Temer enfrenta julgamento no TSE em meio a crise

As dificuldades incluem a perda de apoio no Congresso Nacional, a saída de ministros e uma coleção de pedidos de impeachment

Isabella Souto
Desde o dia 17 de maio, Temer tem vivido constantes dificuldades - Foto: Jose Cruz/Agencia Brasil

O presidente Michel Temer (PMDB) chega nesta terça-feira ao banco dos réus do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em pleno inferno astral. Desde 17 de maio – quando foram divulgadas gravações de conversas entre o peemedebista e o empresário Joesley Batista, dono da JBS – ele vem se desdobrando para apagar pequenos e grandes incêndios em seu governo. Os entraves incluem a perda de apoio no Congresso Nacional, a saída de ministros, uma coleção de pedidos de impeachment e a repercussão negativa da convocação das Forças Armadas para num dia em que manifestações levaram a incêndios, desta vez literalmente, de ministérios em Brasília.


O ápice do pesadelo até agora talvez seja a autorização concedida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin para que a Polícia Federal tome o depoimento de Michel Temer no inquérito que apura o conteúdo das delações dos irmãos Joesley e Wesley Batista. A defesa do presidente havia recorrido ao STF contra a tentativa da PF de ouvi-lo, sob o argumento de esperar a perícia que atestará a veracidade dos diálogos – o que não deixa de ser uma estratégia para ganhar tempo. No entanto, os advogados não conseguiram convencer o ministro. Assim que receber os questionamentos, Temer terá 10 dias para respondê-los, por escrito.

Antes do revés no STF, Temer já vinha sendo derrotado em outras batalhas. No dia seguinte à divulgação das gravações, perdeu o apoio no Congresso de 13 parlamentares do Podemos (novo nome do PTN). O partido foi o primeiro a romper com o governo.

Atitude seguida pelo PSB, que ainda decidiu apoiar a proposta de emenda à Constituição (PEC) em tramitação na Câmara, que prevê a realização de eleições diretas em caso de vacância dos cargos de presidente e vice até os últimos seis meses de mandato.

O PSB, no entanto, manteve o cargo de ministro de Minas e Energia, com Fernando Coelho. “A saída do ministério, como orienta meu partido, não contribui para a construção de uma solução para a crise que enfrentamos”, afirmou o ministro, em nota. O PPS adotou postura semelhante. Embora tenha defendido a renúncia de Temer e a convocação de eleições diretas para seu sucessor, manteve Raul Jungmann na Defesa, pela “relevância” de sua atuação. O presidente nacional da legenda, Roberto Freire, no entanto, entregou o Ministério da Cultura.

Sei o que fiz


A avalanche causada pelo conteúdo das gravações gerou a expectativa de uma renúncia de Michel Temer já em 18 de maio. Mas no esperado discurso feito às 16h, o presidente foi curto e grosso: “Não renunciarei.  Sei o que fiz”. Mesmo tom foi adotado no dia 20, quando fez novo pronunciamento para anunciar que pediria a suspensão do inquérito aberto contra ele.

Na semana seguinte, centrais sindicais e grupos de esquerda organizaram a marcha Ocupa Brasília, que defendeu a renúncia e convocação de eleições diretas. O  ato começou pacífico, mas esquentou no início da tarde com um conflito entre policiais e manifestantes na Esplanada dos Ministérios. De um lado, barricadas. Do outro, bombas de gás lacrimogênio e balas de borracha.

O saldo da violência foi incêndios e depredação de prédios públicos. Michel Temer então baixou um decreto convocando as Forças Armadas para fazer a segurança na Esplanada dos Ministérios. A medida gerou muitas críticas e levou a um mal-estar com a Câmara dos Deputados.


Ao anunciar a convocação das tropas, Raul Jungmann afirmou que atendia a um pedido do presidente da Casa, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ). Logo depois desfez o que chamou de “engano”. “O presidente da Câmara não tem responsabilidade nenhuma, foi uma decisão operacional que tomamos e o conflito de versões está esclarecido”, disse.

