Eliseu Padilha diz que não haverá aumento de impostos

Ministro da Casa Civil lista reformas da Previdência e trabalhista como prioridades para governo

Ana Dubeux Denise Rothenburg Ivan Iunes Leonardo Calvacanti
"Em relação a ela (Dilma), tenho um respeito pessoal. E, como diz o presidente Michel, além de um respeito pessoal, um respeito institucional" - Foto: Minervino Júnior/CB/D.A Press

“O diabo sabe não porque é sábio, o diabo sabe porque é velho.” Com a foto oficial de Dilma Rousseff adornando o gabinete do 4º andar do Palácio do Planalto, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, 70 anos, saca a frase do poeta argentino José Hernández para explicar as diferenças entre o governo da petista e o do recém-inaugurado por Michel Temer. Com o círculo próximo formado em sua maioria por políticos experientes, alguns nessa casa dos 70 anos, Temer aposta em nomes escaldados no Congresso, como Padilha, para vencer o principal problema da gestão passada: o relacionamento com a Câmara. “Não sou um aprendiz nesse tema”, afirma.

A experiência política tem que promover resultados em um curto espaço de tempo. Em entrevista ao Correio Braziliense/Estado de Minas, o gaúcho de Canela garante que não haverá criação imediata de um imposto ou aumento de carga tributária, mas enumera prioridades econômicas e reformas necessárias – como a previdenciária e a trabalhista – tão urgentes quanto dependentes da colaboração dos parlamentares.

Não por acaso, Temer teve de assentir, meio a contragosto, André Moura (PSC-SE) na liderança do governo na Câmara, “uma indicação da maioria dos líderes”. O político é o principal aliado do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, na Casa. “Quem não admitir que Eduardo Cunha é o principal eleitor da Câmara está enganado”, avalia Padilha, lembrando, entretanto, que “a influência de Cunha no Legislativo não tem reflexo no Executivo”.


Sobre o retrato de Dilma com a faixa presidencial, Padilha é taxativo: “Hoje, ela ainda é presidente da República”. Porém, considera difícil o retorno: “Tivemos mais de dois terços. Do garçom ao empresário, há um sentimento de alívio pela mudança”.

Durante a entrevista, Padilha garantiu que a Cultura não voltaria a ser uma pasta, inclusive deu a resposta com base em pesquisas de opinião que mostravam apoio da população à medida. Ontem à tarde, no entanto, o governo divulgou que o Ministério da Cultura será recriado. Leia, a seguir, os principais trechos:

Na primeira semana, qual foi o principal problema que o governo Michel Temer encontrou?
Quando se toma posse sem o processo de transição em que não há o repasse de informações, não é a situação desejável. Mas temos experiência. E aí vale se lembrar da frase do personagem Martin Fierro: “El diablo sabe por diablo pero más sabe por viejo”. Já passei por vários ministérios, por secretarias de Estado, foram anos dentro da Câmara convivendo com o processo legislativo. A gente sabe onde buscar as informações. Quando você não as tem em um órgão, como é o nosso caso, que é intermediador, busca-se na ponta. Mas, em muitas áreas aqui da Casa Civil, encontramos, sim, informações. Por exemplo, no caso da Olimpíada, tem aqui, na Casa Civil, e lá no Ministério do Esporte, uma equipe. As pessoas permaneceram e têm a memória por inteiro da Olimpíada. Ela não está só nos subsidiando, como está na condição de ser norteadora do processo.

Henrique Meirelles afirmou que também não teve problemas em obter informações. Existia um receio de o governo Temer ser sabotado?
Como regra geral, não.
Talvez, em algum ministério, houve. Parto do pressuposto de que o servidor de carreira não serve ao partido do governo. Ele serve ao Estado, e daí o compromisso com a manutenção das informações, inclusive, para manutenção da própria carreira. Aqui, no meu caso, as únicas áreas em que trouxemos as pessoas são a comunicação social e a jurídica. Portanto, dei e dou preferência absoluta ao servidor de carreira e, com isso, a gente tem a memória mais ou menos garantida. Encontramos muito melhor do que acabamos sendo induzidos a pensar – algo fruto da guerrilha, da luta política que se estabeleceu.

