Mais da metade das prefeituras em Minas Gerais ainda não sabe como vão pagar o salário de dezembro e o 13º salário dos servidores públicos. Levantamento da Associação Mineira de Municípios (AMM) aponta que em 51,5% das 853 cidades a crise financeira ameaça os direitos trabalhistas e põe também em xeque o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Com a corda no pescoço, prefeitos reduzem serviços como manutenção de estradas, corte de grama e decoração de Natal para tentar enxugar os gastos.
A primeira parcela do 13º deve ser paga até o próximo dia 30. Já o prazo para quitar a segunda parcela do benefício vence em 20 de dezembro. De acordo com a pesquisa, que compreende amostra de 460 prefeituras, 4,64% pretendem cumprir com as obrigações trabalhistas ainda em novembro. Outros 43,8% informaram que o farão em dezembro, enquanto o restante (51,5%) não tem previsão orçamentária para honrar com os compromissos.
“Muitos servidores públicos poderão concluir o ano tendo recebido apenas uma parte do recurso ou nada. A culpa não é dos prefeitos, pois eles não gastaram a mais. O problema é que a receita foi caindo e as perdas se acumulando”, afirma o presidente da AMM, o prefeito de Barbacena, Antônio Andrada (PSB). “Foram dois anos de turbulências econômicas e políticas. Com o processo de impeachment, houve falta de interlocução com as prefeituras. Em ano eleitoral, a legislação é muito rígida e proíbe as prefeituras de tomar uma série de providências”, justifica Andrada.
O Departamento de Economia da AMM mostra que, em anos anteriores, 72,6% dos municípios mineiros pagaram o 13º salário em uma única parcela, 16% de duas vezes, e 11,32% de formas diferentes. Até agora, quase a totalidade (97,4%) das prefeituras que optaram pelo pagamento em parcela única no ano passado ainda não quitaram o 13º.
Segundo o presidente da AMM, em mais de 600 prefeituras mineiras, 90% da receita vêm exclusivamente do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), composto de 22,5% da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). “A indústria foi o setor que mais sentiu a crise e isso se reflete no FPM”, diz. Municípios médios também sofreram com a queda na arrecadação de outros impostos importantes, como o ICMS e o ISS. Além disso, prefeituras registraram aumento da inadimplência ao IPTU.
SECA
Acostumados com as mazelas da seca, a crise financeira enxugou os cofres das prefeituras no Norte de Minas. A previsão da Associação dos Municípios da Área Mineira da Sudene (Amans) é que a maioria dos 93 prefeitos associados termine o mandato sem fechar as contas. “A maior parte vai terminar devendo, infelizmente. É uma situação preocupante. A receita caiu muito e ainda houve a crise política, além de cinco anos seguidos de seca”, afirma o presidente da Amams, Luiz Rocha Neto, prefeito de São Francisco.
Rocha Neto mesmo não sabe como fará para fazer a conta de São Francisco fechar no fim do ano. “Não sabemos ainda se vamos conseguir pagar o 13º. Não estou fazendo reparo nas estradas porque teria que colocar gasolina nos carros”, conta. No município de pouco mais de 7 mil habitantes, quase 90% da receita vêm do FPM, que acompanhou a retração da economia brasileira. “O município tem muitas atribuições, a receita não é compatível e não estamos recebendo recursos federais. Para poder cumprir a LRF, tenho que parar a limpeza da cidade, o transporte público”, diz o prefeito, que ficou cinco meses sem conseguir pagar os médicos do município.
“Grande parte dos municípios não tem a certeza se vão honrar com os compromissos do fim do ano. Ele vão ter que optar pela folha ou pelo pagamento dos fornecedores”, reforça o presidente da Granbel, entidade que representa os 34 municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Carlos Murta, prefeito de Vespasiano. Segundo ele, a situação só não foi pior por causa do repasse, este mês, de recurso da Lei da Repatriação, que institui o Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT) e incentiva o envio de valores obtidos de forma lícita de volta ao país.
Calamidade
Na Associação dos Municípios da Microrregião do Vale do Rio Grande (AMVale), que congrega 14 municípios, entre eles Uberaba, houve até a ameaça da decretação de estado de calamidade financeira. As prefeituras botaram o pé no freio, mas ainda não é possível saber se conseguirão cumprir compromissos. “Acho que elas vão ter problema para pagar os fornecedores”, comenta o presidente da entidade, o prefeito de Campo Florido, Ademir Ferreira de Mello. Em Campo Florido, para enxugar o orçamento, foi preciso cortar a decoração de Natal, festas, corte de grama e manutenção de jardins.
Tamanho do problema
51,56%
das prefeituras estão sem previsão orçamentária para quitar o 13º salário
4,64%
dos municípios pretendem pagar o 13º em novembro
43,8%
pagarão a folha o 13º somente em dezembro
Fonte: AMM