Às vésperas da decisão que pode confirmar o impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff, o segundo de um presidente da República em 24 anos, as conversas e articulações em Brasília são intensas. Terminada a fase de ouvir as testemunhas da acusação e da defesa, marcada por muito tumulto e bate-boca no Senado, parlamentares e líderes de ambos os lados trabalham para tentar virar os últimos votos. Principal interessada, a presidente Dilma também tentará sua última cartada amanhã, quando, na penúltima etapa do julgamento, dará seu depoimento e será interrogada pelos senadores.
Mesmo depois de feitas as oitivas, a saída definitiva da presidente Dilma Rousseff (PT) do Palácio do Planalto, a essa altura, só se reverterá por um milagre. O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, afirmou que a expectativa do governo do presidente em exercício Michel Temer (PMDB) melhorou depois do início do julgamento. Ele acredita em 61 votos pelo afastamento de Dilma e a consequente permanência de Temer.
Entre os senadores, a estimativa é de que os 54 votos necessários para o impeachment sejam superados na sessão de terça-feira. A votação será nominal pelo placar eletrônico. Antes, porém, os parlamentares inscritos poderão se manifestar sobre o processo. Senadores favoráveis e contrários ao afastamento também terão o direito de se manifestar antes de o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, perguntar ao plenário se Dilma cometeu crime de responsabilidade e deve ser condenada à perda do cargo.
Dilma deve comparecer ao Senado acompanhada de uma comitiva de mais de 30 pessoas, que inclui ex-ministros e o seu padrinho político, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Foi ele quem a aconselhou sobre o discurso a ser feito em sua última oportunidade antes do julgamento final. Na sexta-feira, os dois conversaram no Palácio da Alvorada. Em ofício enviado ao Senado, Dilma pediu uma sala reservada para ficar com o grupo e se preparar para a audiência.
DISCURSO INCISIVO A petista foi orientada por Lula a dar um discurso forte e direto, dizendo que só está sendo processada porque não cedeu a pressões para parar as investigações da Operação Lava-Jato. No mesmo dia, coube a Lula conversar com o senador Edison Lobão (PMDB-MA), que foi ministro de Minas e Energia nos governos de Lula e Dilma, e já votou contra a presidente afastada. Agora diz estar indeciso.
O PT tenta ainda atrair os senadores João Alberto (PMDB-MA) – que havia se posicionado a favor de Dilma, mas na última sessão foi contra – e Roberto Rocha (PSB-MA). A ordem da cúpula petista é atender às reivindicações de todos nas disputas municipais, mesmo que para isso seja necessário mudar parceiros nas alianças.
Também na sexta-feira, a petista teve encontro reservado com o ex-presidente Fernando Collor (PTC-AL), agora um dos seus 81 juízes. O senador não anunciou claramente o voto na sessão que decidiu pelo prosseguimento do processo contra Dilma. Quando votou pela continuidade do impeachment, se disse injustiçado por ter sofrido impeachment em 1992 e depois ter sido inocentado. Em outra ocasião, Collor comparou o processo de Dilma com o seu e defendeu que a chefe do Executivo é a responsável por improbidades administrativas e deve responder por crime de responsabilidade.
Ministro e opositores O ex-ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, quarta testemunha da defesa, afirmou na longa sessão de ontem que os decretos dos créditos suplementares seguiram estritamente a lei. Segundo ele, também não há base para crime de responsabilidade na questão do pagamento de passivos aos bancos públicos, as chamadas pedaladas fiscais.
A denúncia contra a presidente Dilma diz que os decretos feriram a lei por ter sido feitos sem a autorização do Congresso. Segundo Barbosa, esse é o sistema de elaboração há 10 anos sem nunca ser questionado. “O processo de impeachment é, por definição, uma decisão política a partir da verificação de um crime. Não o contrário. Não se parte de uma decisão política para depois caracterizar um crime”, afirmou.. Barbosa foi criticado por opositores, que atacaram a política fiscal da gestão petista. O líder do governo no Senado, Aloysio Nunes (PSDB-SP), chegou a afirmar que os argumentos apresentados por ele são um verdadeiro tiro no pé da defesa”.
Último a depôr na fase de testemunhas, o professor de direito Ricardo Lodi, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, afirmou que não é qualquer violação à lei de orçamento que pode virar crime de responsabilidade. Ele foi ouvido como informante, por ter atuado como perito e advogado de Dilma. Lodi afirmou que a “analogia entre atrasos e operações de crédito foi uma construção criada depois dos fatos serem supostamente praticados”.
ÚLTIMAS ETAPAS
Amanhã
» Depoimento da presidente afastada Dilma Rousseff, previsto para durar 30 minutos
» Interrogatório de Dilma, com cinco minutos para cada pergunta; sem prazo determinado para respostas
» Debate entre advogados de acusação e defesa, sendo uma hora e meia para a acusação, outra uma hora e meia para a defesa, mais uma hora para réplicas e outra uma hora para tréplicas
Terça-feira
» Pronunciamentos de senadores, com 10 minutos para cada parlamentar inscrito
» Encaminhamento da votação: dois senadores falam a favor e dois contra o impeachment, com cinco minutos para cada um
» Votação do impeachment pelos senadores no painel eletrônico
Enquanto isso...
...tendência difícil de mudar
Levantamento do EM, atualizado ontem, indica que, dos 64 parlamentares que declararam como vão se posicionar, 46 vão pelo impeachment e 18 contrários. Os senadores Acir Gurgacz (PDT-RO) e Omar Aziz (PSD-AM), que votaram pela admissibilidade do processo de impeachment e também pela pronúncia, são os dois únicos que permanecem indecisos. Há 14 senadores que preferiram não revelar o voto. Desses, apenas Elmano Ferrer (PTB-PI), Otto Alencar (PSD-BA) e Roberto Muniz (PP-BA) disseram “não” à pronúncia da presidente afastada, Dilma Rousseff. Desta maneira, se os posicionamentos forem mantidos, o placar final ficaria 59 a favor do impeachment e 21 contra. Para afastar a presidente de maneira definitiva são necessários 54 votos. Em levantamento feito na terça-feira, os senadores Antônio Carlos Valadares (PSB-SE), Lúcia Vânia (PSB-GO) e José Maranhão (PMDB-PB) não haviam sido localizados. Agora, José Maranhão afirmou que votará pelo impeachment e os outros dois preferiram não revelar como se posicionarão. Aliados da petista, mesmo reconhecendo reservadamente que a missão é difícil, ainda apostam na virada de pelo menos cinco ou seis votos. Todas as fichas são colocadas no discurso de defesa que a presidente fará amanhã e no poder de articulação do ex-presidente Lula. Um dos planos é identificar os conflitos políticos regionais para tentar atrair votos. O plano é não pôr parlamentares petistas como interlocutores para tentar virar o posicionamento dos colegas. Desta maneira, os aliados dividiram a tarefa com o grupo formado pelos senadores Roberto Requião (PMDB-PR), Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Kátia Abreu (PMDB-TO) e Lídice da Mata (PSB-BA).