Michel Temer empossou novos ministros na quinta-feira, ao assumir a Presidência da república depois do afastamento de Dilma Roussef - Foto: Dida Sampaio / Estadão Conteúdo - 12/5/16
Em meio à polêmica sobre a ausência de mulheres no primeiro escalão do governo e do fim do Ministério da Cultura (Minc), o governo Temer decidiu criar uma Secretaria Nacional de Cultura ligada à Presidência da República e tem avaliado nomes femininos para comandá-la. Adriana Rattes, ex-secretária de Cultura do Estado do Rio de Janeiro e ligada ao PMDB, é uma das cotadas. Extinto na quinta-feira, o ministério foi transferido para a Educação, sob o comando de Mendonça Filho, da cota do DEM. No entanto, diante da forte reação da classe artística, o presidente em exercício Michel Temer (PMDB) recuou da decisão formalizada em medida provisória.
De acordo com o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, a nova secretaria não terá status de ministério, embora vinculada diretamente à Presidência da República. O ator Stepan Nercessian havia sido sondado para assumir a pasta, mas foi preterido pela necessidade do governo de ter uma representação feminina. Na sexta-feira, Mendonça Filho foi hostilizado ao se apresentar a servidores do MinC , que o chamaram de “golpista” e cobraram a volta de uma pasta dedicada à cultura. Uma carta foi divulgada pela Associação Procure Saber e pelo Grupo de Ação Parlamentar Pró-Música (GAP) – compostos por vários artistas famosos – em repúdio ao ato do governo.
Antes do recuo do governo, especialistas ouvidos pelo EM avaliaram a composição do ministério de Temer. Eles divergem sobre o significado das escolhas feitas e explicam as possíveis consequências das mudanças anunciadas até o momento.
“Ministérios carregam muita simbologia e nesse aspecto o gabinete de Temer sinaliza para a baixíssima diversidade”, observa o especialista em ciência política e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Michael Mohalle. Para a coordenadora do Grupo de Pesquisa sobre Democracia e Desigualdades (Demodê), Flávia Biroli, professora de ciência política da Universidade de Brasília (UnB), as indicações do presidente em exercício mostram não ter havido “preocupação com as demandas da sociedade civil organizada”, o que pode ser interpretado como “um recado sobre a condução do governo, indicando falta de diálogo e de representação feminina”.
As articulações feitas por Temer na tentativa de atenuar a crise política explicariam a baixa diversidade, na opinião do cientista político João Paulo Peixoto, coordenador do Núcleo de Estudos em Gestão Pública (Negep) da Universidade de Brasília (UnB). “Ele montou os ministérios buscando essencialmente apoio político, que é o que mais vai precisar neste momento”, avalia. “Não acho que levou em consideração questões como gênero e etnia. Para avaliar se houve retrocesso, precisamos esperar o que Temer fará em termos de políticas públicas para as mulheres”, defende.
A fusão de educação e cultura, anunciada inicialmente, foi considerada controversa. “Cultura faz parte da educação, acho apropriado, facilita a integração de políticas públicas”, destaca Peixoto. Para Flávia Biroli, a incorporação mostrava o “claro encolhimento da importância de algumas temáticas como cultura, educação e direitos humanos”.
Entre as mudanças ministeriais, o desmembramento da pasta do Trabalho, que passa a responsabilidade pela Previdência para o Ministério da Fazenda está entre as mais polêmicas. A intenção do ministro da Fazenda em exercício, Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central, é garantir que as regras para a aposentadoria no Brasil sejam de fato endurecidas. Centrais sindicais criticam a mudança e alertam que uma associação entre os ministérios prejudicará os trabalhadores brasileiros.
O cientista político Marco Aurélio Nogueira, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), destaca que a decisão “sugere que o controle previdenciário será estritamente fiscal”. Nogueira vê a mudança com preocupação e diz que “mexer em uma área tão delicada da vida brasileira pode desencadear desequilíbrios”. Ele ressalta que a medida “parece pouco inteligente para um governo que precisa ganhar a opinião pública”.
EDUCAÇÃO O ministro da Educação é Mendonça Filho, eleito deputado federal pelo DEM, partido que recorreu à Justiça para barrar o sistema de cotas em instituições de ensino e a manutenção do Programa Universidade para Todos (ProUni), que oferece bolsas a estudantes de baixa renda. Conhecido em Pernambuco, seu estado natal, como Mendoncinha, ele foi governador entre 2005 e 2006, quando substituiu Jarbas Vasconcelos (PMDB). É herdeiro de agroindústrias e ficou conhecido por ser o autor da proposta de emenda constitucional (PEC) que instituiu a reeleição para cargos do Executivo a partir de 1998.
