O sorriso afável em nada faz lembrar a falta de carisma que acabou se tornando uma de suas marcas ao longo dos cinco anos e cinco meses de governo. A presença frequente em protestos contrasta com a figura de uma presidente até então isolada no Palácio do Planalto. Desde que foi afastada provisoriamente do poder pelo Senado, há 45 dias, Dilma Rousseff (PT) tem deixado no passado a imagem da chefe do Executivo carrancuda e assumido postura risonha, combatente e próxima dos eleitores, quase como uma candidata em meio a eleições. Com uma agenda extensa de compromissos e entrevistas, Dilma está em ritmo de campanha, disposta a recuperar seu governo a todo custo em agosto, quando senadores decidirão o rumo do país. Hoje, às 9h, ela se reúne com a executiva nacional do PT para discutir o movimento “Volta, Dilma” e deve pôr em pauta a possibilidade de convocar eleições presidenciais.
No Senado, a tropa de choque da presidente – encabeçada pelos senadores Lindbergh Farias (PT-RJ), Kátia Abreu (PMDB-TO), Paulo Rocha (PMDB-PA) e Jorge Viana (PT-AC) – trabalha para alcançar os 28 votos contrários ao impeachment necessários para o retorno da petista. Nos bastidores, aliados de Dilma têm 18 votos confirmados e tentam frear os acordos do presidente interino Michel Temer (PMDB), que tem acenado com cargos e participado de encontros com parlamentares indecisos.
A promessa de um novo pleito é uma das demandas de senadores que podem votar contra o afastamento da presidente. Um dos parlamentares que vêm defendendo essa ideia é Cristovam Buarque (PPS-DF), que votou pela abertura do processo de impeachment em maio e pode mudar de posição. “Vamos ouvir a Dilma (amanhã).
Mas, longe do Congresso Nacional, a equipe da presidente afastada, concentrada no Palácio da Alvorada, residência oficial da petista, está focada em recuperar o apoio popular a Dilma a partir de uma programação intensa. “Dilma tem se movimentado de maneira estratégica para retornar ao governo depois do julgamento de seu processo no Senado”, afirma o cientista político Lucas Cunha, pesquisador do Centro de Estudos Legislativos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Desde o afastamento, em 12 de maio, entre idas frequentes a Porto Alegre para visitar a família, ela esteve presente em atos em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Pernambuco, Paraíba, Bahia. Visitou centro de treinamento para a Olimpíada, participou de encontros com artistas e intelectuais, visitou o padrinho político, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em São Paulo, entre outros compromissos. Nesse período, também se mostrou mais acessível à imprensa nacional e internacional, concedendo entrevistas exclusivas para veículos que vão da TV Brasil à Al Jazeera English, rede de televisão do mundo árabe, e mídias alternativas.
REDES SOCIAIS Uma das estratégias principais da equipe de Dilma nesse período de afastamento tem sido a maior interatividade com o público por meio das redes sociais. Nos perfis no Facebook e no Twitter, ela tem promovido bate-papos sobre os temas mais diversos: direitos trabalhistas, salário mínimo, Bolsa-Família. Um ministro de seu governo, a exemplo de Tereza Campello (Desenvolvimento Social) e Miguel Rossetto (Trabalho e Previdência Social), sempre é convidado para o chat.
Seu site, titulado “Dilma Rousseff – presidenta do Brasil”, traz as “notícias da resistência”, com informes sobre participação em eventos, respostas a reportagens publicadas, críticas à gestão de Temer. Numa seção, ela reforça as ações de seu governo para a Olimpíada. Em outra parte, anuncia que seu “primeiro ato ao voltar será pagar o reajuste do Bolsa-Família cassado por governo interino”. “Dilma tem usado a internet como ferramenta fundamental”, aponta Cunha.
O cientista político reforça que o clima é de eleições. “Ela dá um tom de campanha, com depoimentos de muita gente famosa, de projeção. Ela está de fato numa campanha em prol de seu governo, mas o que precisa de fato são de votos no Senado. A campanha por apoio popular não necessariamente vai repercutir nisso, mas não deixa de ser uma forma de ela se capitalizar politicamente”, comenta Cunha.
Sem consenso para plebiscito
A presidente afastada Dilma Rousseff afirmou ontem, em entrevista à Rádio Guaíba, do Rio Grande do Sul., que, caso seja absolvida no processo de impeachment, ela ainda não sabe se chamaria um plebiscito para a convocação imediata de novas eleições presidenciais, conforme tem prometido em atos de que participa.
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