“É a queda da República”, disse o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, o deputado federal Osmar Serraglio (PMDB-PR). “Eu não sei quem tem a temer. Algumas pessoas sabem o que fizeram durante esse período. Essas pessoas que fizeram coisa errada, pode ser que estejam com medo. Uma coisa é o Eduardo Cunha fora da cadeia, outra é o Eduardo Cunha na cadeia”, também comentou o deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força Sindical, um dos amigos e aliados do ex-deputado. A prisão preventiva do ex-presidente da Câmara, por ordem do juiz federal Sérgio Moro, que coordena a Operação Lava-Jato, e os rumores imediatos de sua delação premiada fizeram a capital federal tremer. Afinal, mesmo esperada, tratava-se da prisão do ex-todo-poderoso presidente da Câmara, que abriu o caminho para o impeachment de Dilma Rousseff e que chegou a controlar uma “bancada” de mais 200 parlamentares.
A apreensão ficou evidente na reação, ou na falta de reação, do plenário da Câmara, quando o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) anunciou a prisão. Não houve manifestações, nem contra nem a favor, enquanto o deputado fazia o anúncio, como se seus pares ficassem sem ter o que pensar diante do tamanho do estrago de uma eventual delação premiada de Cunha. Integrantes do Conselho de Ética defenderam que ele faça delação. “Se ele tem algo a revelar, acho bom que o faça. É preciso tirar de baixo do tapete muita coisa que estava escondida”, afirmou o deputado Marcos Rogério (DEM-RO), que foi relator do processo de cassação de Cunha.
O impacto da prisão supera o da do ex-senador Delcídio do Amaral, em novembro. Quando foi preso, acusado de obstruir as investigações da Lava-Jato, ele disse que não faria delação, mas acabou cedendo e forneceu revelações comprometedoras que fizeram as investigações avançarem. O temor agora é de que uma eventual delação de Cunha dê novo fôlego à Lava-Jato. Cunha foi preso no início da tarde perto do prédio onde mora por policiais federais e levado em um jato Embraer 145 para Curitiba, onde chegou por volta das 17h30. Antes de encontrar Cunha em Brasília, a Polícia Federal tentou prendê-lo em sua casa na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio, pela manhã. Em seguida, os agentes foram ao apartamento funcional que ele ainda ocupava na Asa Sul, em Brasília. O ex-deputado já tinha uma mala preparada para uma eventual prisão e não teve nenhuma reação à prisão. Ele estava na companhia de um de seus advogados. Além da prisão, a Justiça decretou a indisponibilidade de bens de Cunha no valor de R$ 220.677.515,24. A decisão foi dada pela 6.ª Vara Federal de Curitiba em ação civil de improbidade administrativa movida pela Procuradoria da República na capital paranaense, contra o peemedebista.
A investigação contra Cunha sobre contas na Suíça abastecidas por propinas na Petrobras estava sob responsabilidade do Supremo Tribunal Federal (STF). Cassado pela Câmara, o peemedebista perdeu o foro privilegiado. Os autos foram deslocados, então, para a 13ª Vara de Curitiba, base da Lava-Jato. Na segunda-feira, Moro intimou Cunha para apresentar sua defesa prévia em ação penal que atribui ao ex-deputado US$ 5 milhões nas contas secretas que ele mantinha na Suíça, que seriam oriundos de propina no contrato da Petrobras para exploração do campo de Benin, na África, em 2011. Ao pedir a prisão preventiva, a força-tarefa da Lava-Jato reiterou todos os argumentos já apresentados pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, perante o STF e acrescentosu que, mesmo após ter seu mandato cassado em setembro, o peemedebista “ainda mantém influência nos seus correligionários, tendo participado de indicações de cargos políticos do governo Temer”.
Treze procuradores da República que integram a força-tarefa subscrevem o requerimento de prisão. Os investigadores citam, como exemplo, a nomeação do deputado líder do PR Maurício Quintella, aliado de Cunha, para o Ministério dos Transportes no governo Temer. Na época em que ocupava o cargo de deputado, Quintella votou contra a cassação de Cunha no Conselho de Ética. “Não há que se falar que seu afastamento do cargo de deputado federal seja suficiente para inibir as atividades obstrutivas do representando, pois mesmo afastado da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha ainda mantém influência nos seus correligionários, tendo participado de indicações de cargos políticos do governo Temer”, diz o pedido de prisão acatado pelo juiz Sérgio Moro.
Ao mandar prender Cunha, Sérgio Moro apontou para o ‘caráter serial dos crimes’ do peemedebista e advertiu para o risco de fuga do mais novo prisioneiro da Lava-Jato. O juiz usou como fundamentos do decreto de prisão ‘risco à ordem pública e à instrução do processo’. No longo despacho de 26 páginas em que fundamenta o decreto de prisão de Cunha, Sérgio Moro destacou “a habilidade do acusado em ocultar e dissimular propinas, com contas secretas no exterior, parte não totalmente identificada nem sequestrada, permanece incólume”. O magistrado destacou que “não foi ainda possível identificar toda a dimensão das atividades delitivas de Eduardo Cunha, nem a localização do produto dos crimes em toda a sua extensão”.