O caso da adolescente vítima de um estupro coletivo em uma comunidade da Zona Oeste do Rio de Janeiro, que teve divulgada na internet sua imagem nua e desacordada em um vídeo após a agressão, está causando comoção e revolta nas redes sociais.
Além do protesto de políticos, artistas e anônimos, que pedem Justiça na punição dos culpados e o fim do compartilhamento de vídeos como esse, coletivos feministas lançaram ontem um “gritaço” contra a naturalização do estupro. A atriz Letícia Sabatela foi uma das primeiras a aderir à ideia. As pessoas também foram convidadas a trocar suas fotos de perfil nas redes com a inclusão da frase “eu luto pelo fim da cultura do estupro”. Em menos de três horas, mais de 30 mil haviam aderido.
O gritaço pretende reunir mulheres de todas as partes do Brasil dizendo não ao machismo, à misoginia e à violência, e em solidariedade à garota alvo das agressões. “A ideia surgiu de discussões de coletivos feministas indignados com a forma como o caso foi tratado por algumas pessoas”, conta Manoela Miklos, feminista, doutora em Relações Internacionais e criadora da campanha #AgoraÉQueSãoElas, em que mulheres ocuparam o espaço de escritores e jornalistas homens durante uma semana em março, no mês do Dia Internacional da Mulher.
“A gente ficou pensando em frases de efeito para tentar expressar nossa indignação, mas no fim decidimos que deveria ser mesmo um não. Já tentamos mil vezes explicar que isso é crime, não temos mais o que fazer.
Uma das apoiadoras é a filósofa e idealizadora da PartidA, um movimento que pretende criar um partido feminista brasileiro, Márcia Tiburi. Para ela, o estupro tem que ser olhado como uma questão cultural para entender o motivo de o caso dessa garota não ser visto com indignação por todos. “Na experiência cultural costumamos naturalizar tudo aquilo que se torna comum, diário e cotidiano. Tudo aquilo que não é questionado”, afirma Márcia. Segundo ela, por isso têm pessoas hoje rindo com o que aconteceu com a garota que foi estuprada no Rio de Janeiro.
“Pessoas que riem disso são aquelas pessoas que naturalizaram justamente esse dado cultural, mas, ao mesmo tempo, nós não podemos naturalizar a ideia de que os homens são estupradores por natureza porque eles não são. As pessoas são criadas, educadas, formadas, generificadas, subjetivadas dentro do contexto cultural e da tradição que elas vivem, por isso precisamos combater a cultura do estupro contra toda forma de naturalização”, defende a filósofa.
Redes sociais A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) usou sua página no facebook para pedir justiça. “A violência sofrida por uma menina em Santa Cruz, na Zona Oeste do Rio, ultrapassa todas as fronteiras da barbárie. Ela foi estuprada por 30 homens e teve fotos e vídeos divulgados na internet. Queremos a prisão desses criminosos já”, afirma. A parlamentar diz ainda que o empoderamento da mulher e o feminismo se fazem necessários cada vez mais para combater “essa cultura absurda”. “Não abaixem a cabeça”, pede.
O deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) disse acompanhar o caso, junto com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB Mulher) e a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Ele foi um dos que pediram a exclusão da conta do twitter que divulgou o vídeo.
Outra que manifestou sua revolta foi a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS). No seu twitter, a parlamentar divulgou a notícia e registrou: “Revolta! Basta de impunidade ao estupro e aos seus apologistas”. Também pelo microblog, o ator e ex-repórter do CQC Ronald Rios comentou o assunto. “A luta das mulheres não é para ter mais direitos que os homens. É para 30 caras não estuprarem uma mina e fazerem um liveblogging disso”, disse.
A ex-deputada federal que concorreu à Presidência da República em 2014, Luciana Genro (PSOL), considerou um “absurdo” o ocorrido no Rio. “Estupro coletivo filmado em vídeo é uma das coisas mais nojentas que já vi. Até quando homens vão se vangloriar de cometer crimes bárbaros? Precisamos lutar diariamente contra a cultura do estupro.
Dezenas de anônimos também compartilharam sua indignação com a situação da garota violentada nas redes sociais, pedindo que casos como este sejam denunciados e não sirvam de entretenimento para pessoas que compartilham esse tipo de imagem. “Penso que todos que compartilharam deveriam ser denunciados e indiciados”, diz um usuário do twitter que se identifica como Nelsin. “Aonde chega o ser humano? Fico me perguntando isso”, diz Henrique.
Exame para provar agressão
A jovem de 16n anos que teve imagens publicadas nas redes sociais por dois homens que diziam que ela tinha acabado de ser estuprada foi submetida a exames médicos na manhã de ontem. Segundo a avó da moça, a vítima foi encontrada por um agente comunitário, na Zona Oeste da cidade, e levada para a casa da família. A avó disse ter ficado chocada com o vídeo, em que um dos homens afirma que a jovem pode ter sido estuprada por mais de trinta criminosos. “Essa aqui, mais de 30, engravidou”, diz um homem não identificado.
“O vídeo é chocante, eu assisti, ela está completamente desligada”, afirmou a avó. Ela disse que a neta tem o hábito de frequentar comunidades e passar alguns dias sem dar notícias, desde os 13 anos. A família, no entanto, nunca teve notícias de que a moça sofresse abusos. A vítima é mãe de um menino de três anos.
A suspeita de estupro coletivo é investigada pela Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática (DRCI). A jovem já foi ouvida e as investigações estão sob sigilo. Segundo a polícia, dois homens que publicaram imagens da moça desacordada e nua foram identificados. Um mora em Santa Cruz e outro na Cidade de Deus, na Zona Oeste. Os nomes dos envolvidos não foram divulgados.
A publicação e o compartilhamento de imagens da jovem violentada causaram revolta nas redes sociais. Internautas pediram que as imagens não sejam compartilhadas.