A pedido do Ministério Público Federal em Santos (SP), a Justiça Federal condenou quatro acusados por esquema milionário de sonegação de tributos na importação de mercadorias entre 2010 e 2012, alvo da Operação Navio Fantasma. Mais de 30 pessoas integravam o grupo criminoso que atuava no Porto de Santos e em aeroportos de São Paulo, Rio e Curitiba. O prejuízo aos cofres públicos é estimado em R$ 25,5 milhões, em valores atualizados em 2015.
A autora da denúncia que levou à condenação dos quatro réus é a procuradora da República Juliana Mendes Daun Fonseca. As irregularidades eram baseadas no registro do trânsito aduaneiro das mercadorias no Brasil.
Segundo o procedimento regular de importação, os produtos estrangeiros que chegam ao País podem ser liberados pela unidade da Receita no local de entrada ou transportados, a pedido do importador, até outro terminal onde haja o controle aduaneiro para o despacho da carga e a eventual cobrança dos tributos.
O esquema se valia dessa possibilidade de remoção para desviar os carregamentos e inseri-los no mercado brasileiro sem a passagem por postos da alfândega.
A soma das penas aplicadas aos quatro condenados ultrapassa 30 anos de prisão. Os réus poderão recorrer em liberdade. "Dois deles são servidores da Receita Federal: o auditor Carlos Emiliano Alexandre Patzsch e o analista tributário Laertes Cassiano Lazarotto", destacou a Procuradoria. Patzsch e Lazarotto foram condenados por corrupção passiva e facilitação de descaminho, crimes pelos quais deverão cumprir 10 anos e 25 dias de reclusão cada.
A sentença ainda responsabiliza Patzsch por formação de quadrilha, o que amplia em um ano sua pena.
A 6ª Vara Federal de Santos determinou também a perda dos cargos públicos e a entrega à União de quantias em real e dólar que os servidores receberam como propina, apreendidas quando a operação foi deflagrada.
"Os outros dois condenados são Paulo Barbosa Junior e Vagno Fonseca de Moura, que deverão cumprir penas de quatro anos e cinco meses cada por corrupção ativa", informou a Procuradoria.
Barbosa Junior foi identificado como "mentor e coordenador do grupo criminoso, sendo responsável pelo contato com os clientes e por providenciar a execução de todas as etapas do esquema, desde a contratação das empresas que prestavam os serviços de importação e transporte até a destinação de propinas aos agentes públicos".
Moura, segundo o Ministério Público Federal, "estava incumbido de realizar os pagamentos ilícitos aos servidores da Receita em Curitiba e levar informações sobre as cargas a serem desembarcadas no Afonso Pena".
Trânsito
O núcleo que atuava no Paraná realizou a liberação ilegal de ao menos 32 lotes de mercadorias importadas que incluíam itens diversos, como acessórios, máquinas e eletrônicos.
No início, os réus adotaram a modalidade "trânsito aduaneiro de passagem", pela qual os produtos apenas trafegam entre postos brasileiros para seguir até o país de destino. "Depois da descarga em Curitiba, os servidores da Receita, sem qualquer fiscalização, liberavam o trânsito dos produtos para o Porto de Santos, de onde prosseguiriam viagem. No entanto, os caminhões desviavam o trajeto e levavam os carregamentos aos reais compradores no Brasil, sem o pagamento dos impostos. No terminal portuário, outros funcionários do Fisco registravam falsamente a chegada dos lotes e finalizavam a operação", sustenta a Procuradoria.
Após o início das investigações, em 2011, o grupo mudou a forma de burlar as importações e passou a adotar a modalidade "trânsito aduaneiro de entrada comum", que prevê o transporte entre o ponto de descarga (Curitiba) e o local onde deve ocorrer o efetivo desembaraço aduaneiro (Santos).
"O trânsito era liberado sem fiscalização, os produtos seguiam o mesmo percurso e eram igualmente desviados. A diferença estava no tratamento recebido no porto. Lá, auditores da Receita concluíam a fraude preenchendo formulários que indicavam o encaminhamento da carga para áreas do porto onde não havia fiscalização ou incidência de tributos."
Bloqueio de bens
Todos os envolvidos no esquema de sonegação, inclusive os integrantes do núcleo que agia em Curitiba, já respondem a uma ação de improbidade administrativa, também proposta pelo Ministério Público Federal.
Em agosto de 2015, a Justiça Federal acolheu o pedido liminar da Procuradoria e determinou a indisponibilidade de bens dos réus no total de R$ 76,4 milhões. A quantia corresponde ao volume de recursos necessários para que eles cumpram eventual sentença condenatória que os obrigue a ressarcir o valor sonegado e pagar multa correspondente a duas vezes o prejuízo causado aos cofres públicos.
Os acusados da Navio Fantasma respondem ainda a outras ações penais, relacionadas aos grupos que atuavam no Rio e em São Paulo.
A reportagem não localizou os réus da operação. O espaço está aberto para suas manifestações.