Maia, na verdade, havia solicitado a Força Nacional de Segurança para garantir a continuidade dos trabalhos no Congresso. Que, aliás, também teve um dia quente, com muito bate-boca entre os parlamentares. No dia seguinte o decreto foi revogado “considerando a cessação dos atos de depredação e violência e o consequente restabelecimento da Lei e da Ordem no Distrito Federal, em especial na Esplanada dos Ministérios”, dizia o texto.

Impeachment


Depois de enfrentar os protestos do povo, foi a vez de Temer se deparar com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A entidade apresentou na Câmara dos Deputados o 17º pedido de impeachment contra ele, acusado de crime de responsabilidade e violação do decoro do cargo. Em meio à crise, passou a ser meta de Temer ter no Ministério da Justiça alguém com interlocução no Judiciário.

Dessa forma, no final de maio, o governo anunciou que a pasta seria comandada por Torquato Jardim, visto como alguém que tem interlocução no STF e mais pulso para interferir no comando da Polícia Federal. Ao deputado federal licenciado Osmar Serraglio, que respondia pela Justiça, foi oferecido o Ministério da Transparência – até então nas mãos de Torquato. Em carta, Serraglio recusou o convite e anunciou a volta ao mandato na Câmara dos Deputados.

No sábado passado, novo revés, com a prisão do ex-assessor Rodrigo Rocha Loures, flagrado com mala de R$ 500 mil – propina que o Ministério Público acredita ser destinada a Michel Temer. Advogados do ex-deputado, no entanto, já disseram que não há o que delatar.


Economia


Na tentativa de afastar os holofotes da crise política, Michel Temer tem usado a economia como trunfo. Em vídeo publicado na internet na quinta-feira passada, ele ressaltou o crescimento de 1% do PIB nos três primeiros meses do ano em relação ao trimestre anterior – depois de oito quedas consecutivas. Para ele, os números marcam o “renascimento da economia”.

No primeiro pronunciamento feito depois da divulgação da delação da JBS, Temer ressaltou os indicadores de queda da inflação e dados de geração de empregos, que estavam levando a “esperança de dias melhores”. “Contudo, a revelação de conversas gravadas clandestinamente trouxe de volta o fantasma de crise política de proporção ainda não dimensionada”, discursou.

CRONOLOGIA DA CRISE POLÍTICA


17 de maio

Vem à tona a gravação de um diálogo entre Michel Temer e o empresário Joesley Batista, dono da JSB, em que ele indica o deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) para resolver um assunto do frigorífico. Temer também ouviu de Joesley que estava dando a Eduardo Cunha e ao operador Lúcio Funaro uma mesada na prisão para ficarem calados. Diante da informação, Temer incentivou: "Tem que manter isso, viu?"

18 de maio

>> O deputado federal Roberto Freire  (PPS-SP) renuncia ao comando do Ministério da Cultura.

>> A bancada do Podemos (ex-PTN), composta de 13 deputados, anuncia o rompimento com Temer.

20 de maio

>> A comissão nacional do PSB decide deixar a base governista e pedir a renúncia de Temer.

24 de maio

>> Organizada por centrais sindicais e grupos de esquerda, a marcha Ocupa Brasília pede o fim do governo Temer e a convocação de eleições diretas. O ato foi marcado pelo confronto entre policiais e manifestantes, incêndio e depredação de prédios de ministérios.

25 de maio

>> OAB protocola pedido de impeachment de Michel Temer na Câmara dos Deputados. Foi o 17º requerimento defendendo a saída do presidente.

28 de maio

>> Governo anuncia troca no comando do Ministério da Justiça, com a indicação de Torquato Jardim para o cargo. A ideia era que Osmar Serraglio, então ministro da Justiça, assumisse o Ministério da Transparência, ocupado por Jardim. Insatisfeito, Serraglio não aceitou assumir o cargo e não participou da posse de Jardim.

30 de maio

>> O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin autoriza a Polícia Federal a tomar o depoimento de Michel Temer. Pela decisão, assim que receber os questionamentos, o presidente deverá depor por escrito.

2 de junho

>> O ex-assessor de Temer e ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (foto) (PMDB-PR), flagrado carregando uma mala com R$ 500 mil, é preso em Brasília. A prisão foi decretada por Edson Fachin a pedido do procurador Rodrigo Janot..