Brasília - A presidente Dilma Rousseff começa a escrever hoje nova fase da sua história. Ex-guerrilheira, torturada na ditadura militar e primeira mulher a comandar o país, a petista inclui em seu currículo o afastamento do Palácio do Planalto por até 180 dias, enquanto senadores analisam o mérito do seu processo de impeachment. Antes de deixar o Palácio do Planalto, onde ficou por 1.978 dias no poder, ela fará pronunciamento assim que for notificada pelo Senado, no Salão Leste do Palácio. Em seguida, deixará o prédio e se juntará aos manifestantes em frente ao palácio. A previsão inicial do Senado é de que Dilma seja notificada oficialmente do afastamento às 10h, no gabinete presidencial, no terceiro andar do palácio. O documento com a informação de que ela fica afastada será levado, para sua assinatura, pelo primeiro-secretário do Senado, Vicentinho Alves (PR-TO). Em seguida, Dilma autorizará a divulgação de pronunciamento gravado nessa quarta-feira (11) no Palácio da Alvorada. Inicialmente, havia o interesse de o vídeo ir ao ar em cadeira nacional de rádio e TV.
Dilma deixará o Palácio do Planalto acompanhada dos ministros e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Não descerá a rampa presidencial, como estava previsto. Sairá pela porta do térreo e seguirá, no comboio presidencial, em carro fechado, até o Palácio da Alvorada, acompanhada dos ministros mais próximos. O vice-presidente Michel Temer (PMB-RJ) deve ser notificado pelo Senado às 11h. Em seguida, ele assume o governo por até 180 dias, prazo em que Dilma será julgada pelo Senado. Ele dará posse aos ministros e fará pronunciamento à tarde. Temer quer evitar um vácuo de poder e se apresentar à população brasileira com um discurso em que tentará passar confiança ao mercado e aos beneficiários dos programas sociais do governo. Mas só deve fazer o pronunciamento no Planalto - também à imprensa, sem valer-se da rede nacional de rádio e TV oficialmente - depois que a presidente deixar o palácio. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, que será o condutor do processo no Senado, deve ir hoje à tarde ao Senado, onde receberá do presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), a presidência de todos atos do processo de impeachment. Vai nomear dois assessores do STF para serem auxiliares oficiais dele na condução do processo.
Segundo a Secretaria de Comunicação do Planalto, o pronunciamento da presidente será no menor salão para cerimônias no palácio: o Salão Leste. Estava prevista também uma caminhada de Dilma, assessores e militares do Planalto até o Palácio da Alvorada, que se transformará em bunker de resistência da petista, mas a ideia foi descartada. Na reunião ministerial dessa quarta-feira (11), ficou definido que Dilma vai exonerar hoje todos os ministros, secretários-executivos e secretários nacionais.
EQUIPE Na residência oficial, a presidente deve contar com uma equipe a acompanhar suas atividades até o julgamento do mérito no Senado. Na comunicação, estarão o jornalista Olímpio Cruz e o fotógrafo Roberto Stuckert. Também continuarão com Dilma Sandra Brandão, conhecedora de todos os números de programas do governo, o assessor especial Bruno Monteiro; e o subchefe de assuntos jurídicos da Casa Civil, Jorge Messias, que teria levado o termo de posse ao ex-presidente Lula, conforme gravação da Polícia Federal. A expectativa é que a edição do Diário Oficial da União (DOU) de hoje traga cerca de 700 exonerações.
SEM APARIÇÕES Nessa quarta-feira (11), Dilma evitou aparições públicas, enquanto o Senado realizava a sessão que discutiu seu afastamento. Ao longo de um dia de tensão, a presidente só foi flagrada pelas câmeras de fotógrafos e cinegrafistas às 7h25, quando caminhou pelo bosque do Palácio da Alvorada, e às 19h, apareceu na vidraça de seu gabinete de trabalho no Palácio do Planalto ao lado do ministro Jaques Wagner, do Gabinete Pessoal da Presidência. Enquanto a discussão do impeachment avançava no Congresso, Dilma recebeu poucos auxiliares. Estavam entre eles, além de Wagner, o ministro José Eduardo Cardozo, da Advocacia-Geral da União, e o assessor especial Giles Azevedo, aliado fiel da petista. Como de costume, Dilma acordou cedo, mas não fez o habitual passeio de bicicleta matinal com seguranças pelas pistas nas proximidades do Alvorada. Ela se limitou a caminhar na área verde em volta do palácio. Estava acompanhada apenas pelo chefe de sua segurança e um outro auxiliar.
Diferentemente dos dias de discussão de seu afastamento pela Câmara e da sessão em que os deputados deram o primeiro aval pela admissibilidade do processo de impeachment, em 17 de abril, Dilma preferiu evitar visitas e conversas prolongadas com aliados e interlocutores. Simpatizantes da presidente e militantes do PT tampouco apareceram nas vias de acesso ao Alvorada. A residência oficial tornou-se um lugar de absoluto isolamento. Desde o fim do mês passado, os dois acessos ao Alvorada foram bloqueados pela segurança da Presidência em trechos a cerca de um quilômetro da portaria principal. Isso impediu o acesso de jornalistas à sala de imprensa existente no local. Fazer imagens da presidente ou dos visitantes do palácio exigiu câmeras de alta aproximação. O esquema de segurança também fechou a Praça dos Três Poderes. O clima de feriado, com as pistas em volta sem carros e pedestres, porém, contrastou com o tumulto e os engarrafamentos de vias de outras áreas da capital federal. Durante todo o dia, Brasília se dividiu em duas cidades, com uma região agitada e congestionada, mas sem grandes manifestações políticas, e outra silenciosa, quase bucólica..