Houve uma reação muito forte em relação à ausência de mulheres, de negros…
Deveremos ter no curso da implantação do governo a representação desses segmentos que, em um primeiro momento, aparentemente, não foram indicados pelos partidos. Agora, chegou a vez de o presidente, na disponibilidade que ele tem, de todos os cargos do Poder Executivo, fazer solicitações como fez, no caso das mulheres. Acabamos tendo mulheres brilhantes ingressando em postos da mais alta relevância. Teremos agora também a questão dos negros. Seguramente, vamos ter participação no Ministério da Justiça, em posição de relevância.
Então, aquilo que não foi possível fazer por meio das indicações políticas num primeiro momento, o presidente determinou que fosse corrigido progressivamente para que a gente tivesse todos os segmentos da sociedade representados. Mas os clássicos, que foram esses referidos, a gente terá. Por exemplo, aqui na minha equipe de subchefe da Casa Civil e adjuntos, tenho maioria esmagadora de mulheres.

Alguns ministros, como o da Saúde e Justiça, deram declarações que acabaram desautorizadas.
Eu recebi do presidente Michel a delegação de, nesses casos, contatar os ministros. Então, eu talvez tenha elementos que não são tornados públicos com relação a isso. Mas eu posso garantir que os ministros, nas declarações que fizeram, tinham suas convicções sob o ponto de vista técnico, que, em tese, a gente poderia até discutir publicamente, e eles talvez conseguissem convencer de que estavam acertados naquilo que disseram, e na forma como disseram. Em um caso, a declaração foi vista como sendo uma tentativa de enfrentamento a uma organização. Em outro, o que o ministro da Saúde quis dizer é que tinha que fazer com que o SUS, com o tamanho que tem, atendesse mais, e que tem que reduzir o custo. Eu conversei com ele e disse que foi mal interpretado. Só que, às vezes, tem a forma como a gente vai dizer determinadas coisas dada a ânsia. Mas é melhor que a gente consiga segurar uma declaração que possa permitir uma interpretação dúbia. Mas isso a gente vai aprendendo. E posso garantir que o que se constatou até agora foram pequenas derrapadas de interpretação.

Ministro, a foto de Dilma ainda está na parede do gabinete...
Nenhum problema. Primeiro que ninguém registrou nenhuma manifestação minha que fosse contrária à presidente Dilma, inclusive, tenho gratidão a ela pela distinção que me deu, pela distinção com a qual sempre me tratou nas nossas relações. No dia em que eu pedi para ser exonerado, ela compreendeu completamente as minhas razões, o clima foi de pessoas que se tornaram amigas. Então, em relação a ela, tenho um respeito pessoal. E, como diz o presidente Michel, além de um respeito pessoal, um respeito institucional. A foto é uma iniciativa que eu considero de absoluto respeito institucional, hoje ela ainda é presidente da República.

Dilma tem chances de retornar?
Sob o ponto de vista jurídico, é plenamente possível. Sob o ponto de vista político, é extremamente difícil. Tivemos, na Câmara, mais de dois terços. Tivemos a primeira etapa no Senado com mais de dois terços e nós temos um número considerável de votos que não tivemos na votação e que teremos agora no Senado. Vamos aumentar o número de votos, isso por um lado. Por outro lado, a gente nota que, do garçom ao grande empresário, há um sentimento de alívio pela mudança. Queremos fazer com que esse alívio se converta em esperança e em constatação de que se tem rumo, daí o quadro que está sendo montado pelo presidente Michel. Estamos vendo crescer esse sentimento original de que mudou e está melhorando.

Nesses primeiros movimentos do Congresso agora, como a escolha do líder, por exemplo, Eduardo Cunha mostrou força...
Quem não admitir que o Eduardo Cunha ainda é o maior eleitor da Câmara está enganado, ele é sim. Se isso é o bastante para garantir a ele a continuidade da Presidência da Câmara, o tempo mostrará. Se isso será o suficiente para garantir a ele a vitória no Conselho de Ética, o tempo vai mostrar. O que eu sei é que a influência dele no Legislativo não tem reflexo no Executivo, onde ninguém pode colocar em dúvida a liderança total do presidente Michel Temer.

Não há indicação de Cunha no governo?
Não conheço nenhuma indicação dele. Ele mesmo disse que não tem um alfinete dentro do governo.

