Jornal Estado de Minas

MPs custaram R$ 17 milhões

A delação premiada do ex-diretor de relações institucionais da Odebrecht Cláudio Melo Filho revela, em 82 páginas, um suposto esquema de distribuição de propinas, financiamento de campanha eleitoral legal e ilegal e compra de medidas provisórias e projetos de interesse da empreiteira. O depoimento do executivo ao Ministério Público Federal (MPF) aponta pagamentos a políticos que somam pouco mais de R$ 75 milhões, sendo cerca de R$ 17 milhões só para a aprovação de propostas favoráveis à Odebrecht. As revelações de Melo Filho abalaram a cúpula do PMDB e o Congresso, ao citar como supostos beneficiários desse esquema cerca de 50 políticos, entre eles o presidente da República, Michel Temer, que teria pedido R$ 10 milhões à Odebrecht em 2014 – pagos em dinheiro vivo ao hoje ex-ministro da Casa Civil Eliseu Padilha–, e os presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Renan Calheiros (PMDB-AL).

O líder do governo no Congresso, senador Romero Jucá (PMDB-RR), é apontado como o principal interlocutor da empresa no Senado e, no documento da delação, Melo Filho dedica um capítulo à parte a ele. “Ao longo dos anos que mantive interlocução com o senador Romero Jucá, participei de pagamentos a ele que hoje superam R$ 22 milhões”, explica Cláudio Filho. Segundo ele, Jucá, cujo codinome na tabela de propina era “Caju”, representava Renan Calheiros e Eunício Oliveira. “A minha experiência deixou claro que o senador Romero Jucá centralizava o recebimento de pagamentos e distribuía os valores internamente no grupo do PMDB do Senado Federal, especificamente, no que posso atestar com total segurança, no que diz respeito aos senadores Renan Calheiros e Eunício Oliveira”, afirma.

A escolha de Jucá para atuar em nome da empresa em assuntos legislativos rendeu a aprovação de pelo menos 14 MPs e projetos de lei, ao custo de R$ 17 milhões. Uma delas é a MP-252, a MP do Bem, com incentivos fiscais para aumentar exportações. Apenas a MP-613/2013, que trata de incentivos fiscais à produção de etanol e à indústria química, teria custado R$ 7 milhões para o PMDB no Senado.

Segundo o executivo, Rodrigo Maia também participou da negociação nessa MP, quando houve pagamento de R$ 100 mil a ele.

PROXIMIDADE O relacionamento entre Melo Filho e Renan Calheiros, apelidado de “Justiça”, era intermediado por Jucá. Em 2010, houve uma primeira contribuição financeira para Calheiros efetuada, segundo uma planilha entregue pela empresa, em duas parcelas de R$ 250 mil em agosto e setembro daquele ano. Em outra ocasião, no ano de 2014, conta o executivo, em uma reunião entre ele e Calheiros, em um determinado momento o senador disse que seu filho seria candidato ao governo de Alagoas e “pediu que verificasse se a empresa poderia contribuir”.

“O núcleo dominante do PMDB no Senado Federal tem a sua cúpula formada pelos Senadores Romero Jucá, Renan Calheiros e Eunício Oliveira. Esse grupo é bastante coeso em suas atuações e possui enorme poder de influência sobre outros parlamentares, tanto do partido como de outras legendas. Esse fato dá a esse núcleo grande poder de barganha, pois possui a capacidade de praticamente ditar os rumos que algumas matérias serão conduzidas dentro do Senado Federal”, afirmou Melo Filho.

Após relatar o receio em não efetuar os pagamentos, o executivo elenca os repasses da Braskem de R$ 320 mil e de R$ 1,2 milhão da Odebrecht para a campanha de Renan Filho (PMDB). Segundo eles os pagamentos estariam atrelados à atuação do senador na aprovação das medidas provisórias.

O deputado federal cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) também aparece como beneficiário do esquema e teria recebido R$ 7 milhões com o apelido de “Caranguejo”.

BASE CARIOCA Em outra delação, o ex-diretor de infraestrutura da Odebrecht Leandro Andrade Azevedo envolve diretamente políticos do Rio, entre eles o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB), o prefeito Eduardo Paes (PMDB), o senador Lindbergh Farias (PT) e os ex-governadores Anthony Garotinho (PR) e Rosinha Garotinho (PR). Azevedo diz ter abastecido o caixa 2 da campanha de Paes em 2012 com R$ 30 milhões. Pezão teria recebido R$ 23,6 milhões em espécie e 800 mil euros no exterior durante a campanha de 2014. Garotinho e Rosinha teriam recebido R$ 9,5 milhões em três eleições. O senador petista Lindbergh Farias teria se beneficiado com R$ 3,2 milhões na forma de caixa 2 em suas campanhas. A entrega do dinheiro teria sido feita em seu escritório, no Rio. Os citados negaram envolvimento.

(Com agências)

 

CONTATOS COM O PT
O ex-ministro dos governos Lula e Dilma Jaques Wagner (PT) aparece na lista dos contatos mais frequentes de Cláudio Melo Filho. O ex-diretor disse em delação premiada ter sido o principal defensor do petista na empreiteira. A relação teria começado em 2006 e ido até 2010, tendo a empresa financiado a candidatura vitoriosa de Wagner ao governo da Bahia. “Acredito que tenham ocorrido pagamentos de até R$ 3 milhões de forma oficial e via caixa 2”, disse. Ao todo, ele relata pagamentos de R$ 7,5 milhões, além de dois relógios dados de presente ao ex-ministro de US$ 24 mil. Wagner era identificado com o codinome “Polo”. De acordo com Melo, o deputado Marco Maia (PT-RS), conhecido como “Gremista”, pediu dinheiro para a campanha em 2014. Os pagamentos teriam somado R$ 1,35 milhão. Na delação, Melo afirma que o também ex-ministro de Lula e Dilma Antonio Palocci tratava sobre questões do Planalto diretamente com Marcelo Odebrecht e outro executivo.

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