferida fora do prazo. Uma vez aprovado o parecer da comissão especial pelo plenário da Câmara dos Deputados, a acusação foi entregue ao presidente do Senado. A partir deste momento, qualquer deliberação sobre o processo e de eventuais irregularidades passa a ser competência do Senado”, diz o constitucionalista José Alfredo Baracho Júnior, professor da PUC Minas.
Avaliação semelhante manifesta o professor de direito constitucional da PUC-SP Marcelo Figueiredo, para quem a decisão de Maranhão se caracterizaria como “ato inexistente” e não teria valor legal: “Maranhão não poderia ter tomado esta decisão, porque ele não pode se sobrepor ao plenário da Câmara. É um ato inexistente, e atos inexistentes são inconstitucionais”. De acordo com o professor, o Senado pode prosseguir com o processo de impeachment.
Mas esta não é a opinião do professor universitário e constitucionalista Ronaldo Garcia, para quem a decisão do presidente interino da Câmara só pode ser derrubada pelo plenário da Câmara ou pelo Supremo Tribunal Federal. “Se o Senado ignorar essa decisão, vai gerar nulidade do processo de impeachment”, considerou Garcia. Segundo ele, não há preclusão, porque o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha, não apreciou o recurso da AGU apresentado em 25 de abril. “Não há preclusão em ato que não foi decidido anteriormente. Mas houve perda de objeto na decisão que deu, tendo em vista que a Câmara já decidiu. Mas o nó precisa ser desfeito, pois a decisão é válida enquanto não for derrubada. “Se Renan Calheiros ignorar, passar por cima, lá na frente poderá ser arguida a nulidade do processo no Senado”, acrescenta.
Opinião semelhante manifesta Leonardo Yarochewsky, advogado e professor de direito da PUC Minas. A decisão do Maranhão tem de ser resolvida. Para um lado ou para outro. Se vai manter ou se vai anular, mas tem de ser resolvido pelo STF. O Senado não pode prosseguir até que a questão seja resolvida”, considera. Para ele, os fins não podem justificar os meios. “Isso é sagrado dentro do processo legal. O caminho previsto em lei no estado democrático de direito tem de ser preservado independentemente de quem seja. Caso contrário se abre um precedente”, afirma, criticando o fato de o recurso da defesa não ter sido apreciado antes.
Diferentemente, Gustavo Rabay, advogado constitucionalista, entendeu ser a decisão de Maranhão “estapafúrdia” e “autoritária”, criticando, inclusive, o fato de Maranhão, na condição de interino, tomar decisão desta natureza. “Não existe previsão de ato individual, unilateral, tendo o condão de anular todo um processo que teve a votação de mais de dois terços da Casa. Não pode, ele [Maranhão] não sucede Eduardo Cunha. Ele foi votado como primeiro vice-presidente. Ele nem sequer é o presidente sucessor, é o presidente interino”, afirmou. Rabay acrescentou: “A decisão é extemporânea. Aguardou-se a remessa para o Senado para só então tentar essa manobra espúria de apontar um vício formal que não se sustenta”, disse.