Em dia histórico, o Brasil não parou

População manteve a rotina, embora no Senado ocorriam os debates que culminariam na saída da presidente da República

Eduardo Tristão Girão
Ontem não foi um dia fácil, nem para o Batman.
O manifestante que se vestiu como o super-herói, no Centro do Rio de Janeiro, resolveu circular entre apoiadores da Frente Brasil Popular e acabou escoltado pela Polícia Militar, pois não apenas defendia o impeachment, como provocava a facção contrária. Incidentes como esse pipocaram pelo país, inclusive em São Paulo, onde a PM também precisou intervir, e em Belo Horizonte, que teve engarrafamento, protestos paralelos e clima tenso em torno do acampamento dos manifestantes pró-Dilma na Praça da Liberdade.

Não era domingo e a votação no Senado estava prevista para acontecer de madrugada. Talvez por isso aquela sensação de “o Brasil parou” não tenha sido tão intensa como no dia 17 do mês passado, quando a Câmara dos Deputados autorizou a abertura do processo de impeachment contra a presidente. Essa quarta-feira não deixou de ser um dia histórico para o país, mas o brasileiro pouco alterou sua rotina. Houve mobilizações significativas por toda parte, é claro, embora em menor proporção, com menos foguetório.

Em Brasília, por exemplo, o número de manifestantes (contra e a favor do impeachment) que deram as caras na Esplanada dos Ministérios foi menor do que o visto no dia da votação na Câmara dos Deputados. Nem telão do lado de fora, para acompanhar o debate, tinha. Nos gabinetes, assessores e ministros passaram o dia organizando mudança no Planalto.
Malas, caixas e sacos de lixo com papéis picotados eram levados a toda hora.

Nas redes sociais, política foi o assunto do dia e, além dos habituais “comentaristas de plantão”, não faltaram piadas e memes de ambos os lados. Nesse sentido, o ápice foi, sem dúvida, o dente de Renan Calheiros (PMDB-AL). Ou seria um chiclete?

Durante coletiva de imprensa concedida durante o segundo intervalo da sessão, por volta das 18h, o presidente do Senado deixou escapar da boca pequeno objeto branco, logo identificado como dente pela imprensa. Na sequência, vieram as ponderações: poderia ser apenas uma goma de mascar. Não se chegou a uma conclusão até o fim da noite de ontem e tampouco houve fala oficial sobre o incidente. Pausa feita, a vida seguiu.

Naquele momento, pouco mais de 20 dos 68 senadores inscritos haviam se pronunciado. Cada um deles teve direito a falar na tribuna do Senado por até 15 minutos. De fato, foi um dia longo e o atraso de uma hora no início da sessão (inicialmente prevista para 9h) foi um dos fatores que fizeram Calheiros prever que os trabalhos avançariam pela madrugada, contrário sua própria previsão de encerramento às 22h.

Um dos motivos do atraso foi a tentativa do governo de anular o processo de impeachment ao impetrar mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) – a Advocacia-Geral da União (AGU) pediu suspensão da votação de ontem. Esperava-se que a decisão do ministro do STF Teori Zavascki fosse divulgada antes mesmo das 9h, o que não ocorreu. A manobra governista foi frustrada e esse foi apenas um dos lances que fizeram de ontem não apenas um dia agitado, mas tenso.

Paralelamente, por exemplo, o presidente interino da Câmara dos Deputados, Waldir Maranhão (PP-MA) continuou resistindo em renunciar à vaga que ocupou em função do afastamento de Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Constrangimento geral foi causado por ele ter anulado as sessões do processo de impeachment na Câmara dos Deputados, e, depois, anulado esta anulação – tudo ocorreu esta semana. Negocia-se que ele peça licença do cargo para assumir secretaria no Maranhão e é provável que ele se pronuncie hoje.

No fim da noite, já eram 70 os senadores inscritos para a tribuna e pouco mais da metade deles havia se pronunciado. A essa altura, o dólar havia fechado em queda em relação ao real (R$ 3,4456 na venda) pelo segundo dia consecutivo.
Na opinião de alguns especialistas, caso Michel Temer assuma a Presidência, o mercado financeiro reagiria de forma positiva, especialmente por causa da indicação do ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, para o Ministério da Fazenda..