No Ministério da Justiça, agora Justiça e Cidadania, que incorporou a pasta das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos, o comando é de Alexandre de Moraes (PSDB), ex-secretário de Segurança Pública de São Paulo.
O novo ministro foi envolvido em polêmicas pela atuação violenta da polícia do estado, apesar de São Paulo ter assistido melhorias nos índices de segurança. “Há críticas sobre a forma como os dados de segurança foram computados e sobre a conduta policial em casos que ficaram famosos, como o da desocupação da Assembleia Legislativa e de escolas públicas e os casos de execuções de suspeitos conduzidas por membros da corporação”, destaca Mohalle. “Mas em relação à Lava-Jato, principal preocupação da oposição a Temer, não há indicativo de que será leniente ou tentará interferir no trabalho da Polícia Federal”, completa. (Com agências)
Empossados de olho nas urnas
O ministério formado pelo presidente em exercício Michel Temer será marcado pelas pretensões eleitorais. Dois dos 23 ministros recém-empossados almejam ocupar o principal gabinete do Palácio do Planalto e pelo menos outros 13, que saíram do Congresso, devem tentar renovar os mandatos de deputado ou senador ou planejam voos mais altos. Duas vezes candidato ao Planalto, o novo titular do Itamaraty, José Serra (PSDB), segue como uma das opções tucanas para a disputa presidencial de 2018, ao lado do senador Aécio Neves (MG) e do governador Geraldo Alckmin (SP), ambos também com uma candidatura nacional no currículo. Peemedebistas não descartam um cenário em que, caso Serra seja preterido na disputa interna do PSDB, o ministro migre para o PMDB e seja o nome à eventual sucessão de Temer com respaldo do Planalto. Na busca de apoio para a aprovação do impeachment, o presidente em exercício declarou publicamente que não será candidato à reeleição se efetivado no cargo.
Outro nome que pode despontar como futuro candidato ao Planalto é o homem forte da Fazenda na gestão Temer. Se conseguir reaquecer a economia e apresentar bons indicadores, Henrique Meirelles terá condições políticas de colocar seu nome como opção para a corrida presidencial. O ex-presidente do Banco Central do governo Lula atualmente é filiado ao PSD, pelo qual cogitou disputar a Prefeitura de São Paulo, em 2012.
Em 2010, então filiado ao PMDB, Meirelles chegou a ser cotado para vice de Dilma. Na equipe de Temer há também ministros que já foram ou querem ser governador em seus estados. O titular da Educação e Cultura, deputado Mendonça Filho (DEM), já ocupou a chefia do Executivo em Pernambuco, após a renúncia de Jarbas Vasconcelos (PMDB), e agora traça planos para chegar ao cargo pela via eleitoral. Outra opção é se candidatar ao Senado em uma aliança com o atual governador, Paulo Câmara.
Outro pernambucano, o tucano Bruno Araújo, titular da pasta de Cidades, está no terceiro mandato como deputado federal e, antes de ser escolhido ministro já havia manifestado a vontade de tentar uma candidatura ao Executivo, mesmo que corra o risco de ficar sem mandato a partir de 2019. Filho do senador Jader Barbalho (PMDB-PA), o ministro da Integração Nacional, Helder Barbalho, disputou o governo paraense em 2014 e deve tentar o posto novamente daqui a dois anos. Situação semelhante à do titular do Turismo, Henrique Alves, que foi derrotado na disputa pelo governo do Rio Grande do Norte em 2014 e já é virtual candidato em 2018. Outro peemedebista, Geddel Vieira Lima, da Secretaria-Geral de Governo, não conseguiu chegar ao Senado em 2014, mas em 2018 pode tentar o Executivo baiano. Aliado do governador Geraldo Alckmin, o ministro da Justiça, Alexandre Moraes, se filiou em 2015 ao PSDB com a intenção de disputar a Prefeitura de São Paulo. Não conseguiu se viabilizar, mas é considerado por tucanos paulistas como opção para a sucessão no Palácio dos Bandeirantes. Na equipe ministerial de Temer, outro nome que almeja o governo paulista é Gilberto Kassab (PSD), que foi titular de Cidades com Dilma e agora comanda a pasta da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações.
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