Prefeitos vão a Brasília para reivindicar 'encontro de contas' com a União

Chefes do Executivo municipal fazem nova marcha até a capital federal para pressionar o governo com várias reivindicações, que incluem ressarcimento ao estado por perdas da Lei Kandir

Juliana Cipriani
Desde 1998 prefeitos fazem caravanas a Brasília. Em 2003, eles ocuparam o gramado do Congresso para protestar contra a reforma tributária - Foto: José Varella/CB/D.A Press

Centenas de prefeitos desembarcam em Brasília a partir de amanhã para pressionar o presidente Michel Temer (PMDB) por uma pauta municipalista que inclui o “encontro de contas” entre governo federal e municípios, a redução do custeio das máquinas públicas e o repasse de recursos financeiros condizentes com as competências estabelecidas pelo pacto federativo. Em meio aos pedidos, o grupo de Minas Gerais tentará incluir um pleito do governador Fernando Pimentel (PT), abraçado pelas bancadas parlamentares: a renegociação da dívida do estado com a União, que passa pelo ressarcimento pelas perdas com a Lei Kandir. O pedido, já encaminhado ao governo federal, é para zerar o débito mineiro, o que, na visão dos prefeitos, liberaria mais dinheiro para arcar com serviços nas cidades. A chamada Marcha dos prefeitos, que este ano está em sua 20ª edição, vai ser aberta pelo presidente Michel Temer, em Brasília.

Além de participar do encontro, os prefeitos mineiros se reúnem com os deputados federais do estado para pressionar pela aprovação de projetos. O principal é o que obriga o governo federal a indicar a fonte de recursos sempre que criar alguma nova obrigação para os municípios. Os prefeitos também pedirão aos parlamentares para trabalhar pela derrubada do veto do presidente Temer ao projeto que mudava a regulamentação do ISS sobre operações de cartão de crédito.

O texto passava a deixar os recursos do tributo na cidade na qual foi feita a compra em vez da que sedia o cartão. “Se é um imposto sobre serviço, ele deve ficar no local da prestação do serviço. Está havendo hoje uma concentração em três cidades em São Paulo, onde fica um paraíso fiscal da maioria dos cartões.
Só para os municípios mineiros o prejuízo é de R$ 3 bilhões”, avalia o presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM) e prefeito de Moema, Julvan Lacerda (PMDB).

DÍVIDAS PREVIDENCIÁRIAS

Os prefeitos mineiros também pedirão, só que diretamente a Temer, a revisão de dívidas previdenciárias dos municípios com a União. “Metade dos municípios tem dívidas com a Previdência, muitas delas impagáveis”, afirma Lacerda. Atualmente, existe um parcelamento de 60 vezes e os prefeitos tentam ampliar esse período para 240 parcelas. O pleito é que ele edite ou inclua uma emenda em uma medida provisória para este fim.

No caso da renegociação da dívida de Minas com a União, os municípios estão de olho em 25% do que o estado tem direito sobre a reposição das perdas com a Lei Kandir, que isentou de ICMS as exportações. Minas tem cerca de R$ 135 bilhões a receber e deve atualmente à União cerca de R$ 85 bilhões. “O governo precisa fazer esse encontro de contas e, no momento que o estado recebe, os municípios também serão beneficiados porque aí o estado paga a dívida que tem conosco”, diz Julvan.

A marcha dos prefeitos a Brasília vai até quinta-feira. A pauta municipalista também inclui pleitos nas reformas da Previdência, tributária e política. Os prefeitos são favoráveis às mudanças propostas por Temer na Proposta de Emenda à Constituição (PEC 287/16) que, segundo eles, vai gerar mais recursos nas cidades. Como pauta, os municípios propõem uma ampla revisão e o parcelamento dos seus débitos previdenciários.

Os prefeitos também pedem a atualização monetária dos repasses feitos pela União para custear programas municipais em áreas como educação e saúde. Eles buscam apoio, ainda, para uma proposta em tramitação (PEC 65/15) que permite aos prefeitos apresentar emendas direcionando os gastos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) no orçamento federal.

Em busca de autonomia

O presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, afirma que a Marcha dos prefeitos é um espaço de lutas para definir e alertar autoridades do Executivo, do Congresso Nacional e do Judiciário sobre temas que garantam a conquista de autonomia pelos municípios, além de mostrar ao cidadão os caminhos que os gestores municipais defendem como solução para enfrentar e vencer a crise que atinge todos.

Em relação ao parcelamento de suas dívidas, além da dilatação do prazo de pagamento, os prefeitos querem que  seja estabelecido um teto de 1% da receita corrente líquida, sem multa, para os municípios quitarem débitos. A intenção, segundo o presidente da CNM, é temporariamente dar um fôlego para que o prefeito possa regularizar a situação do seu município. Atualmente a correção é feita pela Selic, que prevê juros bem maiores. Ainda consta no ofício pedidos referentes às ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) que promovem a descentralização na distribuição das receitas de royalties do petróleo, pauta que será entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF), onde tramitam esses processos.

Memória

Barrados na rampa do Palácio do Planalto


A Marcha dos prefeitos começou com uma pequena mobilização em Brasília, em 1998.
Pela primeira vez, gestores municipais de todo o país estiveram organizados para apresentar ao governo sua pauta de reivindicações. Alguns dos itens, na época, foram o aumento do Fundo Participação dos Municípios (FPM) e a municipalização dos recursos do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA). Apesar das demandas urgentes da época, os prefeitos foram recebidos pela tropa de choque da Polícia Militar na rampa do Palácio do Planalto. A tentativa frustrada de marcar uma audiência com o então presidente Fernando Henrique Cardoso levou o grupo a se reunir novamente no ano seguinte, na 2ª Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios.No decorrer dos anos, o movimento foi ganhando força até se transformar em um dos maiores eventos municipalista da América Latina..