Na primeira sessão transmitida ao vivo pelo Tribunal de Contas de Minas Gerais (TCE-MG), na última quarta-feira, o conselheiro substituto Licurgo Mourão insinuou a existência de ilegalidades dentro da corte de Contas na concessão de diárias para cursos no exterior e também nepotismo cruzado. Ele também sugeriu que há casos em que as esposas acompanham os conselheiros em viagens ao exterior, com os gastos pagos pela corte, e de contratação de “namorada” por empresas terceirizadas.
Licurgo anunciou ainda a apresentação de dois requerimentos para apurar esses fatos e pediu que seja feita uma “devassa” no tribunal para esclarecer “rumores” de fraudes. Constrangidos, os demais conselheiros disseram concordar com os pedidos, que deverão ser formalizados na próxima sessão, prevista para a semana que vem. A íntegra da sessão tem quase três horas. As insinuações podem ser observadas a partir de 2h25min no vídeo exibido na página da TV TCE no YouTube. (Veja abaixo).
Apesar de não ser citado nominalmente, o alvo das insinuações de Licurgo é o futuro presidente do TCE, conselheiro Cláudio Couto Terrão, que, em 2015, conforme reportagem exclusiva do Estado de Minas, recebeu R$ 101 mil em diárias para fazer um curso de quase um ano no exterior, mesmo estando licenciado do cargo. Aprovada poucos dias antes de Terrão viajar para fora do Brasil, a resolução que autoriza a licença remunerada para conselheiros, titulares e substitutos estudarem no exterior estabelece o pagamento de diárias de US$ 400 (cerca de R$ 1,5 mil).
Sentado ao lado de Terrão no tribunal, Licurgo diz no vídeo que vai solicitar a relação de todas as diárias pagas nos últimos 10 anos, com informações pormenorizadas sobre o valor das diárias concedidas aos conselheiros e também procuradores do Ministério Publico de Contas, os dias em que elas foram concedidas e também o fundamento legal para a autorização. “Pois eu tenho sérias dúvidas em relação à legalidade de alguns pagamentos que aqui foram feitos para capacitação no exterior”, afirma Licurgo.
Segundo ele, até hoje, os conselheiros, em eventos fora do estado e no exterior, são questionados sobre o “porquê do pagamento de diárias para alguns membros que se encontravam licenciados, já que essa previsão não está na Lei Orgânica da Magistratura Nacional”, disse Licurgo, se referindo ao estatuto da magistratura brasileira, que também se aplica aos conselheiros dos tribunais de Contas do país.
Em relação ao nepotismo, ele disse que há “rumores” no TCE-MG de que a resolução do Supremo Tribunal Federal (STF) que veda nepotismo direto e indireto tem sido burlada pelos conselheiros. “Há vários rumores nessa casa de abuso de autoridade em relação à designação de ocupantes de cargos comissionados, assistentes administrativos e até terceirizados. Afinal de contas, namorada é parente? Eu posso contratar namorada? Cunhado eu posso? Primos de esposa eu posso?”, questionou Licurgo, sob um olhar de constrangimento dos outros conselheiros.
LICENÇA
As insinuações de irregularidades feitas por Licurgo começaram depois que foi lido pelo presidente do TCE-MG, Sebastião Helvécio, um pedido de licença feito por ele para se ausentar do Brasil no período de 3 a 9 de abril para a realização de um curso. Logo após esse pedido, Terrão cobrou de Licurgo que o pedido fosse acompanhado de uma justificativa e que ele informasse se ia a passeio ou a trabalho. Licurgo rebate dizendo que a maioria dos pedidos de autorização para viajar feitos por ele não são aceitos pelo comando da corte. Diz ainda que concorda com as exigências de explicação, mas que “para ser vestal da moralidade precisa dar exemplo”.
A reportagem não conseguiu contato com nenhum dos conselheiros. A assessoria de imprensa do TCE-MG também foi procurada pelo celular, mas não retornou a ligação e o recado deixado na caixa postal.