São Paulo, 04 - O alto número de abstenções - não comparecimento do eleitorado às urnas - nas eleições para a Prefeitura de São Paulo realizadas no domingo, 2, também se repetiu no restante do País. Enquanto na capital paulista 1,94 milhão de eleitores, ou 18%, não compareceu à votação do primeiro turno, em todo o Brasil 17,6% do eleitorado se absteve de votar, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Segundo a corte eleitoral, o número, que não engloba votos nulos e em branco, é o maior já registrado em primeiros turnos das eleições municipais desde 2000. Naquele ano, 14,99% do eleitorado se absteve de votar. O TSE, no entanto, não tem um sistema que identifique a razão das abstenções e, até a publicação desta reportagem, não respondeu aos questionamentos da reportagem sobre esses dados.
Nas eleições municipais seguintes, em 2004, a taxa caiu levemente, para 14,22%. Em 2008, o número se manteve próximo, 14,50% e deu um salto em 2012, quando foram registradas 16,41% de ausências.
Para o professor de ciência política da Universidade de São Paulo, José Álvaro Moisés, a análise dos dados de abstenção requer cuidados. Segundo Moisés, o fato de o TSE não avaliar com exatidão os motivos das ausências abre precedente para o que ele chama de "dedução aproximativa da realidade".
De acordo com o cientista político, mesmo que as eleições municipais de 2016 já tenham em seu quadro eleitores com o cadastro biométrico - cuja adoção visa, entre outros fatores, atualizar cadastros antigos - parte das abstenções podem vir de erros nesse cadastro, como mudança de endereço do eleitor, ausência por motivos de trabalho e até morte.
"Quando as pessoas se abstêm, elas não precisam justificar. Se o TSE quiser avançar nessa questão deveria criar um pequeno formulário para que o eleitor preenchesse e justificasse melhor a razão pela abstenção. Portanto, sem esses dados, avaliar precisamente os dados é especulativo e intuitivo, obtidos através de uma percepção analítica", diz o professor da USP.
Moisés avalia ainda que as abstenções podem representar uma latente falta de interesse político por parte do eleitorado nos últimos anos.
Segundo ele, existe no Brasil um crescimento na descrença da população em relação a partidos políticos, o Congresso Nacional e quanto ao governo. "Cerca de 70% da população prefere a democracia como sistema político no País, mas essa mesma população está muito crítica com a forma como democracia está sendo conduzida no Brasil", diz Moisés. "Em todas as pesquisas que fiz, o indicativo é que a corrupção é o maior problema identificado pelos brasileiros a respeito da democracia."
Para o cientista político e professor do Insper, Carlos Melo, o aumento das abstenções está ligado a uma "crise de representatividade". "Vamos lembrar que, em 2013, as pessoas já foram às ruas gritar que os políticos eleitos na ocasião não os representavam. A eleição de João Doria, cujos 3,08 milhões de votos são menores do que a soma de abstenções (1,94 milhão) e os votos brancos (367 mil) e nulos (788 mil), é um exemplo disso", diz Melo. Na avaliação dele, esses dados preocupam já que, "as eleições municipais são aquelas que mais mobilizam o eleitorado por ser algo muito mais próximo do que o governador ou o prefeito."
Na avaliação de Moisés, em um curto prazo, o crescimento no número de abstenções não gera consequências graves, mas representa uma "deslegitimação de algo que é importante para a democracia, que é o voto". Segundo ele, o aumento de ausências significa um número maior de pessoas que não se importam com o voto.