Rio - No auditório da Primeira Igreja Batista de Curitiba, o procurador Deltan Dallagnol propõe a cada espectador da palestra "Liderança Corajosa" que, durante um minuto, discuta com o companheiro ao lado sobre a questão: a Operação Lava-Jato transforma o País? "Outro dia, fiz a mesma proposta para um grupo de mulheres e quase não consegui retomar a palestra", brinca Dallagnol. A plateia ri, conversa e pouco depois o procurador retoma o raciocínio. Diz que a investigação do maior esquema de desvio de recursos e pagamento de propina em estatais brasileiras "infelizmente não muda o País", mas pode despertar uma inédita mobilização de combate à corrupção.
"Vivemos uma janela de oportunidade, o caso Lava-Jato deixou a sociedade altamente sensível e esperançosa de mudanças", diz Dallagnol.
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Dallagnol: A punição da corrupção no País é uma piada de mau gostoDallagnol: não tivemos uma relação com essas manifestaçõesIgreja divulga carta com vetos eleitoraisPara o crime não compensar, é necessário confisco, diz procurador da RepúblicaQuando Dallagnol, com um grupo de colegas, decidiu levar adiante a campanha pelo projeto de iniciativa popular, o ponto de partida foi a Igreja Batista, que frequenta desde criança. Os convites se expandiram. Hoje vão do Congresso Brasileiro de Cirurgiões à Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital, plateia do procurador na noite de 7 de julho em um hotel no Rio. "Vou decepcionar os que esperam mais um momento sobre como lucrar nos negócios.
Weber, Luther King
O palestrante adapta sua apresentação à plateia, mas segue um roteiro padrão que mistura pequenos filmes, tabelas, charges, mapas, citações de intelectuais como Max Weber, um dos pensadores da sociologia, e o pastor e ativista americano Martin Luther King. Vez ou outra, faz referência a alguma passagem bíblica. Rebate acusações de abusos da Lava-Jato, como excesso de prisões preventivas e delações premiadas. Insistentemente defende a tese de que o combate à corrupção "é uma questão de amor ao próximo, de serviço à sociedade".
Criador do curso "Humanismo em Nove Lições", voltado para juízes, e um dos autores do estudo Corpo e Alma na Magistratura Brasileira, o cientista social Luiz Werneck Vianna tem observado a nova geração de profissionais de Direito no Brasil. "São filhos dessas novas correntes que aproximam o Direito da sociedade. Estávamos necrosados em uma tradição positivista que interditava uma percepção nova dos problemas sociais.
Em muitos profissionais, Werneck Vianna identificou traços comuns, como o fato de completarem os estudos em universidades americanas, vínculos com a religião e idades em torno de 40 anos. "A velha tradição está sendo deslocada. A 'common law' (Direito baseado mais na jurisprudência e nas decisões dos tribunais do que apenas no texto da lei) passou a ser incorporada por essas novas gerações, muitos foram estudar nos Estados Unidos. Há um grupo de pessoas formadas no campo do Direito que escolheu a carreira pública e tenta assumir um protagonismo em mudanças no País. Há um movimento em que está presente a mística da salvação, da missão de salvação. Há alguma coisa de revolução dos santos, como a que ocorreu com o advento do protestantismo, nesses juízes e promotores", disse o pesquisador.
Dallagnol em muito se encaixa nesse novo perfil. Em 2003, quando ingressou por concurso no Ministério Público Federal, tinha 23 anos e era o segundo mais novo procurador do País.
O coordenador da Lava-Jato desperta na plateia muita curiosidade sobre os rumos das investigações e a impunidade, mas também sobre sua vida pessoal. Conta que é casado, tem dois filhos e reconhece que sacrifica a vida familiar pela causa do combate à corrupção. Não são raras as perguntas sobre o que planeja no futuro. A uma espectadora que foi mais direta e questionou se pretende entrar para a política, o procurador não afastou a possibilidade.