Temer diz que interinidade não traz 'nenhuma amarra' para ele governar

Brasília, 24 - Em entrevista de pouco mais de uma hora a cinco jornais, o presidente em exercício, Michel Temer, disse ter consciência de sua interinidade, mas que quer governar o País "intensamente".
Sem referência direta à presidente afastada, Dilma Rousseff, criticou a falta de diálogo do governo petista com os outros poderes e ironizou a ideia de Dilma querer "voltar para sair", referindo-se a uma possível vitória de Dilma no processo de impeachment seguida da proposta de novas eleições.

Em sua fala, Temer contou que marca dia a dia a sua interinidade, lembrando que está no 42º dia de governo e explicou que precisou fazer isso porque já no fim de semana seguinte ao que assumiu começaram a cobrá-lo, como se estivesse há dois anos no governo. Em seguida, disse que é sempre lembrado da interinidade e avisou que ela não traz "nenhuma amarra" para ele governar.

"Tenho consciência da interinidade e vou aguardar, respeitosamente, a decisão do Senado Federal", disse, mas ressaltou que, neste período, fará tudo "intensamente". "O que nós temos de fazer é governar o País. Se lá em agosto mudar, o País foi governado. Se foi melhor ou pior, a história é que vai dizer. Mas foi governado intensamente", disse.

Sem se referir a Dilma Rousseff, fez questão de ressaltar que, neste período, "modestamente, nestes 40 dias, o País caminhou muito", criticou a falta de diálogo e sugeriu que o País vinha sendo governado por uma pessoa autoritária.

"Só posso dizer que o diálogo é fundamental, porque num estado democrático você tem de exercer a atividade executiva amparado pelo Legislativo. Precisa deste conjunto de forças para governar.
Qualquer outra visão é uma visão autoritária. Se se despreza o Congresso Nacional, por exemplo, ou se critica o Judiciário. Isso é uma visão antidemocrática e inconstitucional. Nós precisamos é de reconstitucionalizar o País porque certos hábitos vão tomando conta da cultura política do País e vão desprezando as instituições. E eu faço questão de dizer e fazer o contrário", avisou ele.

Temer voltou a defender que o julgamento das contas da campanha à reeleição pelo Tribunal Superior Eleitoral sejam separadas. "Fisicamente já são separadas", comentou, acrescentando que "a condenação de alguém não pode importar na condenação de outrem".

O presidente em exercício ironizou a tese de eleições diretas defendidas pelos petistas e até por Dilma. "Ela quer voltar para sair? Não é uma tese que a favoreça", comentou ele. Sobre a possibilidade de Dilma, em caso de volta, querer manter sua equipe econômica, disse: "Seria aplauso a minha administração".

Temer disse que "fala com todo mundo" e conversou com o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha, há umas três semanas e assegurou que ele não o atrapalha "em nada". Sobre a presença de Waldir Maranhão no cargo de presidente interino da Casa, lembrou que ele é "um parlamentar com todos os direitos".

Para Temer, "há uma visão preconceituosa sobre a participação popular". Segundo ele, não dá para falar se o Congresso "piorou ou melhorou". "O que pode acontecer, é o voto equivocado", comentou, ressaltando que "não interfere nas questões do Legislativo".

Juros

Temer disse que "espera" que haja redução dos juros até o fim do ano, para "animar a economia", justificando que, além de isso ter um "efeito concreto", tem também o "efeito psicológico". Ele pediu que se grifasse a palavra "espera" na afirmação, justificando que esse processo de diminuição das taxas deve ser feito de forma "responsável". Temer também pediu aos ministros da área econômica que apresentem "medidas a curto prazo" que possam ser tomadas "de acordo com possibilidades do erário público".

Impostos

Sobre aumento de impostos, para enfrentar este momento de crise, Temer repetiu que, "até o presente momento, não se falou em tributos".
E, de forma descontraída, voltou a usar a mesóclise, uma marca de sua fala: "Economia é assim. Muitas vezes você tem de fazer readequações e fá-las-á no tempo certo", disse ele, provocando risos em todos, e esclarecendo que se trata de uma coisa que pode ser estudada no futuro. "Mas se puder evitar tributos, tanto melhor."

Lei das Estatais

O presidente em exercício afirmou também que não quer antecipar decisões sobre eventuais mudanças no texto do projeto de Lei de Responsabilidade das Estatais. Ele afirmou que ainda não estudou o material. "Eu não quero vetar a ponto de desnaturar o projeto. Isso eu não vou fazer." A sanção do projeto está prevista para a próxima terça-feira.

Ele informou ainda que havia pedido para reexaminar a regra para quem tem dez anos de atividades naquele setor. Este prazo foi reduzido para quatro anos e o Senado acolheu para aquele setor ou atividade similar. Para Temer, isto é mais uma vitória do diálogo, que tem permitido as votações. "O que nós temos de fazer é governar o País. Se lá em agosto mudar, o País foi governado.
Se foi melhor ou pior, a história é que vai dizer. Mas foi governado intensamente."

Mercosul

O presidente em exercício disse ainda que não há possibilidade de o Brasil sair do Mercosul, alegando que o País foi o promotor da origem do bloco. Mas avalia que deve haver uma "readequação das regras", o que só depende de conversações. "Uma das ideias é que se permita que os países possam fazer, isoladamente, acordos bilaterais, com uma liberdade maior para os países contratantes. Muitas vezes não se pode fazer acordo porque se está preso à tarifa comum. Mas tudo tem de ser discutido coletivamente." Com relação à saída da Venezuela, Temer avalia que a questão tem que ser examinada em reunião do bloco.

Brexit

Sobre a decisão do Reino Unido de sair da União Europeia, conforme resultado de plebiscito divulgado nesta sexta-feira, 24, Temer acredita que não traz nenhum impacto político ao Brasil. Quanto aos efeitos econômicos, na sua avaliação, é preciso esperar.

Ele acredita que o que pautou a disputa foram temas ligados à intolerância religiosa e xenofobia, mas não espera que isso deve se acentuar nem se espalhar pelo mundo. O presidente em exercício também não acredita que haverá retrocessos com relação à globalização, embora prejudique a unidade entre os estados. "Na medida que caem as barreiras alfandegárias, tributárias, de passaportes, você caminha para uma federação de estados. Nesse sentido, a saída do Reino Unido quebra esta possibilidade.".