O sorriso afável em nada faz lembrar a falta de carisma que acabou se tornando uma de suas marcas ao longo dos cinco anos e cinco meses de governo. A presença frequente em protestos contrasta com a figura de uma presidente até então isolada no Palácio do Planalto. Desde que foi afastada provisoriamente do poder pelo Senado, há 45 dias, Dilma Rousseff (PT) tem deixado no passado a imagem da chefe do Executivo carrancuda e assumido postura risonha, combatente e próxima dos eleitores, quase como uma candidata em meio a eleições. Com uma agenda extensa de compromissos e entrevistas, Dilma está em ritmo de campanha, disposta a recuperar seu governo a todo custo em agosto, quando senadores decidirão o rumo do país. Hoje, às 9h, ela se reúne com a executiva nacional do PT para discutir o movimento “Volta, Dilma” e deve pôr em pauta a possibilidade de convocar eleições presidenciais.
A promessa de um novo pleito é uma das demandas de senadores que podem votar contra o afastamento da presidente. Um dos parlamentares que vêm defendendo essa ideia é Cristovam Buarque (PPS-DF), que votou pela abertura do processo de impeachment em maio e pode mudar de posição. “Vamos ouvir a Dilma (amanhã). O que deve aparecer de mais forte são as novas eleições, porque as outras estratégias já foram bastante debatidas”, reforça o deputado federal Reginaldo Lopes (PT-MG), integrante da executiva nacional. Pessoalmente, ele defende eleições gerais – para presidente, deputado federal e senador.
Mas, longe do Congresso Nacional, a equipe da presidente afastada, concentrada no Palácio da Alvorada, residência oficial da petista, está focada em recuperar o apoio popular a Dilma a partir de uma programação intensa. “Dilma tem se movimentado de maneira estratégica para retornar ao governo depois do julgamento de seu processo no Senado”, afirma o cientista político Lucas Cunha, pesquisador do Centro de Estudos Legislativos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Desde o afastamento, em 12 de maio, entre idas frequentes a Porto Alegre para visitar a família, ela esteve presente em atos em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Pernambuco, Paraíba, Bahia. Visitou centro de treinamento para a Olimpíada, participou de encontros com artistas e intelectuais, visitou o padrinho político, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em São Paulo, entre outros compromissos. Nesse período, também se mostrou mais acessível à imprensa nacional e internacional, concedendo entrevistas exclusivas para veículos que vão da TV Brasil à Al Jazeera English, rede de televisão do mundo árabe, e mídias alternativas.
REDES SOCIAIS Uma das estratégias principais da equipe de Dilma nesse período de afastamento tem sido a maior interatividade com o público por meio das redes sociais. Nos perfis no Facebook e no Twitter, ela tem promovido bate-papos sobre os temas mais diversos: direitos trabalhistas, salário mínimo, Bolsa-Família. Um ministro de seu governo, a exemplo de Tereza Campello (Desenvolvimento Social) e Miguel Rossetto (Trabalho e Previdência Social), sempre é convidado para o chat.
Seu site, titulado “Dilma Rousseff – presidenta do Brasil”, traz as “notícias da resistência”, com informes sobre participação em eventos, respostas a reportagens publicadas, críticas à gestão de Temer. Numa seção, ela reforça as ações de seu governo para a Olimpíada. Em outra parte, anuncia que seu “primeiro ato ao voltar será pagar o reajuste do Bolsa-Família cassado por governo interino”. “Dilma tem usado a internet como ferramenta fundamental”, aponta Cunha.
O cientista político reforça que o clima é de eleições. “Ela dá um tom de campanha, com depoimentos de muita gente famosa, de projeção. Ela está de fato numa campanha em prol de seu governo, mas o que precisa de fato são de votos no Senado. A campanha por apoio popular não necessariamente vai repercutir nisso, mas não deixa de ser uma forma de ela se capitalizar politicamente”, comenta Cunha.
Sem consenso para plebiscito
A presidente afastada Dilma Rousseff afirmou ontem, em entrevista à Rádio Guaíba, do Rio Grande do Sul., que, caso seja absolvida no processo de impeachment, ela ainda não sabe se chamaria um plebiscito para a convocação imediata de novas eleições presidenciais, conforme tem prometido em atos de que participa. “Ainda não há consenso entre as diferentes forças que me apoiam”, disse. “É uma das coisas, uma das propostas colocadas na mesa.” Afirmou que pretende fazer um “governo de transição” de dois anos, até 2018, para garantir a “qualidade da democracia no Brasil”. Voltou a denunciar o que considera um “golpe parlamentar” contra seu governo e disse que a certeza que se tem no momento é que a volta “plena e irrestrita” de seu mandato é condição essencial para a manutenção do processo democrático.