Brasília – Mais de sete anos após o caso ser revelado, a Procuradoria da República na 1ª Região denunciou 443 ex-deputados por uso indevido da cota de passagens aéreas da Câmara e do Senado para fins particulares. O crime atribuído a eles é de peculato, cuja pena varia de dois a 12 anos de prisão em caso de condenação. O caso divulgado pelo site Congresso em Foco, em 2009, ficou conhecido como a Farra das Passagens.
Entre os ex-parlamentares denunciados há representantes dos principais partidos políticos do país e figuras de expressão nacional, como o atual secretário do Programa de Parcerias de Investimentos do governo Michel Temer, Moreira Franco; o prefeito reeleito de Salvador, ACM Neto (DEM); e o ex-ministro Ciro Gomes, pré-candidato do PDT à Presidência da República. Os ex-deputados Antonio Palocci (PT) e Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presos na Lava-Jato, também são alvos da Procuradoria. ACM Neto disse, por meio de sua assessoria, que não usou a verba indevidamente. Moreira Franco e Ciro não retornaram à reportagem do site.
Na lista dos denunciados não há qualquer parlamentar no exercício do mandato ou ministro de Estado. Também não consta o nome do presidente Michel Temer (PMDB), que cedeu sua cota de passagens à época para viagem de turismo de familiares à Bahia.. Quando o caso veio à tona, Temer presidia a Câmara dos Deputados.
É que congressistas, ministros e o presidente da República, entre outras autoridades, só podem ser investigados e julgados no Supremo Tribunal Federal (STF). Nesse caso, a denúncia só pode ser apresentada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Segundo o site, o governo discute, internamente, conceder cargo ou status de ministro a Wellington Moreira Franco, um dos principais assessores de Temer, desde que ele teve seu nome citado por investigados da Operação Lava-Jato como um dos beneficiários do esquema de corrupção na Petrobras. Moreira sempre negou qualquer envolvimento com o caso.
O prefeito reeleito de Belém, Zenaldo Coutinho (PSDB), o ex-governador do Distrito Federal Agnelo Queiroz (PT-DF), o ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) e os ex-deputados Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP), condenados no mensalão, também estão entre os denunciados.
As acusações contra os ex-parlamentares estão distribuídas em 52 denúncias assinadas pelo procurador Elton Ghersel. Caberá ao relator, o desembargador Olindo Menezes, preparar um voto recebendo ou rejeitando o pedido do MP. O voto dele será levado para julgamento na 2ª Seção do TRF 1. Caso a denúncia seja aceita, os ex-deputados viram réus e passam a responder a ações penais. Nessa etapa, eles serão chamados a dar explicações e se defender das acusações. Só, então os políticos poderão ser julgados.
Entenda o caso
l A Farra das Passagens foi mostrada em série de reportagens publicada em 2009 pelo Congresso em Foco, que revelou que centenas de deputados e senadores viajavam pelo Brasil e pelo exterior com dinheiro público, muitas vezes para passear, ou cediam suas cotas de bilhetes aéreos para terceiros, como parentes, amigos e cabos eleitorais.
l Após a repercussão negativa do episódio, a Câmara reviu as regras para tornar mais explícita a determinação de que a verba só poderia ser usada para exercício da atividade parlamentar. Como revelou o Congresso em Foco, só na Câmara, mais de 250 deputados viajaram para fora do país com recursos públicos.
l Com a ajuda da Polícia Federal, a Procuradoria da República examinou 160 mil bilhetes aéreos pagos pela Câmara aos deputados entre 2007 e 2009 às companhias Gol e TAM. Os gastos com esses bilhetes chegaram a R$ 70 milhões em valores da época. Só com viagens internacionais, foram 1.588 trechos, ao custo de R$ 3,1 milhões. Outros R$ 64 milhões bancaram 112 mil voos nacionais.
l A principal dificuldade dos investigadores, além do número elevado de passagens a examinar, foi saber quais trajetos estavam relacionadas ao exercício da atividade parlamentar e quais tinham propósitos particulares.