Você arrisca a prever o que será de nós?
É possível que, a curto prazo, a decisão de Michel Temer de resistir o transforme em um presidente fraco, refém do Congresso, incapaz de exercer sua autoridade e controle sobre o governo em um sistema que o enfraquecimento do presidente não fortalece o parlamento, porque não tem a figura do primeiro-ministro. A França, por exemplo, é um regime semipresidencialista, ou seja, quando o presidente tem maioria e força no parlamento, ele manda. Quando perde essa força, essa maioria, o primeiro-ministro manda. Lá tem esse jogo. No Brasil, não.
Quais oportunidades?
Se o TSE cassar a chapa Dilma-Temer, há uma chance de saída mais rápida de Temer e aí a questão é a escolha do sucessor. Mas não é também uma questão trivial encontrar pessoas com capacidade de chegar à Presidência via eleição indireta do Congresso. Alguém que esteja fora da Lava-Jato, com capacidade de liderança, que forme consenso, que se disponha a fazer uma travessia ordenada e tranquila e eficiente daqui até 2018, que comande o processo de redefinição das regras de financiamento de campanha para as eleições de 2018 e coordene como árbitro essas eleições. Não vejo ninguém com esse perfil de imediato. Estamos em uma encrenca.
Será que o Brasil vai conseguir aproveitar esse momento de transição para alterar suas estruturas?
Essa é a minha esperança e minha aposta. Mas não é uma questão que se resolva a curto prazo com a conjuntura atual, nem na sucessão do Temer nem nas eleições de 2018, como não foi na eleição americana, na alemã. É um processo de mais longo prazo e não envolve uma pessoa para capitanear essas mudanças. Não é uma questão de liderança pessoal, de escolhas coletivas, um movimento de sociedade. O Brasil tem muito talento desperdiçado que pode fazer essa mudança, muitos recursos que pode usar, recursos humanos, de biodiversidade, cruciais no século 21, um século do conhecimento da genômica, da biologia. Essas transformações o Brasil tem que aproveitar, a revolução científica tecnológica para dar um salto civilizatório, que ele tem condições de dar.
Mas o que é preciso para fazer essa transição?
É preciso que a gente pare de olhar para o retrovisor, de ter essa concepção de desenvolvimento baseada em indústrias, que vão desaparecer, como petróleo, siderurgia, mineração, essa velharia da economia fóssil. A nova economia que está se formando é muito diferente, é do conhecimento, compartilhamento, globalizada, ágil, aberta, baseada na inovação. Para isso, a gente tem que se preparar.
As eleições diretas seriam um caminho para solucionar essa crise?
Eleições diretas agora seriam muito complicadas, porque implica em mexer na Constituição em um momento que o Congresso está paralisado, não há liderança política clara no país, as lideranças estão em decadência. Fazer uma eleição direta agora seria extraordinariamente difícil. Criaria muito conflito, não seria uma boa mudança. Por outro lado, é uma saída muito demorada. Até aprovar a reforma constitucional, preparar as eleições etc, seria lá pelo fim do ano. Estaremos muito próximo das eleições de 2018. Então, o ideal seria fazer eleição indireta, negociada de forma ampla. Não pode ser um desses oligarcas decadentes enrolados nesse sistema de corrupção, ou um Rodrigo Maia (presidente da Câmara), sem liderança, sem projeção pessoal para construir um consenso no Congresso e na sociedade, para fazer uma transição tranquila para 2018.
Como conseguir consenso em tempos tão polarizados?
No meu livro digo que, nesses tempos de transição, de insegurança, é muito difícil formar consenso, que se tornou praticamente impossível no mundo inteiro em cada um dos países. No Brasil, é mais difícil por causa da conjuntura e desse processo de mudança estrutural.