Brasília – Os senadores Lindbergh Farias (PT-RJ) e Ronaldo Caiado (DEM-GO) voltaram a protagonizar cenas vergonhosas no plenário pelo segundo dia consecutivo, desta vez com a intervenção do presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), para quem o julgamento de Dilma parece estar ocorrendo em um hospício. O bate-boca obrigou o presidente da sessão, Ricardo Lewandowski, a interromper os trabalhos duas vezes em menos de meia hora. Caiado voltou a insinuar que o senador petista usava drogas. “Tem uma cracolândia dentro do seu gabinete”, disse, referindo-se a Lindbergh como “bandido” e “desqualificado”. Lindbergh rebateu e voltou a gritar que Caiado tinha ligações com o contraventor Carlinhos Cachoeira. “Cachoeira é que sabe da sua vida.” Os dois tiveram que ser contidos por aliados.
Após a nova briga, Renan tentou acalmar os ânimos, mas acabou piorando a situação. Ao suspender a sessão, Lewandowski informou que Renan iria se pronunciar. O presidente do Senado disse então que a Casa está perdendo oportunidade de se afirmar como instituição representativa da sociedade e pediu desculpas ao depoente Luiz Gonzaga Belluzzo, testemunha de defesa de Dilma, pelo “constrangimento” gerado pelos colegas. “Vossa Excelência (Lewandowski) está sendo obrigado a presidir um julgamento em um hospício”, disse. Renan também pediu desculpas ao ministro e ao país pelo comportamento dos senadores. Logo depois, porém, o peemedebista disse: “Fico muito triste porque essa sessão mostra que a burrice é infinita. Ontem, a Gleisi chegou a dizer que o Senado não tem moral para julgar o impeachment”, afirmou. “Justamente a senadora que o presidente do Senado livrou de um indiciamento no STF.” Gleisi rebateu o comentário e, a partir deste momento, a confusão se tornou generalizada.
Lindbergh Farias criticou Renan: “Acredito que o presidente Renan perdeu a chance de ficar calado”. Diversos senadores levantaram de suas cadeiras e partiram para cima do presidente do Senado. Outras discussões paralelas tomaram conta do plenário. Aos gritos de “baixaria, baixaria”, Lindbergh ameaçou ler em plenário a delação de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, que citou políticos em conversas que pareciam operar pelo processo de impeachment. Lewandowski teve de suspender a sessão mais uma vez e decidiu só retomar os trabalhos após o almoço.
No início da tarde, Lewandowski reabriu a sessão anunciando o fim das intervenções dos senadores no discurso de outros parlamentares. Em nome dos aliados da presidente afastada, o senador Jorge Viana (PT-AC) procurou senadores do PSDB para mediar uma proposta de baixar as armas, focar no debate de mérito das testemunhas de defesa e retirar todos o “pela ordem”, que atrasam as falas. Os favoráveis ao impeachment retiraram os questionamentos às testemunhas e avisam que era importante “evitar a provocação” dos aliados de Dilma. “O jogo está jogado e os petistas acham que só têm chance se criarem fatos novos. Por isso estão se exaltando. Temos que ter consciência e não cair nas provocações”, afirmou o presidente nacional do DEM, senador José Agripino (RN).
“Vamos baixar a bola e ouvir as testemunhas de defesa. Interessa-nos o debate de mérito. Ontem ganhamos o debate”, afirmou Lindbergh. Caiado disse que abriram mão de questionar as testemunhas de defesa que são “militantes e não têm nada a acrescentar” ao processo. O senador afirmou que a sociedade acompanha a sessão e vai perceber quem realmente está provocando os confrontos: “A sociedade está analisando bem, está vendo os que estão provocando, agredindo e usando palavrão. A toda ação há uma reação. Ninguém ali está para ficar apenas ouvindo de pessoas que não têm a qualificação moral para falar de qualquer senador”.
NOTA O mal-estar gerado por suas declarações levou Renan Calheiros a divulgar nota à tarde para explicar sua intervenção no STF para ajudar Gleisi. Disse que sua ação junto ao STF foi “impessoal” e, como presidente do Senado, para defender direitos da própria senadora. “Como se constata, as intervenções do Senado são impessoais, transparentes e ditadas pelo dever funcional no intuito de defender a instituição e as prerrogativas do mandato parlamentar. O presidente do Senado reitera a isenção com a qual conduziu todo o processo e lamenta as recorrentes provocações em plenário”, diz a nota. Renan entregou cópia da carta ao presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski.
Na nota, Renan explica que atuou de forma “institucional” para defender a senadora: a primeira ocasião foi no caso da ação da PF em seu apartamento, quando foram feitas ações de busca a apreensão em imóvel funcional onde o marido de Gleisi, o ex-ministro Paulo Bernardo, chegou a ser preso. Na segunda, o Senado questionou o fato de Gleisi ser indiciada pela PF, já que tem foro privilegiado e seu caso precisa passar pelo Supremo. “Trata-se de manifestação pública e institucional decorrente da operação de busca e apreensão realizada no imóvel funcional ocupado pelo senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) e do indiciamento da senadora pela Polícia Federal”, diz a nota.
Mais cedo, Gleisi voltou a repetir, em entrevista a jornalistas, a afirmação que desde quinta-feira vem provocando bate-bocas e reações irritadas de senadores na sessão de julgamento. Gleisi disse que o Senado não tem moral para julgar Dilma porque boa parte dos senadores está sendo investigada, e admitiu, quando questionada, que ela própria está. “O Senado não tem moral para julgar ninguém porque boa parte dos senadores está sendo investigada. Como eu vou fazer esse julgamento? Aponto o dedo para uma pessoa e tem três dedos apontados para mim? Vocês não estão vendo, a presidente não cometeu crime de responsabilidade. Isso aqui é uma farsa”, disse Gleisi.
A senadora disse que iria ligar para o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para conversar. Ela negou, no entanto, que tenha chamado Renan de “canalha”. Coincidentemente, o julgamento sobre a aceitação da denúncia contra Gleisi, inicialmente previsto para a próxima terça-feira, foi adiado. O caso foi retirado da pauta da 2ª Turma do STF, responsável por decidir se torna a senadora e seu marido, o ex-ministro Paulo Bernardo, réus na Lava-Jato. A defesa de Gleisi afirmou que não fez pedido de adiamento, mas confirmou ter recebido a informação do Supremo de que o caso ficaria fora da sessão da próxima semana.