Brasília – O ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) contratou o advogado Marlus Arns, que atuou no acordo de delação premiada de empresários na Operação Lava-Jato. Ao deixar a sede da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba ontem, após visitar o ex-deputado, o criminalista Marlus Arns afirmou, no entanto, que delação premiada ‘não foi tema de conversa’.
Cunha passou a noite sozinho em uma cela de 12 metros quadrados e, pela manhã, foi levado ao IML da capital paranaense para exame de corpo de delito. O político entrou no local escoltado por policiais federais fortemente armados e encapuzados, diferentemente da véspera, quando os agentes que acompanharam o ex-deputado chamaram a atenção pelo visual descontraído. O deputado cassado vestia terno cinza e camisa social, sem gravata. Ao descer da viatura, cumprimentou as dezenas de jornalistas e cinegrafistas com um “bom-dia para vocês”. O exame durou oito minutos. Ao sair, Cunha comentou em voz baixa sua prisão: “É uma decisão absurda”.
O ex-deputado contratou três escritórios para sua defesa, entre eles o de Marlus Arns.
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Ainda no universo da Lava-Jato, Marlus fez a defesa técnica de Ivan Vernon, ex-assessor parlamentar do ex-deputado Pedro Corrêa (PP-PE), de Valério Neves – ligado ao ex-senador Gim Argello (PTB-DF) –, e de João Cláudio Genu, assessor do então deputado do PP José Janene (morto em 2010), apontado como o mentor do esquema de cartel e propinas na Petrobras.
Prisão
Sérgio Moro determinou a prisão de Eduardo Cunha ao acolher os argumentos da força-tarefa da Lava-Jato de que, em liberdade, o ex-deputado representa um “risco para a instrução do processo e para a ordem pública”. O ex-deputado foi capturado preventivamente na garagem do prédio onde ele ocupava um apartamento funcional da Câmara na Asa Sul, em Brasília, por volta de 13h15 de quarta-feira.
Em busca de US$ 13 milhões
O ex-presidente da Câmara tem pelo menos US$ 13 milhões (R$ 40 milhões) em patrimônio oculto e não localizado, segundo a força-tarefa da Operação Lava-Jato. No pedido que levou à prisão do ex-deputado, os procuradores afirmam que os bens do peemedebista são 53 vezes maiores do que o declarado e que pode haver outras contas ainda não descobertas nos Estados Unidos.
Uma frota de oito carros utilizados pela família soma R$ 1,3 milhão. Entre esses carros estão um Porsche Cayenne 2006, no valor de R$ 310 mil, e outro do mesmo modelo, de 2013, no valor de R$ 375 mil.
No pedido de prisão apresentado ao juiz Sérgio Moro em 10 de outubro, os procuradores do MPF lembram que Cunha afirmou ao banco Merril Lynch, em 2008, que tinha US$ 11 milhões em bens. No entanto, ao abrir a conta em nome da offshore Triumph SP revelou patrimônio de US$ 20 milhões. Seriam R$ 64 milhões, na cotação calculada pela força-tarefa da Lava-Jato, ou seja 53 vezes maior que os R$ 1,2 milhão declarados por ele em 2007.
Até o momento, a Justiça conseguiu obter apenas 2,34 milhões francos suíços (cerca de R$ 9,4 milhões) em contas de Cunha na Suíça. No entanto, os procuradores entendem que há pelo menos US$ 13 milhões (R$ 40 milhões) não localizados. “As demais contas suíças foram fechadas pelo ex-deputado federal, sendo que permanece oculto um patrimônio de aproximadamente US$ 13 milhões”, anotam os integrantes da força-tarefa no pedido de prisão.
O defensor de Funaro nega que seu cliente, considerado “operador de propinas de Cunha”, pagou carros para o ex-deputado. “Todos esses carros foram objeto de contrato entre o Lúcio e o Eduardo”, disse Daniel Gerber. “Todos os contratos foram registrados, declarados, oficiados e devidamente cobrados. Não existe absolutamente nada de ilícito nessa situação.
Empréstimo para despistar
A força-tarefa da Operação Lava-Jato também identificou um empréstimo de R$ 250 mil da Igreja Evangélica Cristo em Casa para Cláudia Cruz, mulher de Cunha. No pedido de prisão do peemedebista, a Procuradoria da República, no Paraná, destaca um “empréstimo simulado com estratagema para lavagem de dinheiro”.
A Cristo em Casa pertence ao radialista Francisco Oliveira da Silva, ex-deputado federal e aliado de Cunha. “A partir da declaração do Imposto de Renda de Cláudia Cruz, identificou-se a declaração de um empréstimo supostamente contraído junto a Francisco Oliveira da Silva, de R$ 250 mil no ano de 2008. Contudo, realizada a quebra de sigilo bancário de Cláudia Cruz e de Francisco Oliveira da Silva, não foram identificados relacionamentos financeiros entre as partes”, observam os procuradores.
“Ao que tudo indica, Francisco Oliveira da Silva jamais emprestou dinheiro a Cláudia Cruz, sendo lógico que a simulação do contrato de mútuo serviu apenas como uma fraude para dar lastro para o ingresso de recursos espúrios provenientes dos crimes praticados por Eduardo Cunha no patrimônio da investigada”, aponta a Lava-Jato.
Em depoimento à Lava-Jato, em abril deste ano, Cláudia Cruz declarou que conhece Francisco Oliveira da Silva, presidente da Igreja Evangélica Cristo, e que “nunca teve situação de necessidade financeira”. A mulher de Cunha foi questionada sobre o empréstimo e disse, na ocasião, nada saber “sobre este fato”.
Enquanto isso...
…”fora, Cunha” até no WhatsApp
Logo após a notícia de sua prisão, o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) foi excluído do grupo de WhatsApp formado pela bancada do PMDB na Câmara. Apesar de ter o mandato cassado há mais de um mês, ele ainda era membro do grupo no aplicativo. Segundo relatos de parlamentares do partido, o deputado Hildo Rocha (PMDB-MA), administrador do grupo, excluiu Cunha às 13h35, cerca de meia hora depois da prisão e após saber que a PF havia apreendido o celular do ex-deputado. Com a exclusão, os investigadores não terão mais acesso às novas conversas da bancada, embora possam ver debates anteriores, de quando Cunha ainda era membro do grupo. Correligionários do ex-deputado também evitaram comentar a prisão no grupo da bancada no WhatsApp. De acordo com relatos de parlamentares peemedebistas, o assunto foi pouco falado nas conversas do grupo.