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Estado de Minas

Prefeitos rejeitam heranças deixadas por antecessores em MG

Unidades administrativas depredadas, veículos sucateados e até arquivos roubados são problemas que chefes do Executivo municipal alegam ter encontrado em cidades mineiras


postado em 16/01/2017 00:12 / atualizado em 17/01/2017 07:53

(foto: Reprodução/Internet)
(foto: Reprodução/Internet)
Virar prefeito em tempo de crise econômica não é fácil. Se falta dinheiro, sobram responsabilidades e respostas a dar para o eleitor que, muitas vezes, está quase literalmente na porta de casa cobrando atendimento de suas demandas. Alguns dos novos prefeitos mineiros alegam ter chegado a este cenário com um agravante: a casa desarrumada pelos antecessores. Dívidas, arquivos roubados, equipamentos sucateados e imóveis deteriorados são algumas das heranças que os eleitos dizem ter recebido de seus desafetos políticos depois de derrotá-los nas urnas.

Em Recreio, na Zona da Mata, o prefeito José Maria de Barros (PSB) registrou no Decreto 001, de 3 de janeiro de 2017, a “situação anormal”, provocada “por motivo de emergência governamental da gestão anterior”. O quadro é caracterizado como de calamidade administrativa, financeira e de infraestrutura. Segundo o texto, a comissão de transição se recusou a passar informações e o sistema de arrecadação da prefeitura está inoperante. As senhas de todos os programas, convênios e sistemas do município “não foram repassadas à atual administração” e “inúmeros arquivos foram deletados”.


“O mais grave foram os arquivos deletados. Não temos a contabilidade e as informações de recursos humanos. Toda a demanda da saúde cadastrada o cidadão terá de refazer”, diz o prefeito José Maria. Segundo ele, a parte patrimonial está sendo conferida para ver se algum item foi levado, mas já foram constatados problemas como escolas e postos de saúde em situação precária de limpeza, locais com infiltração e veículos da frota com desgastes. “As ferramentas para fazer a máquina funcionar estavam comprometidas, estamos tentando recuperar aqui e ali. Alguns arquivos conseguimos com o prestador de serviço que tinha backup”, conta.

Em razão dos problemas, segundo o prefeito, a folha de pagamento de R$ 570 mil ainda não foi paga. José Maria, que administra uma cidade com orçamento de cerca de R$ 1,3 milhão por mês, diz que não tem como fazer planejamento por enquanto.


Ainda na Zona da Mata, quem diz também tentar equacionar as coisas é o prefeito de Cataguases, Willian Lobo de Almeida (PSDB). “Estou assumindo com R$ 18 milhões de dívida. Encontramos a policlínica desativada, estradas rurais danificadas e atraso de pagamento do INSS que impossibilita receber recursos de emendas parlamentares”, disse. O tucano disse que muitos veículos precisam de manutenção e há prédios, como o da Secretaria de Cultura, com o telhado com infiltração. Ele disse que está juntando dinheiro para pagar a folha de funcionários pois, segundo alega, não encontrou recurso em caixa para quitar a dívida.

ENGESSADO

Segundo ele, 11 termos de ajustamento de conduta assinados pela administração anterior o obrigam a fazer licitações para serviços como mototáxi, espaço público para venda de água de coco e o recolhimento de animais de rua com espaços para abrigá-los. “Tenho que dar conta de 11 TACs e não tenho recurso para tudo isso”, reclama.

O orçamento da cidade é de cerca de R$ 130 milhões ao ano, segundo o prefeito Willian Almeida, que aposta em métodos de gestão para tentar melhorar as finanças de Cataguases. “As ações imediatas são cortar hora extra e cargos comissionados, vamos implementar um sistema informatizado de controle das frotas e reduzir as contas de água, luz e telefone”, explica.


Em Itaverava, na Região Central de Minas, quem passa pela prefeitura ou pelo posto de saúde vê uma faixa com os seguintes dizeres: “Herança da administração anterior: dívida de R$ 5.303.839,00 com o INSS”. Quem colocou o aviso na fachada do prédio foi o prefeito José Flaviano (PR), que assumiu o cargo em 1º de janeiro. “Coloquei para a a população ficar sabendo da dívida que encontramos. Além disso, assumimos com os carros da saúde e da educação quebrados, com os sistemas todos bloqueados. Tem muita coisa faltando, incumbi cada secretário de conferir”, conta.


Na sede da prefeitura, segundo José Flaviano, estava tudo bagunçado. “Nem gabinete direito o antigo prefeito tinha. As contas estão bloqueadas e não consegui tirar nem extrato de banco. O antigo prefeito não deixou dinheiro para pagar a folha, são R$ 159 mil”, alega. O novo chefe administrativo acredita que vá levar pelo menos uns três meses para colocar a casa em dia e ver o que é possível fazer na cidade de 6,5 mil habitantes. “Isso é descuido com o patrimônio público e acredito que tenha motivo político também”, comenta Flaviano.


