O ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, decidiu nesta segunda-feira, 13, remeter para Curitiba os três inquéritos que têm Lula como alvo. São apurações que investigam corrupção e lavagem na compra e reforma de um sítio em Atibaia (SP) e de um tríplex no Guarujá (SP) e em recebimentos via Instituto Lula e empresa de palestra LILS Palestras e Eventos. São essas frentes de apuração iniciadas em Curitiba que resultaram na Operação Aletheia, em 4 de março, quando o ex-presidente foi conduzido coercitivamente para depor. Os autos foram enviados para Brasília, após divulgação por Moro, em 16 de março, de escuta em que o petista conversava com a presidente afastada Dilma Rousseff. Teori rejeitou o uso do material como prova.
Com o retorno das investigações da Lava Jato contra Lula para Curitiba, o maior risco que o ex-presidente enfrenta não é uma prisão cautelar (temporária ou preventiva), avaliam investigadores e defesas ouvidos em reservado. O problema é jurisprudência criada pelo Supremo, em março, que permitiu a prisão imediata de condenados em segundo grau - sem a necessidade, vigente até março, de se aguardar o transitado em julgado do processo. A avaliação dos envolvidos nos processos é que com a nova regra, se condenado por Moro até o início de 2017, Lula fica passível de ter um pedido de execução de pena de prisão ainda em 2018, numa eventual manutenção de sentença da Lava Jato no Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Denúncias
A força-tarefa da Lava Jato, em Curitiba, considera ter as provas para levar o petista ao banco dos réus por envolvimento no esquema de corrupção e lavagem de dinheiro na Petrobras, conforme revelou a reportagem, em 23 de abril.
No caso do sítio, por exemplo, existem três acusações que podem ser unificadas ou apresentadas separadamente. Uma principal, sobre a compra e reforma da propriedade, pelas empreiteiras Odebrecht e OAS e pelo pecuarista e usineiro José Carlos Bumlai. E outras que tratam da mudança e do armazenamento de bens e outra sobre a instalação de uma antena da OI, próxima do imóvel.
São esperadas ainda outras acusações, como as decorrentes da delação premiada do ex-senador Delcídio Amaral (sem partido-MS), que envolveu Lula na trama para comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. Esse inquérito permanece ainda no Supremo.
A denúncia principal, no caso do primeiro pacote, apontará a família do ex-prefeito de Campinas (SP) e amigo de Lula Jacó Bittar (PT) como "laranja" na ocultação da propriedade, adquirida em 2010 pelo valor declarado de R$ 1,5 milhão. Os registros de escritura em nome dos donos oficiais, um "contrato de gaveta" em nome do ex-presidente e da mulher, Marisa Letícia, encontrado nas buscas e depoimentos dos investigados farão parte da acusação.
Nesse item, a força-tarefa em Curitiba deve acrescentar novos dados que foram descobertos logo após a deflagração da Operação Aletheia e antes da remessa dos autos para o STF. Uma delas é o uso de uma empresa - PDI Processamento Digital de Imagem - que pertence a Kalil Bittar, sócio de Fabio Luis Lula da Silva, o Lulinha. Ele é irmão de Fernando Bittar, um dos donos, na escritura, do Sítio Santa Bárbara, em Atibaia (SP), que segundo os investigadores é do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A empresa tem sede na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, e não tinha entrado ainda para o radar da Lava Jato, que apura os negócios de familiares e amigos de Lula - por suspeita de ocultação patrimonial e lavagem de dinheiro.
Os procuradores apontarão que "o ex-presidente da República tinha ciência do estratagema criminoso e dele se beneficiou". Segundo sustentará a denúncia, as etapas de aquisição, reforma e decoração do sítio em Atibaia "revelam operações sucessivas de lavagem de dinheiro no interesse de Luiz Inácio Lula da Silva". A origem ilícita dos recursos empregados na compra, reforma e decoração do imóvel, advindos de crimes antecedentes praticados pela Odebrecht, OAS e Usina São Fernando (de Bumlai) integram os elementos que apontarão os estratagemas para dissimulação e ocultação do negócio.
