São Paulo, 26 - A procuradora da República Thaméa Danelon, do Ministério Público Federal, em São Paulo, e a delegada federal Erika Mialik, da força-tarefa da Operação Lava Jato, em Curitiba, vão defender o projeto das 10 Medidas contra a Corrupção (10 Measures against Corruption, em inglês) em conferência nos Estados Unidos. Participam da Foreign Bribery and Corruption Conference, nos EUA, 130 países.
Thaméa Danelon e Erika Mialik vão falar em 2 de novembro e também debater a Lava Jato, a maior operação contra a corrupção já deflagrada no Brasil. O projeto 10 Medidas é encampado pelo Ministério Público Federal e foi entregue em março deste ano no Congresso com mais de 2 milhões de assinaturas colhidas em todas as regiões do País.
Entre as medidas sugeridas estão a prisão de até oito anos para o funcionário público que tiver patrimônio incompatível com a renda; o aumento de penas para corrupção e o enquadramento como crime hediondo no caso de altos valores; a punição para acusados que tentarem atrasar o processo judicial; e a responsabilização de partidos políticos e criminalização do caixa dois em campanhas eleitorais.
"Nos EUA, o FCPA (Foreign Corrupt Practices Acts), a lei anticorrupção americana, é de 1977 e surgiu depois do escândalo do Watergate. Em vários países do mundo, nós percebemos que depois de um grande escândalo, as leis costumam ser aprimoradas", observa Thaméa Danelon.
"Eles têm interesse na campanha e também porque todas as Medidas foram baseadas nas grandes democracias. Todas as legislações que nós queremos aprimorar foram importadas dos Estados Unidos, Inglaterra, Canadá, França. Os próprios tratados internacionais da ONU, que o Brasil assinou, previam a criminalização do enriquecimento ilícito, a realização de teste de integridade", afirma Thaméa Danelon.
AS 10 MEDIDAS CONTRA A CORRUPÇÃO
1) Prevenção à corrupção, transparência e proteção à fonte de informação
Dentre as propostas sugeridas estão: testes de integridade - sem o conhecimento do agente público ou funcionário - que simulem situações para avaliar conduta moral e predisposição para cometer crimes contra a Administração Pública; o investimento de 10% a 20% dos recursos de publicidade dos órgãos públicos em ações voltadas ao estabelecimento de uma cultura de intolerância à corrupção, treinamento de funcionários públicos, realização de programa de conscientização em universidades; estímulo à denúncia de casos de corrupção, além de tornar obrigatória a prestação de contas do Judiciário e do Ministério Público sobre duração dos processos que ultrapassem o prazos razoáveis de duração
2) Criminalização do enriquecimento ilícito de agentes públicos
Estabelecimento de penas de três a oito anos para crimes de enriquecimento ilícito, passíveis de alteração no caso de delitos menos graves. Caberá, no entanto, à acusação provar a existência de renda discrepante da fortuna acumulada pelo agente público. Se houver dúvida quanto à ilegalidade da renda, o suspeito será absolvido
3) Aumento das penas e crime hediondo para corrupção de altos valores
Os procuradores propõem o aumento das penas para corrupção, que hoje são de 2 a 12 anos, para de 4 a 12 anos.
4) Aumento da eficiência e da justiça dos recursos no processo penal
Com o objetivo de aumentar a rapidez na tramitação de recursos sem prejudicar o direito de defesa, a medida propõe alterações no Código de Processo Penal (CPP) e uma emenda constitucional. As mudanças incluem a possibilidade de execução imediata da condenação quando o tribunal reconhece abuso do direito de recorrer; a revogação dos embargos infringentes e de nulidade; a extinção da figura do revisor; a vedação dos embargos de declaração; a simultaneidade do julgamento dos recursos especiais e extraordinários; novas regras para habeas corpus; e a possibilidade de execução provisória da pena após julgamento de mérito do caso por tribunal de apelação
5) Celeridade nas ações de improbidade administrativa
Dar mais agilidade à fase inicial das ações de improbidade administrativa com a adoção de uma defesa inicial única (hoje ela é duplicada), após a qual o juiz poderá extinguir a ação caso seja infundada. Além disso, sugere-se a criação de varas, câmaras e turmas especializadas para julgar ações de improbidade administrativa e ações decorrentes da lei anticorrupção. Por fim, propõe-se que o MPF firme acordos de leniência, como já ocorre no âmbito penal (acordos de colaboração), para fins de investigação.
6) Reforma no sistema de prescrição penal
Com o objetivo de corrigir distorções do sistema, as mudanças envolvem a ampliação dos prazos da prescrição da pretensão executória e a extinção da prescrição retroativa (instituto que só existe no Brasil e que estimula táticas protelatórias).
7) Ajustes nas nulidades penais
Ampliar a preclusão (perda do direito de recorrer a uma sentença por estar fora do prazo legal) de alegações de nulidade; condicionar a superação de preclusões à interrupção da prescrição a partir do momento em que a parte deveria ter alegado o problema e se omitiu; estabelecer, como dever do juiz e das partes, o aproveitamento máximo dos atos processuais e exigir a demonstração do prejuízo gerado por um defeito processual
8) Responsabilização dos partidos políticos e criminalização do caixa 2
Esta medida visa responsabilizar os partidos políticos pelas práticas corruptas, criminalizar o caixa 2 (contabilidade paralela) e criminalizar, no âmbito eleitoral, a lavagem de dinheiro proveniente de infração penal, de fontes de recursos vedadas pela legislação eleitoral ou que não tenham sido contabilizados conforme o exigido pela legislação
9) Prisão preventiva para evitar a dissipação do dinheiro desviado
Tornar possível a prisão preventiva para que se possa identificar e localizar os valores desviados, assegurar a sua devolução ou evitar que sejam utilizados para financiar a fuga ou defesa dos investigados. Essa medida também propõe mudanças para que o dinheiro sujo seja rastreado mais rapidamente, facilitando tanto as investigações como o bloqueio de bens obtidos ilicitamente.
10) Recuperação do lucro derivado do crime
Criação de medida que permita confiscar a parte do patrimônio do condenado que corresponda à diferença entre o patrimônio de origem comprovadamente lícita e o patrimônio total. Outro ponto dessa proposta visa possibilitar o confisco dos bens de origem ilícita, independentemente da responsabilização do autor dos fatos ilícitos, que pode não ser punido por não ser descoberto, por falecer ou em decorrência de prescrição..