Montes Claros e Miraí também sofrem com transição


Nem cidades grandes como Montes Claros, no Norte de Minas, ficaram livres de problemas. O prefeito Humberto Souto (PPS) declarou, não só na lei, o estado de calamidade. “Não estou nem dormindo à noite. Tem funcionário fazendo protesto na prefeitura por causa de salário. Recebi a cidade nessa balburdia toda”, afirmou.

Segundo Souto, o antecessor não pagou os funcionários em dezembro e a cidade está sendo multada porque não tem portal de transparência. “A informática não funciona, os carros e máquinas estão todos sucateados, tem dívidas com empreiteiras de asfalto que estão rondando a prefeitura.” Segundo Humberto Souto, só da folha de dezembro são devidos R$ 30 milhões.

“Roubaram arquivos da saúde e do patrimônio no final da administração, não tem um cadastro dos servidores. O programa de computação para substituir lâmpadas da cidade sumiu. Estamos quebrando senhas para ver se conseguimos recuperar ou teremos de fazer outro”, relata. O prefeito alega que o início de sua administração ficará prejudicado pelo quadro de “ingovernabilidade” encontrado. “Preciso de pelo menos um ano para regularizar a prefeitura”, afirma.

Em Miraí, na Zona da Mata, o prefeito Luiz Fortuce (PMDB) está usando o próprio carro para trabalhar. Diz ter encontrado o do gabinete com a bateria descarregada e com as portas arranhadas. “Está sendo muito difícil. O que sai sempre dificulta as coisas mesmo”, afirmou.

O levantamento dos problemas ficou por conta dos secretários, que constataram problemas como veículos da saúde com pneus arreados ou carecas, máquinas sem revisão e gasolina, pá carregadeira sem lubrificação e um déficit previdenciário da ordem de R$ 28 milhões.

OUTRO LADO

Prefeitos que deixaram as administrações negam que tenham deixado as prefeituras em condições ruins para os sucessores.

O ex-prefeito de Montes Claros José Vicente Medeiros (PMDB) nega o caos denunciado pelo sucessor e diz que deixou a administração em condições de funcionar. “Você acha que uma prefeitura que pagou o 13º dos funcionários está um caos? Respeito muito o Humberto e seu direito de reclamar, mas não acredito que tenha prefeitura no Norte e Minas que esteja em estado tão normal como Montes Claros.” Segundo José Vicente, a dívida é pequena e ele não teria como pagar o salário porque os recursos não haviam chegado. O antecessor disse ainda que abriu as portas da prefeitura para a transição e que o novo prefeito terá recursos da saúde, da educação e da repatrição repassados pelo governo federal para acertar as contas. “No começo do ano tem muita arrecadação, fico aguardando que ele (Souto) faça uma boa administração.”

 O ex-prefeito de Miraí, José Ronaldo Milani (PR) diz que tudo (o que o novo prefeito diz) é mentira e que foi um dos poucos da região que deixou a frota de veículos em bom estado. “Deixei mais de R$ 1,5 milhão em caixa. Herdei uma dívida de R$ 17 milhões quando entrei e paguei R$ 2,5 milhões. Então, ficaram R$ 14,5 milhões mas isso é do prefeito antigo”, alega. Segundo Milani, os adversários devem estar falando isso por não ter nada para sujar sua imagem.

O ex-prefeito de Cataguases, José César Samor (PCdoB) disse que não tem nada a declarar sobre as queixas do sucessor, “Só digo que o tempo é o senhor da razão”. Os ex-prefeitos de Itaverava e Recreio foram procurados pelo Estado de Minas, mas não foram localizados nos números de telefones fornecidos por seus partidos.

Posse com ajuda do chaveiro


Pelo Brasil, situações esdrúxulas vividas pelos novos prefeitos se multiplicam. São os casos de Monte Santo, no Norte da Bahia, e Milagres, a 230 quilômetros de Salvador. Na primeira, o prefeito Edivan Fernandes de Almeida (PSC) precisou chamar o chaveiro para entrar no próprio gabinete na prefeitura. Já em Milagres, o antecessor de César Machado (PP) foi além. Colocou tapumes e cadeados para cercar a sede da prefeitura. A ação foi promovida dias antes da posse. Segundo moradores, o ex-prefeito Raimundo Silva Galego é dono do imóvel que é sede da prefeitura. Em Inajá, no sertão pernambucano, o prefeito Adilson Timóteo (PR) encontrou o prédio da prefeitura com poucos móveis e o seu gabinete sem cadeiras.



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