A recente saia justa envolvendo o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, questionado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, por atuar no caso do empresário Eike Batista – com o argumento de que a defesa é feita pelo escritório em que a mulher de Mendes trabalha – não é novidade.
Desde 2007, já foram ajuizadas no STF 42 arguições de impedimento de seus integrantes, colocando na mira da Justiça a possível parcialidade de outros magistrados. Embora o site do STF registre 45 ações, três delas foram classificadas de forma errada. Entre as aquelas que já foram julgadas, em nenhuma foi concedida a suspeição.
Os ministros Dias Toffoli e Marco Aurélio Mello são os recordistas: ambos já foram alvos de sete ações de impedimento. O primeiro foi questionado por autores de processos que envolviam o governo federal, já que o ministro foi integrante da Advocacia-Geral da União (AGU). Em alguns casos, ele mesmo se declarou impedido para o julgamento e por isso a ação foi transferida para outro colega de plenário. Mas Toffoli esteve mesmo no olho do furacão durante a tramitação do processo que culminou na condenação de 24 pessoas por envolvimento no escândalo do mensalão.
Ex-advogado do PT, amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e ex-assessor jurídico da Casa Civil na gestão de José Dirceu, Dias Toffoli não se declarou impedido nem teve a suspeição arguida pela acusação ou pela defesa dos réus. Questionado sobre a omissão, o então procurador-geral da República Roberto Gurgel disse ter feito um “cálculo pragmático” ao decidir não se manifestar contra o ministro.
“Na medida em que eu fizesse essa arguição, nós teríamos de imediato a suspensão do julgamento. Dessa suspensão poderia decorrer até a inviabilização de que esse julgamento acontecesse num horizonte de tempo razoável”, alegou Gurgel na ocasião.
Marco Aurélio Mello preferiu não atuar nos processos em que teve a participação questionada. Atitude semelhante adotada na década de 1990, durante a tramitação do processo de impeachment do então presidente e hoje senador Fernando Collor de Mello – seu primo e responsável pela sua indicação ao Supremo. Em abril de 2014, ele também não participou do julgamento de Collor na ação em que era acusado de peculato (desvio de dinheiro público), falsidade ideológica e corrupção passiva na assinatura de contratos durante sua gestão no Palácio do Planalto (1990 a 1992). Collor foi inocentado por falta de provas.
FILHA DE JANOT VIRA ALVO Em meio à queda de braço com Gilmar Mendes, Janot virou alvo e há quem questione a sua isenção na atuação de processos envolvendo o pagamento de propinas dentro da Petrobras, na chamada Operação Lava-Jato. Isso porque a filha dele, Letícia Ladeira Monteiro de Barros, tem como clientes a Braskem, petroquímica controlada pela Odebrecht, a construtora OAS e a Petrobras, em diferentes ações que tramitam na Justiça Federal e no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Em nota divulgada nessa terça-feira (9), a PGR nega que haja conflito de interesses e argumenta que quem celebra os acordos do Cade com empresas é a primeira instância do Ministério Público Federal, na qual ele não atua. “É importante notar que os executivos da OAS não firmaram acordo de colaboração no âmbito da Operação Lava-Jato e a Construtora OAS não assinou acordo de leniência. O procurador-geral da República não assinou nenhuma petição envolvendo a empresa ou seus sócios. Portanto, não há atuação do PGR”, diz trecho da nota.
Juridiquês/Português
Suspeição
Situação que impede representantes do Ministério Público, advogados, testemunhas, peritos ou qualquer outro auxiliar da Justiça de, em certos casos, participarem do processo em razão da dúvida de que não possam exercer suas funções com imparcialidade ou independência. Exemplo: juiz é amigo de alguma das partes ou tem interesse em julgamento favorável a uma das partes.
Impedimento
Situação em que um magistrado é proibido de atuar em um processo. Exemplo: processos em que o juiz tenha atuado como advogado, se tiver sido testemunha do caso ou dado uma sentença ou decisão quando a ação tramitava na primeira instância.