Brasília - "O sr. votou pela admissibilidade do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Significa dizer que votará sim pela aceitação do mérito?" No sofá confortável de uma das salas de estar de seu palacete no Lago Sul, em Brasília, o senador Raimundo Lira (PMDB-PB), de 72 anos, presidente da Comissão Especial do impeachment, ouviu a pergunta com um sorriso matreiro de quem fareja o perigo. E assim respondeu: "Pelo fato de eu ter votado na admissibilidade alguns senadores da comissão podem olhar para mim e achar que eu vou votar sim, no mérito. É uma conclusão deles, não minha. Em relação ao mérito da denúncia, a minha posição é de total e absoluta isenção", disse.
O senador abriu a porta social do casarão para o jornal O Estado de S. Paulo na tarde de um sábado, dia 18. Apresentou o mezanino que abriga a galeria de fotos da família Lira-Figueiredo - as de Cajazeiras (onde nasceu) e Campina Grande (onde se criou e enriqueceu), na Paraíba.
Acompanha-o, há 46 anos, a socióloga Gitana Maria Figueiredo Lira, que chama de Gigi. Tem quatro filhos e cinco netos. Dos quatro, os três que casaram tiveram como padrinho o empresário José Alencar Gomes da Silva (1931-2011), compadre de Lira muito antes de habilitar-se a vice-presidente de Luiz Inácio Lula da Silva.
O hoje senador estava na reunião que decidiu a entrada de Alencar no veleiro petista. Por conta do amigo, desistiu do voto tucano em seu ex-líder e amigo Fernando Henrique, nas eleições de 94 e 98. Cravou Lula em 2002 e 2006. Votou em Dilma em 2010 e em 2014, "para acompanhar a posição do PMDB".
O senador levou cinco anos para construir o solar do Lago Sul. Não é o único casarão de sua recheada carteira de imóveis. O outro, em Campina Grande, tem 1.600 m2 de área construída - pouco maior que um campo de futebol soçaite. O do Lago Sul "é um pouco maior" em área construída. Tem ares de casa de fazenda e, para onde se olhe, é um museu de arte, principalmente a paraibana.
Status herdado
Raimundo Lira nasceu rico, em Cajazeiras, no dezembro de 1943. Seu pai, José Augusto Lira, já vendia Jeeps Willys importados. Tinha frota de caminhão, empresa de ônibus, depósito de cereais e armazém de estiva. Foi nesse que botou Raimundo para aprender a trabalhar, desde os 11 anos.
A disciplina foi reforçada no colégio salesiano, e nos dois anos em que foi da escola de cadetes do Exército, em Fortaleza e em Campinas (SP).
No clima acirrado que marca os trabalhos da comissão, o senador tem sido paciente e contemporizador, sem prejuízo de baixar o centralismo quando entende que é o caso. "O meu dever é o meu prazer", diz, citando uma frase do manual de bom comportamento de Zé Augusto Lira. Ou duas: "Só sabe dar conselho quem sabe receber conselho".
É mais ou menos o que faz no controle da caldeira: "Quando vejo alguém impaciente, infeliz, ou nervoso, peço pra chamar, converso, e resolvo, ou tento resolver".
Pergunte-se, de supetão, se o jogo já não está decidido, contra a presidente Dilma, à medida em que ninguém tem se movido da posição em que está. "Não posso afirmar isso", diz o senador. "Toda situação política se movimenta. A gente não sabe o que vai acontecer. O momento político é de muitas surpresas", avaliou.
Tornou-se público, na campanha de 2010, quando se elegeu suplente do senador Vital do Rêgo, hoje no Tribunal de Contas da União, que o patrimônio de Lira chegava a R$ 54.343.693,03, como consta nas três laudas de sua declaração de bens apresentada à Justiça Eleitoral (disponível na internet).
"São valores de custo, como a legislação me permite", diz. Definindo-se política e ideologicamente como "de centro, mas um pouco pra esquerda", o senador, que é católico, comentou: "Se não fosse a esquerda, o capitalismo seria um horror".
Leão
Sua atitude mais inusitada na comissão do impeachment, em maio, tratou, justamente, da fortuna que tem. Irritado com a notícia de ter feito contribuição eleitoral sem dinheiro disponível - que já desmentira, sem êxito -, parou os trabalhos para um pronunciamento de caráter pessoal.
Revelou, então, para os milhões de telespectadores que assistem à comissão, e para estupefatos senadores, que pagou, no ano passado, como pessoa física, R$ 527 mil reais de Imposto de Renda, por mês, "25 vezes mais do que eu recebo líquido do Senado" (R$ 22 mil, que, conta, aplica integralmente na despesa do gabinete, onde só gasta R$ 15 mil dos R$ 35 mil a que tem direito).