Tríplex
A denúncia do tríplex no Guarujá, que teria sido reservado e reformado pela construtora OAS para Lula, também pode integrar o primeiro bloco de acusações contra o ex-presidente. O dono da empreiteira, José Aldemário Pinheiro, o Léo Pinheiro, negocia delação com a Procuradoria desde o início do ano, sem sucesso. Ele pode esclarecer o caso.
Lula será denunciado nesse negócio por lavagem de dinheiro, sendo beneficiado pela OAS, uma das líderes do cartel que atuava Petrobras, com a promessa de entrega e a decoração do imóvel com dinheiro oriundo de corrupção.
No caso do tríplex, a denúncia é discutida porque ela tem dois outros processos relacionados.
O inquérito considerado o mais incipiente é o que trata das palestras, pós-Presidência, via empresa LILS, Palestras, Eventos e das doações ao Instituto Lula. Nessa frente, um delator que confirme que os repasses e pagamentos por palestras podem ter ocultado propina é essencial para investigadores.
Os documentos recolhidos na Operação Aletheia, nesses endereços, e na casa de Lula, dos filhos e do amigo Paulo Okamoto, presidente do Instituto Lula, determinarão o ritmo de andamento do inquérito.
Quebra-cabeça
Até março, procuradores da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba consideravam estar a um delator de completar o quebra cabeça acusatório contra Lula - como se tivessem o cenário da imagem já definido, restando apenas uma peça para completar o desenho. As delações do ex-líder do governo no Senado Delcídio Amaral e do ex-deputado Pedro Corrêa (PP-PE) ajudaram a definir esse cenário, em que Lula é pintado pela força-tarefa como alguém com participação ativa no esquema de sistematização da corrupção no governo. Além do fatiamento político entre partidos da base - PT, PMDB, PP e PTB -, teriam sido criadas regras para a propina. Com o esquema teria sido montada a base de sustentação para a governabilidade, uma versão ampliada do mensalão, e pagos valores também para a oposição.
Defesa
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva divulgou nota, por meio de sua assessoria de imprensa:
"Reafirmamos que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sempre agiu dentro da lei. Não é dono nem do sítio de Atibaia, nem do apartamento do Guarujá, como está registrado em escrituras. Todos os bens do ex-presidente estão devidamente declarados.
O MPF tem conhecimento, em virtude de provas documentais, de que o sítio foi comprado com recursos provenientes de Jacó Bittar e de seu sócio Jonas Suassuna; que Fernando Bittar e Jonas Suassuna custearam, com seu próprio patrimônio, reformas e melhorias no imóvel; que Fernando Bittar e sua família frequentaram o sítio com a mesma intensidade dos membros da família do ex-presidente Lula, estes últimos na condição de convidados.
O ex-Presidente Lula e seus familiares foram submetidos a uma ilegal devassa por decisões do juiz Sérgio Moro, a pedido do MPF. A despeito disso, não conseguiram localizar qualquer elemento concreto que pudesse embasar uma acusação - seja em relação à propriedade do imóvel, seja em relação às reformas feitas no imóvel.
É muito grave, especialmente diante do histórico acima, a informação de que alguns membros do MPF, teriam antecipado a jornalistas de "O Estado de S. Paulo" e outros meios de imprensa que pretendem apresentar denúncias em série contra o ex-Presidente Lula, seus familiares e amigos.
Tal conduta, se confirmada, representará mais um verdadeiro atentado à Constituição Federal, pois alguns membros do MPF estarão utilizando de um amplo poder que lhes foi conferido para ferir a dignidade de pessoas e para tentar subverter o princípio da presunção de inocência, não só mediante a formulação de denúncias contra pessoas que sabem serem inocentes, mas ao darem publicidade antecipada a esse ato.
Configurará, ainda, um atentado a Tratados Internacionais dos quais o Brasil é signatário, que asseguram, dentre outras coisas, o direito à integridade pessoal - física, psíquica e moral - e a presunção de inocência, inclusive como regra de tratamento, impedindo que seja feito qualquer juízo moral antecipado, fundado em situações juridicamente ainda não definidas.
Por isso, caso a informação publicada pelos jornalistas de "O Estado de S.