Marcelo Ernesto
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, fez ontem, em Belo Horizonte, uma defesa enfática do instrumento de delação premiada para ajudar a solucionar crimes, principalmente, ligados à corrupção e desvios de recursos. Em palestra na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Janot disse que as delações ou acordos de leniência – no caso das empresas –, não são uma novidade e que esse procedimento é adotado no mundo inteiro. “Esse tipo de colaboração não é jabuticaba. Ela não foi inventada no Brasil. Ela não nasceu de alguém que acordou e foi fazer a barba e teve essa grande ideia”, afirmou.
Janot ainda classificou como “rasa” a interpretação de que quem opta por fazer acordos de delação seja “dedo-duro” ou “caguete”. Ele exaltou a importância desse tipo de ferramenta no momento de elucidar os acordos. “O colaborador confessa o crime e aponta o caminho para a investigação”, pontuou. Ele ainda afastou a ideia de que só faz esse tipo de colaboração quem já está preso e pretende, com essa estratégia, redução da pena.
De acordo com o procurador, do total de delações premiadas no caso da Lava-Jato, 85% foram fechadas com réus que não estavam presos. A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao rebater as denúncias feitas por delatores que o envolvem diretamente no esquema de corrupção da Petrobras, argumenta que o instrumento tem sido usado por presos para conseguir a liberdade. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) também criticou as delações. Em nota, a entidade afirmou que muitas vezes o conteúdo é usado para “sujar” a biografia dos acusados e que isso pode causar “danos irreparáveis aos citados”.
Janot afirmou que são feitos inúmeros acordos de colaboração entre países que possibilitam que recursos sejam repatriados. Ele afirmou que, só nas apurações relacionadas à Lava-Jato, já foram recuperados mais de U$ 250 bilhões, sendo que parte desse valor já foi até usado pelo governo do estado do Rio de Janeiro para pagar salários atrasado dos servidores.
Em um breve histórico da atuação do Ministério Público, o procurador afirmou que as manifestações de 2013 e também a não aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 37), que tinha a intenção de barrar a atuação dos procuradores, deu à instituição mais força. O que, segundo ele, resultou no comportamento mais independente adotado atualmente. Após pressão popular, a PEC 37, que atribuía exclusivamente às polícias Federal e Civil a competência para a investigação criminal, foi rejeitada no plenário da Câmara dos Deputados, em junho de 2013.
‘FILÃO’ Ao falar para os estudantes de direito da UFMG, onde Janot se formou e chamou de “casa”, ele apontou que a investigação é a sempre feita por “tentativa e erro”. Cabendo ao investigador escolher um caminho que só é abandonado se não der certo. Nessa parte, sem citar nominalmente o deputado cassado e ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, ele afirmou que recomendou que a força-tarefa tivesse “calma” para interpretar os dados da investigação relacionado “a um parlamentar que tinha mandato e que está preso em Curitiba” e que estava sendo feita com parceria internacional. “Calma, que já estamos no filão (da investigação)”, disse.
Sobre a cooperação internacional, Janot falou do caso do ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, condenado a 12 anos e sete meses de prisão pelos crimes de formação de quadrilha, peculato e lavagem de dinheiro no caso do mensalão. Segundo ele, como o Brasil não tem acordo de extradição de cidadãos brasileiros, foi preciso muita negociação, mas que, ao final, foi possível trazê-lo para cumprir pena aqui. O procurador-geral aproveitou e fez um aviso: “Não adianta esconder bens e valores fora do Brasil que a gente alcança. Não adianta fugir do Brasil”.