Como o André Moura ganhou a liderança do governo?
André Moura não é integrante do governo, é um deputado escolhido pela maioria da base e converteu-se no líder do governo lá, na Câmara.

Para aprovar as reformas da Previdência e trabalhista é preciso maioria.
A gente propôs às centrais sindicais a discussão concomitante dos temas. Na última reunião do grupo de trabalho, foi solicitado que a gente não discutisse ao mesmo tempo os dois temas. Então, estabelecemos um cronograma. O pressuposto desse grupo de trabalho é que o governo não quer nem apoio nem adesão a um projeto que o governo tenha. O governo não tem projeto nenhum e as centrais, se tiveram, também a partir daquele momento (da primeira reunião) não tinham projeto nenhum. Qual é a nossa pretensão: é de, com muitas mãos, construir de forma colegiada o que vai ser um projeto que já estará aprovado por aqueles segmentos que aqui estarão representados.

Ou seja, juntar centrais, empresários...
Empresários, governo, deputados... O presidente Michel Temer pediu a indicação de parlamentares. Por quê? O PSD mineiro, entre 1940 e 1970, se celebrizou pela frase: “A gente combina tudo e depois reúne”. Queremos combinar tudo para depois reunir as pessoas. No caso, no Congresso. Mas é uma construção conjunta, senão não tem significado constituir esses grupos

A sustentabilidade exclui a tese de que podem ser mudanças apenas para quem entrar no mercado hoje?
Há uma confusão entre o que disse o presidente Michel Temer e o ministro Henrique Meirelles. O presidente disse que não haverá mudanças para quem já tiver o direito adquirido. Quando há direito adquirido? Quando você preenche os pressupostos para aposentadoria. Meirelles não trouxe o termo jurídico correto, mas ele disse que, durante a expectativa de direito, pode sim haver mudanças nas regras, e aqui devem ser construídos critérios para transição. O tratamento para quem tem cinco anos de contribuição em relação a quem tem 25 anos precisa ser diferente. Vamos construir um período de transição. Quem entra terá a regra nova aplicada integralmente. Não é algo que resolveremos do dia para a noite, mas no curso de um tempo relativamente longo.

A regra dos 85-95 para aposentadoria não é o suficiente?
Não é. Temos uma inversão na pirâmide etária da população. A expectativa de vida vem aumentando e vamos ter, em pouco tempo, três vezes mais pessoas recebendo a aposentadoria do que contribuindo. Por duas razões: aumenta a expectativa de vida, e as famílias que há 20 anos tinham em média quatro filhos, hoje têm 1,7. Teremos entrado no mercado com um número menor de pessoas, e fazendo jus à aposentadoria um contingente maior. O sistema é complexo e a decisão precisa ser pensada.

A CPMF ou o aumento na Cide (imposto sobre combustíveis) são viáveis?
Hoje, é absolutamente impossível qualquer aumento da carga tributária. Mas temos que sinalizar que estamos adotando medidas para corrigir os equívocos fiscais. Estamos gastando mais do que recebendo. O governo terá de fazer isso. Depois disso, pode sim chamar a sociedade para discutir, programarmos em quanto tempo vamos superar o deficit nas contas públicas. Se for em um longo tempo, não precisa de imposto, mas isso significa perdas na educação, na saúde. Então, se quisermos mais cedo, aí precisaremos ter uma contribuição, temporária, pelo período necessário para recompor as contas públicas. Temos uma das maiores cargas tributárias dos países em desenvolvimento e há um limite para a capacidade contributiva da população. Ultrapassar esse limite não significa aumentar a arrecadação, porque leva as pessoas à informalidade.

A Lava-Jato exagerou em relação a ministros citados ou investigados?
Acho que não. Eu sou advogado e não tenho nenhuma restrição do que aconteceu até agora. Para a sociedade, fruto das mídias on-line e da mídia em geral, quando alguém é citado parece que ele já está condenado. Se formos verificar o procedimento, primeiro tem a investigação, anterior à denúncia, depois o inquérito. Cerca de 90% dos inquéritos não levam à condenação. O presidente Michel Temer teve o cuidado de conversar com todos os citados, e foi explicado a ele de que esse tema não se converterá em um processo ou em uma condenação.

E quanto aos servidores públicos, alguma chance de aumento para eles?
Tem um acordo feito para aumentar 5% neste ano, esse acordo vai ser honrado.

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