Os peritos do TSE encontraram uma discrepância de R$ 3,55 milhões entre o valor recebido da campanha presidencial da chapa Dilma e Temer pela Focal e o declarado pela empresa como pago à subcontratadas para a realização de eventos - uma diferença de 324%. Foram encontrados ainda pagamentos para empresas distintas das declaradas e falta comprovação de serviços.
A Focal foi a segunda maior fornecedora da campanha de reeleição de Dilma. Recebeu R$ 24 milhões - atrás apenas do marqueteiro João Santana, que recebeu R$ 70 milhões. A firma pertence à Carlos Roberto Cortegoso, empresário de São Bernardo do Campo, no ABC paulista, conhecido como "o garçom de Lula". Ele é investigado por crimes financeiros nas operações Lava Jato (esquema de desvios na Petrobras) e Custo Brasil (esquema de desvios via Ministério do Planejamento).
Um ponto destacado no laudo do TSE, é que pelo menos R$ 262 mil foram pagos a empresas diversas daquelas declarados pela Focal como subcontratados para a campanha.
A Focal teve quebra de sigilo decretada nas investigações do TSE que pedem a cassação da chapa Dilma/Temer. Os valores pagos a subcontratadas são um dos principais problemas encontrados nos repasses feitos para a empresa de Cortegoso. Segundo laudo, ela recebeu R$ 3,2 milhões de forma irregular da campanha presidencial de 2014 e pode ter sido usada para desvios de recursos eleitorais.
"A documentação fiscal apresentada pela Focal não comprova a efetiva e inequívoca prestação dos serviços e materiais produzidos na campanha presidencial em sua integralidade", sustentam os peritos contáveis, que fizeram análise das notas emitidas pela empresa. "Conforme documentação encaminhada, a Focal declarou que vários produtos e serviços de eventos, fornecidos à campanha, foram subcontratados. Contudo, da análise, não foi possível identificar quais produtos e serviços foram realizados diretamente pela empresa e quais foram subcontratados."
"A empresa não possui controles adequados para subcontratação de empresas, deficiências nos registros contábeis e não apresentou documentos hábeis a comprovar que os produtos e serviços contratados pela chapa presidencial eleita em 2014 foram integralmente produzidos e entregues à campanha, não afastando nessa hipótese, desvio de finalidade dos gastos eleitorais para outros fins que não o de campanha", concluíram quatro peritos contábeis do TSE, que analisaram gastos com gráficas da campanha de reeleição de Dilma.
Os dados contábeis do TSE permitirão aos investigadores criminais o rastreio de possíveis valores ilícitos movimentados por Cortegoso, em favor do PT. "A análise da perícia contábil no fornecimento de bens e serviços da empresa Focal Confecção e Comunicação Visual Ltda à chapa presidencial eleita em 2014 apresentaram inúmeras inconsistências", registra o laudo, que é de 22 de agosto, e está anexado à Ação de Investigação Judicial Eleitoral, 1943-58, do TSE.
Os peritos identificaram cinco frentes principais de problemas: pagamentos sem prestação de serviços, que podem ter servido para desvios de recursos; lançamento de nota fiscal que não foi registrada na prestação de contas da chapa presidencial, mas com contabilidade de recebimento em espécie pela empresa; registro de venda de materiais impressos de publicidade com quantia superior à entregue; problemas com subcontratações, comprovações de serviços e incompatibilidade de valores lançados.
O documento tem 221 páginas e 16 anexos e foi elaborado pelos contadores Eron Junior Vieira Pessoa , Alexandre Velloso de Araújo, José Carlos Vieira Pinto e Thiago José Rodrigues de Queiroz.
Subcontratações
Outro apontamento de interesse às investigações criminais é sobre as subcontratações feitas pela Focal. "A documentação fiscal apresentada pela Focal não comprova a efetiva e inequívoca prestação dos serviços e materiais produzidos na campanha presidencial em sua integralidade.
A análise do documentos disponibilizados pela Focal, que declarou que vários produtos e serviços de eventos, fornecidos à campanha, foram subcontratados. O problema foi que os peritos não puderam identificar "quais produtos e serviços foram realizados diretamente pela empresa e quais foram subcontratados".