"São mais de R$ 6 milhões por ano", sublinhou, ajeitando-se no sofá. Na comissão informou, ainda, que não respondia a processos de qualquer natureza. Mas a uma execução fiscal por não pagamento de IPTU, como ainda consta no site do Tribunal de Justiça da Paraíba. Explicou que um de seus inquilinos não pagara, e que já mandara regularizar a situação.
Minoria
Na poltrona amarela, o senador relembrou como chegou à comissão do impeachment. Já favorável à abertura do processo, o primeiro passo foi dele: pediu ao líder do PMDB, senador Eunício de Oliveira (CE), que o indicasse para membro da comissão.
Argumentou que já tinha passado pela experiência do impeachment de Collor, em 92. Oliveira não só gostou, como o convidou para ser presidente. Lira pediu três dias para pensar. Ao bater o martelo, disse a Oliveira duas obviedades - que seria suprapartidário e imparcial - e uma singularidade: não deixaria a maioria esmagar a minoria.
No balanço que faz das mensagens que chegam nas redes sociais que frequenta, e no WhatsApp, o senador contabiliza 70% de comentários favoráveis, 15% de recomendações sobre o que acham que deveria fazer, e 15% de críticas, parte delas achando que dá espaço demais para os pelejadores de Dilma - onde se destacam, por mais belicosos, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) e as senadoras Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Vanessa Grazziottin (PC do B-AM, nascida em Videira-SC).
"Gosto muito do Lindbergh, que também é paraibano", disse. "A senadora Vanessa defende seus pontos de vista com garra", acrescentou. "Com a senadora Gleisi, a relação é de perfeita cordialidade."
Lira não toma calmantes. O que tem feito, há 25 anos, três vezes por dia, é tomar o mesmíssimo suco: maçã e pera geladas, com água natural, batidas no liquidificador. "É um hábito, e nunca enjoei."
Ramo
Faz algum tempo que o empresário Raimundo Lira vendeu todas as concessionárias - onde chegou a ter 1.500 empregados registrados. Hoje só tem 22, a turma que lhe serve. Aluguéis, principalmente na Paraíba e em Brasília, são uma parte substancial do que entra na arca. A outra, mais robusta, vem de sua única atividade empresarial: é parceiro da Cyrela Brazil Realty, uma das maiores incorporadoras e construtoras de imóveis do País.
O senador tem um passatempo: montar álbuns de fotografias para eventos familiares. Já fez 300 deles, contou. Em um dos alguns há um bilhete de namorado a dona Gigi.
Lira já cogita que possa sair candidato a governador da Paraíba em 2018, embora prefira a reeleição ao Senado. A depender, é claro, de como esteja o mundo político até lá.
O senador abriu a porta social do casarão para o jornal O Estado de S. Paulo na tarde de um sábado, dia 18. Apresentou o mezanino que abriga a galeria de fotos da família Lira-Figueiredo - as de Cajazeiras (onde nasceu) e Campina Grande (onde se criou e enriqueceu), na Paraíba.
Acompanha-o, há 46 anos, a socióloga Gitana Maria Figueiredo Lira, que chama de Gigi. Tem quatro filhos e cinco netos. Dos quatro, os três que casaram tiveram como padrinho o empresário José Alencar Gomes da Silva (1931-2011), compadre de Lira muito antes de habilitar-se a vice-presidente de Luiz Inácio Lula da Silva.
O hoje senador estava na reunião que decidiu a entrada de Alencar no veleiro petista. Por conta do amigo, desistiu do voto tucano em seu ex-líder e amigo Fernando Henrique, nas eleições de 94 e 98. Cravou Lula em 2002 e 2006. Votou em Dilma em 2010 e em 2014, "para acompanhar a posição do PMDB".
O senador levou cinco anos para construir o solar do Lago Sul. Não é o único casarão de sua recheada carteira de imóveis. O outro, em Campina Grande, tem 1.600 m2 de área construída - pouco maior que um campo de futebol soçaite. O do Lago Sul "é um pouco maior" em área construída. Tem ares de casa de fazenda e, para onde se olhe, é um museu de arte, principalmente a paraibana.
Status herdado
Raimundo Lira nasceu rico, em Cajazeiras, no dezembro de 1943. Seu pai, José Augusto Lira, já vendia Jeeps Willys importados. Tinha frota de caminhão, empresa de ônibus, depósito de cereais e armazém de estiva. Foi nesse que botou Raimundo para aprender a trabalhar, desde os 11 anos.
A disciplina foi reforçada no colégio salesiano, e nos dois anos em que foi da escola de cadetes do Exército, em Fortaleza e em Campinas (SP).
