Brasília – O Supremo Tribunal Federal (STF) terá mais uma mulher a comandá-lo a partir de amanhã. Acostumada a hábitos simples, como dirigir seu próprio carro até o trabalho, e dona de uma caneta “pesada” quando o assunto é criminal, a mineira Cármen Lúcia Antunes Rocha, de 62 anos, deve imprimir uma marca de austeridade. Para os que a conhecem, é difícil prever o foco de seus dois anos de gestão no Supremo e no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mas eles poderão incluir a defesa dos direitos das mulheres e melhores condições para o cumprimento de penas.
Entusiasta das Jornadas Maria da Penha, que há 10 anos uniformizaram os atendimentos às vítimas de violência, Cármen Lúcia é idealizadora do projeto Justiça pela Paz em Casa, que incentivou tribunais a apressarem o maior número de casos de assassinatos contra mulheres no Brasil. Uma outra hipótese é que ela invista na Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apec), que procura humanizar o cumprimento de penas no regime semiaberto, sem vigilância rígida, e exibem menores níveis de reincidência criminal. A proposta foi criada por voluntários da Igreja Católica – Cármen Lúcia é conhecida por ser religiosa e procurar ter imagens de santos em locais de trabalho.
Ao assumir a presidência do STF, Cármen Lúcia deixará a 2ª Turma e a maioria dos processos da Operação Lava-Jato. De perfil conservador em direito penal – leia-se: rigor na hora de mandar prender e negar solturas –, ela será substituída na turma por Ricardo Lewandowski, um garantista dos direitos individuais. No plenário do Supremo, restarão apenas os processos contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para ela analisar na maior operação de combate à corrupção do país.
HÁBITOS A ministra costuma acordar bem cedo, às 5h. Nesse horário, ela já começa a analisar os habeas corpus, os pedidos de soltura de réus ou de investigados pela polícia. Os advogados costumam se entristecer quando um HC cai nas mãos da mineira de Montes Claros. Ela é muito dura com os investigados, e costuma mantê-los na cadeia na maior parte dos casos, avaliam.
No gabinete, a ministra trabalha até tarde. Conhece os funcionários pelo nome, inclusive os terceirizados. Semana passada, ao se despedir dos colegas da 2ª Turma, disse que não é adepta a comemorações. “Não tenho a mesma, digamos, tranquilidade para algumas funções do cargo de ministro do Supremo, porque não gosto muito de festas, de nada disso. Eu gosto de processo.”
Uma marca certeira da gestão de Cármen Lúcia deve ser a austeridade com os gastos públicos, e não só por causa da crise financeira pela qual o país atravessa. A ministra é avessa a práticas que julga indevidas mesmo sendo permitidas ou costumeiras no serviço público. Ela fez uma viagem à Bélgica no ano passado e devolveu mais de R$ 10 mil das diárias a que tinha direito. Auxiliares da ministra dizem que ela o fez pelo simples fato que não teve que desembolsar nada. Cármen Lúcia exige a mesma austeridade dos servidores que a acompanham. Um deles faz o seguinte raciocínio: “Se viajou e o tribunal pagou avião, todo transporte terrestre, um bom almoço e voltou pra casa no mesmo dia, para que receber diária?”.
Outra marca é a transparência. Em 2012, enquanto servidores iam à Justiça para não ter os salários publicados na internet por determinação da Lei de Acesso à Informação, Cármen Lúcia pediu que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que presidia à época, colocasse a íntegra do contracheque dela na rede. O documento foi ao ar até com o número da conta bancária da ministra, o que causou surpresa no setor de segurança.
CONFISSÃO INUSITADA Alguns julgamentos projetaram a ministra pelas posições tomadas. No mensalão, afirmou ser um absurdo concordar com a tese da defesa dos parlamentares de que o dinheiro recebido do empresário Marcos Valério não era pagamento de propina, mas caixa 2 de campanha eleitoral – uma confissão “inusitada e inédita”. “Acho estranho e grave que alguém diga com tranquilidade que houve caixa 2. Caixa 2 é crime, é uma agressão à sociedade. Dizer isso no tribunal me parece que é grave porque passa a ideia de que ilícito pode ser praticado e tudo bem. Não é tudo bem.”
Quando o STF confirmou a decisão de Teori Zavascki de mandar prender o então senador Delcídio do Amaral (ex-PT-MS), em novembro, a ministra afirmou que a corrupção não venceria as instituições que trabalham para combatê-la. “Aviso aos navegantes dessas águas turvas de corrupção e das iniquidades: criminosos não passarão a navalha da desfaçatez e da confusão entre imunidade, impunidade e corrupção. Não passarão sobre os juízes e as juízas do Brasil. Não passarão sobre novas esperanças do povo brasileiro, porque a decepção não pode estancar a vontade de acertar o espaço público.”
