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Estado de Minas

Mulheres representam somente 7,6% das Forças Armadas no Brasil

Apesar de avanços pontuais nas últimas décadas, o preconceito, machismo e baixa chance de progressão são os desafios encontrados por elas


postado em 10/04/2017 06:00 / atualizado em 10/04/2017 08:32

Brasília – Bárbara (nome fictício) fez parte da primeira turma feminina da Academia da Força Aérea (AFA), em 2003. O concurso no ano anterior havia sido específico para elas e, das 20 selecionadas, a metade concluiu o Curso de Formação de Oficiais Aviadores. Ela, porém, não está entre as formadas. Em pouco mais de um ano e meio, passou a ser reprovada em instruções classificatórias e acabou expulsa.

“Nós éramos perseguidas. E as que resistiam pagavam mais caro. Parece que a decisão de uma turma só de mulheres foi atabalhoada. Uma coisa de cima para baixo, que teve muita exposição publicitária. Tentavam colocar a gente como um exemplo de ‘tá vendo como somos legais?’, mas, lá dentro, éramos tratadas como intrusas. A questão de gênero estava em tudo, nas conquistas e nos fracassos”, denuncia.

Aos 32 anos, Bárbara conta que entrar na AFA foi a realização do sonho de uma jovem de 17 anos que achava o máximo a ideia de ser piloto de avião. Entretanto, não guarda boas memórias da experiência. “Senti muito preconceito. Era como se a nossa presença fosse um desafio à masculinidade alheia. Um exemplo são as flexões. Antes, quando as mulheres eram apenas da intendência, elas faziam com joelho no chão, mas, quando ‘inventamos’ de querer ser iguais aos homens, passaram a cobrar sem o apoio dos joelhos. Os instrutores pegavam pesado e diziam querer ver a gente chorando para nos colocar no nosso lugar de mulherzinha frágil”, relembra.

Faz 13 anos que ela deixou a Força Aérea Brasileira (FAB), e, apesar de avanços pontuais, a presença de mulheres nas Forças Armadas ainda é tema carregado de dificuldades e preconceitos. Atualmente, o sexo feminino representa 7,6% do efetivo total de militares brasileiros – 28 mil em um universo de 368 mil. O ingresso das pioneiras nas Forças Armadas se deu, justamente, na FAB, em 1982.

A instituição abriga o maior contingente de mulheres, de 10.892. A partir da década de 1980, elas começaram a ter espaço também no Exército e na Marinha, mas sempre em cargos administrativos ou de formação específica, como médicas, advogadas, jornalistas. A brasileira ocupante do mais alto cargo é a contra-almirante Dalva Mendes. Alçada à posição em 2012, Dalva tem o terceiro posto mais importante da Marinha, de duas estrelas. Por lei, ela jamais alcançará a função máxima de quatro estrelas, almirante de esquadra.

Topo da carreira


Uma pequena evolução acontece aos poucos entre os militares. Uma das principais causas é a Lei nº 12.705/2012, sancionada pela então presidente Dilma Rousseff, que obriga a inclusão de candidatas nas escolas de formação e dá prazo de cinco anos para isso acontecer, por exemplo, no Exército. Diferentemente de outros países, elas ainda não poderão atuar na linha de frente de combate, mas ficarão em posições de apoio.

Diante da legislação, a Marinha abriu, no ano passado, a primeira turma feminina da Escola de Formação de Oficiais, a Escola Naval (EN). E o Exército começa a recebê-las neste ano na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman). O interesse delas foi tão grande que o concurso para ingresso na Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx), que antecede a Aman, teve concorrência de 192 candidatas por vaga.

“O principal problema da separação é que, para se chegar ao topo da carreira, é necessário fazer academia. Todos os chefes da instituição vieram das academias e não tem hipótese de se chegar aos cargos de direção sem ser oficial de armas combatentes. Há uma relutância histórica dentro das Forças Armadas em abrir espaços para o público feminino. E o efeito prático de não se ter mulheres em postos de chefia é que as instituições vão ficando muito distantes da sociedade e da evolução contra o machismo”, comenta um capitão do Exército que prefere não se identificar. Com o recente ingresso delas nas academias, o país abre a possibilidade de uma mulher alcançar o topo da carreira em, aproximadamente, 30 anos.

De acordo com o Ministério da Defesa, a Comissão de Gênero da instituição, criada em 2014, trabalha para ampliar a inserção das mulheres nas Forças Armadas de forma gradativa, permitindo o acesso delas a todas as áreas. Entre os assuntos tratados pela comissão, segundo a pasta, estão a preservação da identidade de gênero na socialização das tarefas, a superação de barreiras que impedem o acesso a todas as funções e postos e a adequação de uniformes e equipamentos pessoais em relação ao gênero. “As iniciativas visam ampliar a participação das mulheres, acompanhadas da melhor compreensão da presença feminina por todos os integrantes”, destaca o órg ão federal, por meio de nota.


Mudança cultural ainda é necessária


Quase cinco anos depois da sanção da lei 12.705, que determinou ao Exército Brasileiro neste prazo o ingresso “na linha de militar bélica de ensino de candidatos do sexo feminino”, a primeira turma de 32 jovens meninas começou, em 18 de fevereiro, o treinamento de um ano na Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx). Aquelas que forem aprovadas ingressarão na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) onde passarão a cursar o bacharelado em Ciências Militares e poderão escolher entre as especialidades do Quadro de Material Bélico e do Serviço de Intendência. Apesar do avanço, a maior preocupação é com a mudança da cultura.

“O militar brasileiro acha que a mulher não tem condições de ocupar as armas combatentes. Há mulheres em posição de comando e na linha de frente de batalha no mundo todo, mas no Brasil a visão ainda é muito conservadora”, comenta um servidor do Ministério da Defesa que teme represálias caso tenha o nome revelado. Segundo ele, o Exército não se preparou adequadamente para receber essas jovens. “Fez somente a parte logística, reformando prédios e banheiros, mas não houve preparação cultural dos professores e cadetes. Não foram criadas instituições típicas para tratar de casos que envolvam as mulheres, por exemplo, denúncias de assédio”, comenta.

Questionado, o Exército ressaltou que as mulheres sempre tiveram espaço e respeito dentro da corporação, acrescentou que adequou as instalações e selecionou instrutores específicos para a formação das mulheres, mas, de fato, confirmou que não há um órgão dentro da instituição que trate de assuntos especificamente ligados a militares do sexo feminino.


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