Brasília – O ministro da Transparência, Torquato Jardim, está convencido que a proibição das doações de empresas para candidatos estimula o crime organizado a participar diretamente das eleições. “Eu sou contra qualquer proibição, o incentivo é agir conforme a lei. Quanto mais proibição, mais atração”, disse. Ex-ministro do TSE e professor de direito constitucional da Universidade de Brasília (UnB) por 20 anos, ele chegou ao cargo depois da queda do primeiro indicado pelo governo Michel Temer, envolvido com aconselhamentos a investigados na Operação Lava-Jato. Em meio a protestos de servidores por causa da troca de nome da CGU, Torquato assumiu a pasta no início de junho e, hoje, garante que o assunto está resolvido.
Os acordos de leniência de empresas envolvidas na Lava-Jato estão parados, como o da SBM, que confessou os crimes, entregou documentos, se dispôs a pagar milhões, mas o MP não homologa. Como é que o senhor avalia isso?
A lei cometeu um equívoco. Conferiu competência exclusiva à Corregedoria-Geral da União (CGU) — que era a grafia da época — para tratar desse assunto. A lei desconheceu o papel constitucional expresso do Tribunal de Contas de União (TCU), do Ministério Público Federal (MPF) e da Advocacia-Geral da União (AGU).
Quais desafios o senhor já encontrou em relação a este trabalho?
O maior desafio é dar consequência ao quanto é apurado.
Com toda a experiência que o senhor tem em tribunais eleitorais, qual sua opinião sobre a nova regra que proíbe doação de empresas para campanha?
Proibir a pessoa jurídica, proibir a empresa é a melhor solução? O ministro Gilmar Mendes, presidente do TSE, já disse que não. Disse que é um salto no escuro. As notícias mostram que já são 20 e tantos mil doadores que o CPF coincide com o do Bolsa-Família. Quem recebe Bolsa-Família não pode ter dinheiro, em princípio, para fazer doação.
O senhor comparou com a lei seca americana e um dos pontos defendidos por especialistas é que o Brasil, com essa proibição, pode fazer com quem o próprio crime organizado doe e não mais o empresário.
Isso eu já falei mais de uma vez, em diferentes palestras. O ministro Gilmar Mendes também falou. A candidata a vereadora mais forte em Nova Iguaçu (RJ) é a filha do Fernandinho Beira-Mar. Saiu até a fotografia dela nos jornais. Então, é o que o ministro Gilmar Mendes, eu e outros antecipamos a pergunta: o crime organizado vai ficar de fora?. O crime organizado não vai ficar fora do processo eleitoral.
O senhor acha que a lei pode ser revista?
Eu acho que vai ser revista. Haverá uma emenda constitucional para resolver o assunto, porque, aliás, é rica a jurisprudência brasileira modificada pelo Congresso. Toda vez que a Justiça Eleitoral ou o Supremo afirma que algo está incompatível com a realidade política, fazem uma emenda constitucional. A proibição de doação para campanha eleitoral de pessoas jurídicas foi muito abrupta, veio sem transição, para que o sistema eleitoral pudesse, dentro dos bons parâmetros da ética democrática, conceder um meio alternativo. Temo a prevalência de meios escusos mais sofisticados nessa mudança tão abrupta.