Ao relatar a ação direta de inconstitucionalidade que pretendia proibir o lançamento de biografias, a ministra foi enfática defensora da liberdade de expressão: “Cala a boca já morreu, quem disse foi a Constituição”.
Entusiasta das Jornadas Maria da Penha, que há 10 anos uniformizaram os atendimentos às vítimas de violência, Cármen Lúcia é idealizadora do projeto Justiça pela Paz em Casa, que incentivou tribunais a apressarem o maior número de casos de assassinatos contra mulheres no Brasil. Uma outra hipótese é que ela invista na Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apec), que procura humanizar o cumprimento de penas no regime semiaberto, sem vigilância rígida, e exibem menores níveis de reincidência criminal. A proposta foi criada por voluntários da Igreja Católica – Cármen Lúcia é conhecida por ser religiosa e procurar ter imagens de santos em locais de trabalho.
Ao assumir a presidência do STF, Cármen Lúcia deixará a 2ª Turma e a maioria dos processos da Operação Lava-Jato. De perfil conservador em direito penal – leia-se: rigor na hora de mandar prender e negar solturas –, ela será substituída na turma por Ricardo Lewandowski, um garantista dos direitos individuais. No plenário do Supremo, restarão apenas os processos contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para ela analisar na maior operação de combate à corrupção do país.
HÁBITOS A ministra costuma acordar bem cedo, às 5h. Nesse horário, ela já começa a analisar os habeas corpus, os pedidos de soltura de réus ou de investigados pela polícia. Os advogados costumam se entristecer quando um HC cai nas mãos da mineira de Montes Claros. Ela é muito dura com os investigados, e costuma mantê-los na cadeia na maior parte dos casos, avaliam.
No gabinete, a ministra trabalha até tarde. Conhece os funcionários pelo nome, inclusive os terceirizados. Semana passada, ao se despedir dos colegas da 2ª Turma, disse que não é adepta a comemorações. “Não tenho a mesma, digamos, tranquilidade para algumas funções do cargo de ministro do Supremo, porque não gosto muito de festas, de nada disso. Eu gosto de processo.”
Uma marca certeira da gestão de Cármen Lúcia deve ser a austeridade com os gastos públicos, e não só por causa da crise financeira pela qual o país atravessa. A ministra é avessa a práticas que julga indevidas mesmo sendo permitidas ou costumeiras no serviço público. Ela fez uma viagem à Bélgica no ano passado e devolveu mais de R$ 10 mil das diárias a que tinha direito. Auxiliares da ministra dizem que ela o fez pelo simples fato que não teve que desembolsar nada. Cármen Lúcia exige a mesma austeridade dos servidores que a acompanham. Um deles faz o seguinte raciocínio: “Se viajou e o tribunal pagou avião, todo transporte terrestre, um bom almoço e voltou pra casa no mesmo dia, para que receber diária?”.
Outra marca é a transparência. Em 2012, enquanto servidores iam à Justiça para não ter os salários publicados na internet por determinação da Lei de Acesso à Informação, Cármen Lúcia pediu que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que presidia à época, colocasse a íntegra do contracheque dela na rede. O documento foi ao ar até com o número da conta bancária da ministra, o que causou surpresa no setor de segurança.
CONFISSÃO INUSITADA Alguns julgamentos projetaram a ministra pelas posições tomadas. No mensalão, afirmou ser um absurdo concordar com a tese da defesa dos parlamentares de que o dinheiro recebido do empresário Marcos Valério não era pagamento de propina, mas caixa 2 de campanha eleitoral – uma confissão “inusitada e inédita”. “Acho estranho e grave que alguém diga com tranquilidade que houve caixa 2. Caixa 2 é crime, é uma agressão à sociedade. Dizer isso no tribunal me parece que é grave porque passa a ideia de que ilícito pode ser praticado e tudo bem. Não é tudo bem.”
Quando o STF confirmou a decisão de Teori Zavascki de mandar prender o então senador Delcídio do Amaral (ex-PT-MS), em novembro, a ministra afirmou que a corrupção não venceria as instituições que trabalham para combatê-la. “Aviso aos navegantes dessas águas turvas de corrupção e das iniquidades: criminosos não passarão a navalha da desfaçatez e da confusão entre imunidade, impunidade e corrupção. Não passarão sobre os juízes e as juízas do Brasil. Não passarão sobre novas esperanças do povo brasileiro, porque a decepção não pode estancar a vontade de acertar o espaço público.”
Ao relatar a ação direta de inconstitucionalidade que pretendia proibir o lançamento de biografias, a ministra foi enfática defensora da liberdade de expressão: “Cala a boca já morreu, quem disse foi a Constituição”.