No clima acirrado que marca os trabalhos da comissão, o senador tem sido paciente e contemporizador, sem prejuízo de baixar o centralismo quando entende que é o caso. "O meu dever é o meu prazer", diz, citando uma frase do manual de bom comportamento de Zé Augusto Lira. Ou duas: "Só sabe dar conselho quem sabe receber conselho".
É mais ou menos o que faz no controle da caldeira: "Quando vejo alguém impaciente, infeliz, ou nervoso, peço pra chamar, converso, e resolvo, ou tento resolver".
Pergunte-se, de supetão, se o jogo já não está decidido, contra a presidente Dilma, à medida em que ninguém tem se movido da posição em que está. "Não posso afirmar isso", diz o senador. "Toda situação política se movimenta. A gente não sabe o que vai acontecer. O momento político é de muitas surpresas", avaliou.
Tornou-se público, na campanha de 2010, quando se elegeu suplente do senador Vital do Rêgo, hoje no Tribunal de Contas da União, que o patrimônio de Lira chegava a R$ 54.343.693,03, como consta nas três laudas de sua declaração de bens apresentada à Justiça Eleitoral (disponível na internet).
"São valores de custo, como a legislação me permite", diz. Definindo-se política e ideologicamente como "de centro, mas um pouco pra esquerda", o senador, que é católico, comentou: "Se não fosse a esquerda, o capitalismo seria um horror".
Leão
Sua atitude mais inusitada na comissão do impeachment, em maio, tratou, justamente, da fortuna que tem. Irritado com a notícia de ter feito contribuição eleitoral sem dinheiro disponível - que já desmentira, sem êxito -, parou os trabalhos para um pronunciamento de caráter pessoal.
Revelou, então, para os milhões de telespectadores que assistem à comissão, e para estupefatos senadores, que pagou, no ano passado, como pessoa física, R$ 527 mil reais de Imposto de Renda, por mês, "25 vezes mais do que eu recebo líquido do Senado" (R$ 22 mil, que, conta, aplica integralmente na despesa do gabinete, onde só gasta R$ 15 mil dos R$ 35 mil a que tem direito).
"São mais de R$ 6 milhões por ano", sublinhou, ajeitando-se no sofá. Na comissão informou, ainda, que não respondia a processos de qualquer natureza. Mas a uma execução fiscal por não pagamento de IPTU, como ainda consta no site do Tribunal de Justiça da Paraíba. Explicou que um de seus inquilinos não pagara, e que já mandara regularizar a situação.
Minoria
Na poltrona amarela, o senador relembrou como chegou à comissão do impeachment. Já favorável à abertura do processo, o primeiro passo foi dele: pediu ao líder do PMDB, senador Eunício de Oliveira (CE), que o indicasse para membro da comissão.
Argumentou que já tinha passado pela experiência do impeachment de Collor, em 92. Oliveira não só gostou, como o convidou para ser presidente. Lira pediu três dias para pensar. Ao bater o martelo, disse a Oliveira duas obviedades - que seria suprapartidário e imparcial - e uma singularidade: não deixaria a maioria esmagar a minoria.
No balanço que faz das mensagens que chegam nas redes sociais que frequenta, e no WhatsApp, o senador contabiliza 70% de comentários favoráveis, 15% de recomendações sobre o que acham que deveria fazer, e 15% de críticas, parte delas achando que dá espaço demais para os pelejadores de Dilma - onde se destacam, por mais belicosos, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) e as senadoras Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Vanessa Grazziottin (PC do B-AM, nascida em Videira-SC).
"Gosto muito do Lindbergh, que também é paraibano", disse. "A senadora Vanessa defende seus pontos de vista com garra", acrescentou. "Com a senadora Gleisi, a relação é de perfeita cordialidade."
Lira não toma calmantes. O que tem feito, há 25 anos, três vezes por dia, é tomar o mesmíssimo suco: maçã e pera geladas, com água natural, batidas no liquidificador. "É um hábito, e nunca enjoei."
Ramo
Faz algum tempo que o empresário Raimundo Lira vendeu todas as concessionárias - onde chegou a ter 1.500 empregados registrados. Hoje só tem 22, a turma que lhe serve. Aluguéis, principalmente na Paraíba e em Brasília, são uma parte substancial do que entra na arca. A outra, mais robusta, vem de sua única atividade empresarial: é parceiro da Cyrela Brazil Realty, uma das maiores incorporadoras e construtoras de imóveis do País.
O senador tem um passatempo: montar álbuns de fotografias para eventos familiares. Já fez 300 deles, contou. Em um dos alguns há um bilhete de namorado a dona Gigi.
Lira já cogita que possa sair candidato a governador da Paraíba em 2018, embora prefira a reeleição ao Senado. A depender, é claro, de como esteja o mundo político até lá.