Uma das cidades com a temperatura média mais elevada de Minas, Governador Valadares também arde com a corrupção na política. O procurador-geral do município, Schinyder Exupery Cardoso, e dois secretários municipais – Jaider Batista (Educação) e Edmilson Soares dos Santos (Desenvolvimento) – foram presos ontem, na sétima fase da Operação Mar de Lama, a força-tarefa que apura fraudes em dispensa de licitações e em certames dirigidos. Ao todo, desde o início da operação, foram presos cinco secretários de Valadares.
O trio é suspeito de receber o que os investigadores chamam de “pedágio” de empresas que prestaram serviços pagos com impostos dos cerca de 300 mil moradores da maior cidade do Vale do Rio Doce. A propina variava de 5% a 10% e foi rateada com outros envolvidos. Em seis contratos pesquisados, há suspeita de superfaturamento em torno de R$ 700 mil. Os investigadores ainda encontraram indícios de montagem de procedimentos administrativos para favorecimento de firmas.
O procurador do Ministério Público Federal (MPF) na cidade, Felipe Siman, afirmou que o secretário de Educação recebeu três propinas, de R$ 5 mil cada, entregues na casa do próprio Jaider: “Foram feitos pagamentos de vantagens indevidas diretamente nas mãos dele”.
Já o promotor Evandro Ventura, do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), acrescentou que o procurador-geral, Shcinyder Cardoso, recebeu propina para emitir parecer favorável aos interesses da quadrilha: “Estamos vendo, na verdade, provas que contratos têm o chamado ‘custo político’. O dinheiro público está sendo retirado de onde deveria e indo para a corrupção”.
A Justiça também expediu mandado de prisão contra Omir Quintino, ex-diretor-geral do Serviço de Abastecimento de Água e Esgoto (Saae), autarquia municipal considerada o berço da quadrilha. Apontado como um dos chefes do esquema, ele está preso desde abril, quando foi deflagrada a primeira fase da Mar de Lama. “Há três ordens de prisão preventiva contra ele”, disse Cristiano Campidelli, delegado da Polícia Federal (PF).
Em pouco mais de quatro meses, 25 pessoas foram presas, entre elas os cinco secretários municipais, três diretores de uma autarquia municipal e cinco vereadores. Outros seis parlamentares estão afastados das funções por ordem judicial.
ELEIÇÕES
Os efeitos da Mar de Lama respingaram em coligações políticas para o pleito de 2016 e atingiram candidaturas tidas como imbatíveis e certas no início do ano. Vereadores que trabalhavam pela reeleição ou que planejavam chegar ao Executivo, por exemplo, agora se preocupam em deixar a prisão.
Não foi por acaso que a Mar de Lama se transformou na maior força-tarefa da atualidade em Minas. Além do MPMG, do MPF e da PF, a operação também reúne o Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle (MTFC) e a Polícia Militar (PM). No início, os investigadores não imaginavam que descobririam uma rede de corrupção tão ampla.
A operação teve início quando técnicos do MTFC, ex-Controladoria Geral da União (CGU), apuraram desvio em repasses da União para o município. O dinheiro deveria ser usado para reparar estragos causados pela chuva de 2014, mas parte do recurso foi surrupiada por servidores do Saae, onde Omir, um dos cabeças, era o dirigente principal.
Os técnicos do MTFC repassaram as informações ao MPF e à PF. As investigações foram aprofundadas e, por meio de escutas telefônicas autorizadas pela Justiça, o procurador e o delegado descobriram que os envolvidos também praticaram crimes no âmbito da Justiça estadual, por isso foi acionado o MPMG.
Entre as falcatruas, a força-tarefa apurou o pagamento de uma espécie de mensalinho aos vereadores para que aprovassem projetos em acordo com a empresa de ônibus que detém o monopólio do transporte de passageiros na cidade. Licitações dirigidas também foram descobertas. Uma delas atingiu a merenda escolar de alunos da rede municipal.
AS SETE FASES DA MAR DE LAMA
» 11/4
Oito pessoas, entre empresários e servidores públicos, são presas por suspeita de fraude em licitação. A pedido do MPF e da PF, a Justiça determina o afastamento de 20 agentes públicos de suas funções, sendo oito dos 21 vereadores.
» 27/4
Mais cinco vereadores são afastados do Legislativo pela Justiça. A operação contou com 30 policiais federais.
» 19/5
Dezessete pessoas, incluindo sete vereadores, são presas. Participam da operação 100 policiais federais, 66 militares e seis servidores do MTFC. O grupo cumpre cinco mandados de prisão preventiva, 15 de temporária, 21 de busca e apreensão e três de sequestros de bens imóveis. Foram apreendidos R$ 101,8 mil e US$ 21 mil, além de carros de luxo e barras de ouro.
» 22/5
O MPMG e a PF prendem o chefe de um cartório em Santo Antônio do Porto, distrito de Valadares. Ele é suspeito de conceder certidão com a data retroativa a uma das sócias da empresa Valadarense. De posse do documento, ela tentou sacar R$ 60 mil de conta bloqueada pela Justiça.
» 21/6
O Gaeco consegue mandado de prisão para o presidente do Sindicato dos Rodoviários de Valadares, Jorge Lopes, e o dono da Valadarense.
» 07/7
A força-tarefa prende dois empresários e um lobista envolvidos em fraude em licitação para a merenda escolar. Um dos detidos embarcaria com a família para os Estados Unidos horas antes de ser detido. Os investigadores suspeitam que ele fugiria do país.
» 10/8
O procurador-geral do município e dois secretários municipais foram presos na manhã de ontem.