Ao menos 16 contratos assinados entre 2007 e 2015 pela Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) com empresas que contribuíram para campanhas políticas estão sob suspeita. Os negócios somam R$ 468 milhões e incluem três contratações emergenciais de dragagem do canal do porto feitas sem licitação. O vice-governador nega ter feito indicações para a estatal e diz que as doações recebidas estão dentro da lei.
As investigações tramitam na Promotoria do Patrimônio Público de Santos em um inquérito civil que já soma dez volumes. O MPE também abriu uma investigação criminal, mas o caso foi arquivado. França também pediu o arquivamento do inquérito civil ao MPE, mas o Conselho Superior do Ministério Público - formado por 11 procuradores - negou o pedido e considerou que há indícios suficientes para prosseguir com as investigações.
O jornal teve acesso aos autos do processo civil. As apurações começaram em 2014, quando o advogado Raphael Cardoso dos Reis, ex-funcionário da Codesp, fez as denúncias no Ministério Público Federal (MPF), que as encaminhou para o MPE porque a apuração é de competência da Justiça Estadual.
Reis afirmou em depoimento ao MPF, na condição de anonimato por temer represálias, que o suposto esquema era comandado por França, que na época já era deputado. Segundo o denunciante, o vice-governador fazia indicações para cargos comissionados na Codesp, principalmente no setor jurídico.
Empresas
Em janeiro de 2016, Reis prestou novo depoimento, dessa vez ao MPE, ratificou as acusações e abriu mão do sigilo da sua identidade. Cinco empresas citadas por ele têm ou tiveram contratos com a Codesp. Uma delas, a DTA Engenharia Ltda., assinou dez contratos, que somam cerca de R$ 50 milhões, e são alvos de investigação. Dois deles, um de R$ 19 milhões e outro de quase R$ 1,5 milhão, foram firmados sem licitação para obras de dragagem de canal e monitoramento de material dragado. Em 2010, a DTA doou R$ 50 mil para a campanha de França a deputado federal e outros R$ 10 mil para o ex-deputado estadual Fausto Figueira (PT), ex-assessor da Codesp. Ambas foram declaradas à Justiça Eleitoral.
Outra empresa citada, a Van Oord Dragagens do Brasil, já assinou R$ 89 milhões em contratos com a Codesp, sendo um deles, de R$ 17,5 milhões, sem licitação, em 2014. A empresa, que é uma multinacional holandesa, doou, em 2010, R$ 1,9 milhão ao Diretório Nacional do PSB. A sigla, por sua vez, destinou R$ 2 milhões à campanha de França naquele ano através dos diretórios nacional e estadual.
Também foram denunciadas por Reis a Galvão Engenharia e a Serveng Civilsan, cada uma com um contrato com a Codesp, mas que somam os maiores valores: R$ 40,9 milhões e R$ 287,3 milhões, respectivamente. Ambos doaram, juntas, R$ 1,3 milhão em 2010 para o Diretório Nacional do PSB, que comandava o Ministério dos Portos nos governos Lula e Dilma.
Indicações
Segundo afirmou o denunciante, seis funcionários trabalharam na Codesp por indicação de França, sendo três filiados ao PSB em Santos ou São Vicente, onde o político foi prefeito entre 1997 e 2004, e que também doaram dinheiro para a campanha a deputado federal do atual vice-governador.
Uma delas é a advogada Bernadete Bacellar do Carmo Mercier, que ocupava a superintendência jurídica. Ela foi assessora de França na Câmara e secretária municipal na gestão dele em São Vicente. Também já defendeu o vice-governador em processos no Tribunal de Contas do Estado (TCE) e no Supremo Tribunal Federal (STF).
Investigação
A decisão de arquivar a investigação criminal partiu do procurador geral de Justiça Gianpaolo Poggio Smanio, responsável por casos de autoridades com foro privilegiado, como o vice-governador. Ele acatou os argumentos dos advogados de França e de algumas das empresas investigadas, que alegaram falta de provas para seguir as apurações.
Já na esfera cível, após a decisão do CSMP, o processo continuou.
Promotoria
O inquérito civil instaurado pela Promotoria do Patrimônio Público de Santos para investigar as denúncias contra o vice-governador Márcio França, em fevereiro de 2016, chegou a ser arquivado pelo primeiro promotor do caso, Eduardo Romero.
A decisão, porém, foi levada ao Conselho Superior do Ministério Público, que é formado por 11 procuradores de Justiça. Os conselheiros suspenderam a determinação de Romero e pediram novas diligências antes de uma nova conclusão.
Em março de 2016, Romero pediu afastamento do caso alegando suspeição. As investigações no inquérito civil, então, prosseguiram com outros promotores..