Dívida com servidores públicos, falta de remédios nos postos de saúde, convênios com os governos federal e estadual suspensos e queda na arrecadação. A lista de problemas que aguardam os novos prefeitos a partir de janeiro de 2017 é extensa e para a maior parte deles não existe solução viável a curto prazo. “É o cenário mais sombrio possível, um cenário de caos”, alerta o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski.
A redução no número de candidatos que tentam a reeleição é reflexo das dificuldades que aguardam os gestores municipais. Segundo a CNM, este ano, o número de prefeitos que tentam um segundo mandato caiu em relação aos dois últimos pleitos. Dos 4.024 prefeitos que estão no primeiro mandato e poderiam concorrer novamente, 2.768 estarão nas urnas – 68%. Mais de 1,2 mil prefeitos desistiram da reeleição.
Paulo Ziulkoski reclama da falta de diálogo com o Palácio do Planalto e considera que a situação piorou desde que o presidente Michel Temer (PMDB) assumiu o governo federal. “A relação com o governo federal não existe mais. Não existe qualquer diálogo”, afirma o presidente da CNM. Ele critica a proposta de emenda à Constituição (PEC) que cria um teto para os gastos da União. “Imagina o que tem de demanda reprimida na saúde e na educação. Esse teto tornará a administração municipal totalmente inviável”, avalia.
A proposta foi apresentada pelo presidente Temer para limitar as despesas dos cofres públicos em momento de dificuldade financeira. De acordo com o texto, em 2017, o limite de gastos será a despesa primária federal deste ano, reajustada pelo IPCA de 2016. A partir de 2018, será usado o teto do ano anterior acrescido da inflação. Nos últimos dias, o governo federal tem intensificado os debates com os líderes da base aliada no Congresso para acelerar a tramitação da PEC, e a expectativa é de que o texto seja votado na comissão especial na próxima semana e seja levado ao plenário da Câmara ainda neste mês.
ENTRAVE Para Antônio Andrada (PSB), presidente da Associação Mineira dos Municípios (AMM) e prefeito de Barbacena, na Região Central do estado, os próximos prefeitos enfrentarão dificuldades em duas situações. “A primeira vem do cenário externo, com o problema econômico que não se resolve e a questão política, que continua sendo um entrave, já que a falta de continuidade na gestão pública federal faz com que as interlocuções fiquem prejudicadas. Já no cenário interno, da própria prefeitura, temos as dívidas que quase todos os prefeitos vão deixar para seus sucessores e a falta de perspectiva na melhora da arrecadação”, conta Andrada.
Segundo o presidente da AMM, anúncios de cortes e reajustes orçamentários, apesar de ter o objetivo de ganhar a confiança do mercado internacional, “representam uma enorme dor de cabeça para os prefeitos”. “Quando o governo federal anuncia que, por falta de dinheiro, vai redimensionar alguns programas ou suspendê-los de vez, quem lida com o problema são os prefeitos. A população conta com esses programas no próximo ano e serão os novos prefeitos que terão de explicar o fim de alguns deles”, diz Andrada.
Como exemplo das dificuldades que aguardam os gestores municipais, o prefeito aponta o atraso dos repasses do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do governo de Minas aos municípios mineiros na semana passada. “Pela primeira vez em 20 anos, o estado atrasou esse pagamento. O governo estadual deve uma grande quantia para as prefeituras destinada à saúde e firmou um acordo com o Ministério Público, mas a primeira parcela, de R$ 90 milhões, não foi repassada”, afirma o prefeito de Barbacena.
A AMM apresentou ao procurador-geral de Justiça do estado, Carlos André Mariani, uma representação em que se queixa dos atrasos. O ICMS é a principal fonte de receita do estado e 25% do valor arrecadado deve ser repassado às prefeituras semanalmente. O governo de Minas informou que o atraso foi motivado por problemas financeiros.
RIVALIDADE Em cenário de tamanha dificuldade, o presidente da AMM foi perguntado sobre o motivo de os candidatos ainda quererem assumir as prefeituras e gastar quantidades significativas de dinheiro nas campanhas eleitorais. “Os números mostram que este ano teremos uma grande desistência dos prefeitos que poderiam disputar a reeleição. Mas, principalmente nas cidades pequenas, que são a grande maioria no Brasil e em Minas, a disputa do poder está ligada a rivalidades tradicionais. Muitas vezes, em disputas familiares antigas, os candidatos se esquecem dos problemas movidos pela busca de uma vitória”, analisa Andrada.