Brasília - O pedido de demissão do ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, foi a saída encontrada pelo Palácio do Planalto para tentar salvar o governo da crise política. A operação para entregar a cabeça de Geddel foi articulada ainda na quinta-feira, depois da divulgação do depoimento do ex-ministro da Cultura Marcelo Calero à Polícia Federal, no qual ele diz ter sido “enquadrado” pelo presidente Michel Temer para atender aos interesses do chefe de Geddel. A pressão seria para o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) liberar a construção de um prédio nos arredores de uma área tombada, em Salvador. Geddel é o sexto ministro a deixar o governo. Na avaliação de interlocutores do presidente, porém, esta foi a demissão que ele mais sentiu, na esteira de uma crise que atinge o seu próprio gabinete. Temer resistiu o quanto pôde, mas a solução foi a saída do ministro para conter a turbulência.
Na carta de demissão divulgada pelo Palácio do Planalto, Geddel reconhece que “avolumaram-se as críticas” contra ele, trazendo sofrimento a seus familiares. “Quem me conhece sabe ser esse o limite da dor que suporto. É hora de sair”, escreveu ele a Temer, a quem chamou de “fraterno amigo”. “Diante da dimensão das interpretações dadas, peço desculpas aos que estão sendo por elas alcançados, mas o Brasil é maior do que tudo isso.” Geddel afirma que fez “profunda reflexão” e decidiu pedir exoneração “do honroso cargo”. Ele disse ainda na carta que retornará à Bahia, mas seguirá como “ardoroso torcedor” do “nosso” governo e classifica Temer como um presidente “sério, ético e afável”.
Articulador político do Planalto com o Congresso, ele sai do governo às vésperas da votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Teto dos gastos públicos, marcada para terça-feira, no plenário do Senado. Temer ainda não escolheu o substituto de Geddel e disse a aliados que ele próprio fará a coordenação política para a votação da PEC, considerada fundamental pelo governo para o ajuste fiscal e a recuperação da economia.
Em reunião de emergência convocada por Temer com auxiliares, na noite de quinta-feira, a situação de Geddel, que já havia viajado para a Bahia, foi considerada insustentável. Houve intensa troca de telefonemas com o ministro. Calero gravou conversas com Temer, com Geddel e com o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha. No depoimento à PF, ele disse que o presidente tentou fazer com que ele “interferisse indevidamente” para que a decisão do Iphan, barrando a construção do prédio em Salvador, fosse substituída por um parecer da Advocacia Geral da União (AGU). Geddel comprou na planta um apartamento no edifício La Vue, que teve a obra embargada.
PRESSÃO As afirmações de Calero jogaram mais combustível na crise por atingir diretamente o presidente. Antes desse depoimento, prestado no último dia 19, mas que só foi divulgado na quinta-feira, o ex-ministro havia citado apenas a pressão exercida por Geddel para a liberação do empreendimento. À PF, porém, mencionou interferência de Temer, que estaria demonstrando “insistência”, de Padilha e de outros auxiliares do núcleo do governo, para resolver o caso. Calero disse ter se sentido “decepcionado” por não ter mais a quem recorrer e pediu demissão, desobedecendo à ordem de enviar o polêmico processo para a AGU.
Marcelo Calero divulgou nota ontem negando que tenha solicitado audiência com Temer com a intenção de gravar uma conversa no gabinete presidencial. O texto foi publicado no perfil dele no Facebook. Ele afirmou que cumpriu sua obrigação “como cidadão brasileiro que não compactua com o ilícito e que age respeitando e valorizando as instituições.” “A respeito de informações de que eu teria solicitado audiência com o presidente Michel Temer no intuito de gravar conversa no gabinete presidencial, esclareço que isso não ocorreu”, destacou Calero em nota.