"Importa ressaltar que a Focal remunera suas subcontratadas por um valor muito inferior àquele que foi cobrado da chapa presidencial eleita em 2014. A Focal cobrou da campanha presidencial R$ 5,1 milhões em bens e serviços que foram subcontratados a outras empresas por R$ 1,5 milhão", informa o laudo.
Um problema destacado foi a identificação de "notas fiscais referentes à aquisição de materiais, entregues a outras empresas", mas sem a localização da "documentação fiscal referente à subcontratação dessas empresas". Nem do "trânsito dos insumos entre a Focal e essas empresas, e à produção de qualquer produto relacionado à campanha periciada".
PT
O crescimento da Focal acompanha a ascensão do PT no poder. No fim dos anos 1990, Cortegoso, um ex-garçom de São Bernardo, montou uma empresa de produção de camisetas e material de campanha. A Focal, que atualmente presta serviços ao PT, foi aberta em 2005 e tem sede em um galpão, no ABC paulista. Ela sucedeu a Ponto Focal, usada até aquele ano para prestar serviços ao partido. A empresa está registrada em nome da filha e de um funcionário, mas é de Cortegoso.
A partir de 2003, o negócio cresceu rapidamente e ele virou o principal fornecedor do partido. Os primeiros negócios suspeitos com o PT surgiram em 2005, quando Cortegoso e a Focal foram citados pelo publicitário Marcos Valério na CPI dos Correios como destinatários de dinheiro de caixa 2 do mensalão. Os membros da comissão concluíram que a empresa teria recebido R$ 300 mil do esquema.
Mesmo alçado ao centro do - até então - maior escândalo do PT, Cortegoso não teve problemas para continuar como fornecedor do partido. Em 2006, na campanha à reeleição de Lula pagou R$ 3,9 milhões à Focal. Quatro anos depois, na primeira campanha de Dilma, os gastos do partido com a empresa quase quadruplicaram, chegaram a R$ 14,5 milhões.
Desde a disputa de reeleição de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006, ele virou o principal fornecedor de estruturas de palanques e materiais de campanha, como faixas, placas e banners. O empresário é conhecido como "garçom de Lula" por ter trabalhado em restaurante onde sindicalistas petistas se encontravam.
Defesa de Dilma
A defesa da campanha da ex-presidente Dilma Rousseff contesta o laudo do TSE. Segundo o advogado Flávio Caetano, os peritos "não realizaram" todos os procedimentos de investigação necessários sobre os serviços de gráficas, como análise de documentos indispensáveis, realização de diligências e vistorias necessárias. "Ao considerar o laudo pericial como insuficiente, incompleto e impreciso, a defesa de Dilma Rousseff requereu ao TSE que nova perícia contábil seja realizada e considere as 8 mil páginas de documentos juntadas aos autos e não examinadas pela perícia anterior."
Resumo do parecer divergente
O laudo divergente foi apresentado ao TSE e sustenta que as gráficas efetivamente prestaram serviços e que todo material foi entregue, com registros. O parecer contábil da defesa tem mais de 8 mil páginas, em 37 volumes de documentos. "Concluiu pela insuficiência do laudo pericial elaborado pelos peritos judiciais (de apenas 200 páginas), que deixou de analisar documentos indispensáveis, bem como de realizar diligências e vistorias necessárias."
"Após a análise de mais de 8 mil documentos, disponíveis em fontes abertas, e que não foram apreciados pelos peritos do TSE, o Parecer Contábil Divergente comprovou que os serviços contratados com as empresas Focal, VTPB E Red Seg foram devidamente prestados, inexistindo qualquer suspeita de que tivesse havido desvios de valores”, informa a defesa.
O TSE negou nova perícia na sexta-feira e considerou a medida protelatória.
O advogado da campanha informou ainda que a Focal presta serviços de montagens de palanques e comícios em todo o País e que foi contratada formalmente e que realizou os serviços da forma combinada, com preço de mercado.