Esperando o quê?
O ministro licenciado do Planejamento, senador Romero Jucá (PMDB-RR), não durou duas semanas no cargo. Era pedra cantada que as suspeitas do seu envolvimento no escândalo da Petrobras, sob investigação da Operação Lava-Jato, poderiam se tornar um grande problema para o presidente interino, Michel Temer. O que ninguém sabia é que uma conversa comprometedora sobre as investigações com o ex-presidente da Transpetro, o ex-senador Sérgio Machado, que negocia sua delação premiada com o Ministério Público Federal, havia sido gravada pelo próprio. Supõe-se que outras conversas com líderes do PMDB, entre os quais o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o ex-presidente da República José Sarney, também tenham sido gravadas. Nitroglicerina pura.
O governo provisório de Temer é daqueles que enfrentam mais ameaças do que oportunidades, sobretudo nesse lusco-fusco entre o afastamento da presidente Dilma Rousseff e a aprovação definitiva de seu impeachment pelo Senado, uma novela que deve durar mais uns 100 dias, segundo a previsão mais otimista. Seu ponto forte é a equipe econômica, à exceção de um único integrante: Jucá. Pontos fracos, via de regra, podem ser eliminados quando são diagnosticados. Não foi o caso.
Na gravação revelada pela Folha de S. Paulo, Jucá sugere a Sérgio Machado um “pacto” para tentar barrar a Operação Lava-Jato. Música para a presidente afastada, Dilma Rousseff, e seus aliados. Os trechos revelados na gravação não chegam a configurar um ilícito penal, mas são moralmente insustentáveis e reforçam as suspeitas de que o ministro esteja realmente envolvido no chamado petrolão. Embora tente se justificar, dizendo que suas opiniões sobre a Lava-Jato são públicas, pois constam de discursos e entrevistas, a posição de Jucá é insustentável.
O peemedebista foi peça-chave na articulação do impeachment, principalmente no Senado. Assumiu a presidência do PMDB para fazer o enfrentamento com a presidente Dilma e o PT e livrar Temer desse desgaste. Na montagem da equipe econômica, por ser profundo conhecedor do Orçamento da União, foi nomeado ministro do Planejamento, com a missão de aprovar o ajuste fiscal e blindar a política econômica no Congresso. Sua saída de cena é fundamental para preservar o governo de mais desgaste. A propósito, Temer vem se desgastando por bobagens, ou melhor, por erros que poderiam ter sido evitados, como a extinção do Ministério da Cultura, decisão que acabou revista, e a nomeação de um jovem diplomata para o cargo de ministro sem nenhuma expressão no meio artístico e cultural.
Ontem, Michel Temer foi ao Congresso para entregar ao presidente da Casa, Renan Calheiros, a revisão da meta fiscal prevista para este ano: um déficit de R$ 170,5 bilhões. Recebido com vaias e gritos de “golpista”, manteve a fleuma que o caracteriza, mas estava acompanhado de Jucá, o que deslocou o foco de atenção da nova política econômica para a crise ética. Temer não deu entrevistas, nem comentou o diálogo de Romero Jucá com Sérgio Machado. Mas coube ao ministro a saída honrosa de se licenciar do cargo; uma saída sem volta.
A contradição
A grande contradição do governo Temer é a necessidade de blindar sua política econômica no Congresso com um sistema de alianças cujo eixo são forças que apoiavam o governo Dilma, entre as quais há muitos políticos sob investigação.
O cenário é de crise prolongada. Mesmo que Michel Temer consiga dar respostas satisfatórias aos agentes econômicos, no sentido de combater a recessão e o desemprego, as consequências sociais da crise econômica não serão revertidas no curto prazo, o que afeta fortemente a popularidade do governo. Do ponto de vista do ajuste fiscal e do impeachment, o fato mais decisivo é a ampla base de apoio congressual, mas essa é apenas uma face da moeda; a outra, é o desgaste provocado pelo loteamento da Esplanada e o envolvimento de aliados na Operação Lava-Jato.
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