Brasília e Curitiba - Em 6 de novembro de 2014, o diretor-regional da Odebrecht Realizações Imobiliárias, Rodrigo Costa Melo, responsável pelo contrato da obra do Porto Maravilha, no Rio, enviou e-mail a seu superior, Antonio Pessoa de Souza Couto, diretor-superintendente da unidade do Grupo Odebrecht, em que pedia R$ 1 milhão para “Turquesa”. O dinheiro seria propina na obra de revitalização da região portuária do Rio, uma das maiores Parcerias Público-Privadas executadas pela Concessionária Porto Novo, formada por Odebrecht, OAS e Carioca Engenharia.
A troca de mensagens dos executivos da Odebrecht, a maior empreiteira da América Latina, em quatro níveis hierárquicos, as planilhas de registro de pedido e registro de pagamentos fazem parte do rol de provas descobertas pela Operação Lava-Jato de que a distribuição de propina foi institucionalizada no grupo e envolvia desde diretores responsáveis pelas obras até seu presidente, Marcelo Odebrecht – afastado do cargo desde que foi preso, em junho de 2015.
Pagamentos Para investigadores, foi a institucionalização operacional dos pagamentos que arrastou mais de 50 executivos do grupo a buscar a delação premiada e fez com que o acordo com a força-tarefa do Ministério Público Federal fosse a única saída para tirar Marcelo Odebrecht da cadeia e afastar o risco de falência do Grupo Odebrecht.
Os procuradores da Lava-Jato consideram, no entanto, que as provas encontradas contra a Odebrecht colocam a empreiteira em desvantagem nas negociações de uma delação premiada. “Na mesa de negociação de uma delação, é como numa negociação comercial ou entre um casal: quem mais quer, menos pode”, afirmou um dos investigadores, em reservado. O caso da propina nas obras do Porto Maravilha – já conhecido desde março, quando foi presa a ex-secretária do Setor de Operações Estruturadas Maria Lúcia Tavares – é emblemático para mostrar, segundo os investigadores da força-tarefa, que o grupo continuava a delinquir mesmo depois de iniciada a Lava-Jato, em março de 2014.
As descobertas da operação e uma provável delação de executivos do grupo também podem levar a Polícia Federal e o Ministério Público Federal a irregularidades além da Petrobras.
Além de guardar registros de propina para agentes públicos e políticos nos contratos de refinarias e plataformas, os arquivos do Setor de Operações Estruturadas têm dados sobre pagamentos em obras de estádios da Copa de 2014, como o Itaquerão, em São Paulo, em negócios de transporte (concessões de aeroportos e rodovias), no setor de saneamento e outros.
contratos As ordens de pagamentos têm identificação de executivos responsáveis pelos pedidos, os contratos relacionados, unidades envolvidas nas despesas, nomes dos superiores que autorizavam pagamentos, beneficiários, contas usadas e valores envolvidos. Tudo cifrado, com uso de codinomes, siglas e senhas, com o objetivo de ocultar a sistemática financeira montada no grupo.
Além de políticos do PT, PMDB e PP – legendas já alvo da investigação –, partidos como PSDB também podem ser implicados pelas delações. Para a força-tarefa, a descoberta do Setor de Operações Estruturadas é a prova mais contundente da corrupção “profissionalizada” das empreiteiras do cartel que atuou na Petrobras entre 2004 e 2014.
Dez anos de cadeia
Brasília - Cinco meses depois da assinatura de um termo de confidencialidade com o Ministério Público, primeiro passo para iniciar um acordo de colaboração premiada, Marcelo Odebrecht permanece atrás das grades. Mesmo confessando o que sabe, ele ainda terá de cumprir uma pena de 10 anos de prisão. A década será subdividida em quatro períodos de dois anos e meio O primeiro será cumprido no regime fechado –descontado o um ano e meio cumprido em Curitiba –, depois ele passará para o semiaberto, seguido da prisão domiciliar e, enfim, do regime aberto.
Quando a Lava-Jato chegou perto das empreiteiras, ao identificar o cartel de empresas que tinha o controle e dividia as obras da Petrobras, em novembro de 2014, investigadores já olhavam para Marcelo Odebrecht como líder do grupo. No “clube vip”, era a empreiteira que tinha a maior fatia dos contratos com a petrolífera. As primeiras delações confirmaram a desconfiança da força-tarefa da Lava-Jato ao apontarem a empresa como protagonista do esquema de corrupção, desvios e cartel na Petrobras.
Durante os primeiros anos da Lava-Jato, a empreiteira negou ilícitos e participação no cartel. O ex-presidente da Odebrecht Ambiental Fernando Santos Reis chegou a dar entrevista na qual disse que o grupo não fazia “nada errado”. “Está todo mundo esperando o momento em que vão nos pegar, mas nós não fizemos nada errado”, afirmou o executivo em abril de 2015. Hoje, Reis é um dos que colaboram com o Ministério Público.
Dois meses após a declaração, em 19 de junho de 2015, Marcelo Odebrecht foi preso durante a 14ª fase da Lava-Jato. Batizada de “Erga Omnes”, que em latim significa “Vale para todos”, a operação capturou não apenas o então presidente da empreiteira, mas executivos ligados à cúpula da empresa.