A delação dos executivos do Grupo J&F deve abrir uma nova temporada de acordos de colaboração premiada na Operação Lava-Jato. Investigadores e advogados esperam um crescimento no número de candidatos a colaboradores, em especial políticos e assessores, que podem ampliar denúncias contra o PT e o presidente Michel Temer.
São cerca de 15 negociações em andamento apenas em Curitiba, origem da força-tarefa que apura esquema de corrupção na Petrobras. Os ex-ministros Antonio Palocci (ex-Fazenda e ex-Casa Civil nos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, respectivamente) e Guido Mantega (ex-Fazenda de Lula e Dilma), por exemplo, podem delatar aos procuradores da Lava-Jato repasses ilícitos à campanha pela reeleição de 2014, implicando PT e PMDB, que encabeçaram a chapa.
"A delação da JBS, pela amplitude política de suas revelações, deve gerar uma avalanche de procura por acordos", disse Carlos Fernando do Santos Lima, procurador regional da República da Lava Jato no Paraná.
Com 158 acordos de delação e dez de leniência - espécie de delação para pessoas jurídicas - fechados, em Curitiba, em pouco mais de três anos de investigações da Lava Jato, o recado implícito no acordo dos irmãos Joesley e Wesley Batista, segundo os delatores, foi claro: quem primeiro procura o Ministério Público Federal (MPF) mais benefícios obtém.
Procuradores da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba e Brasília, ouvidos pela reportagem, avaliam que as negociações de novas delações sofrerão um "efeito Odebrecht-J&F". Neste domingo, 4, a reportagem mostrou que o acordo assinado com os irmãos Batista, criticado pelos benefícios concedidos, rende até 2 mil anos de perdão das penas.
"Imagine quantos corruptos não devem estar pensando ou conversando com seus advogados sobre as vantagens de se adiantar e procurar o MPF para contar o que sabem, antes de serem delatados por comparsas, ou de serem acordados pela Polícia Federal ao nascer do sol. O recado é que a água está limpa para quem chega primeiro", afirmou o procurador da República Helio Telho Corrêa Filho, do Núcleo de Combate à Corrupção no MPF, em Goiás.
Fila
Na fila dos candidatos a delatores da Lava Jato em Curitiba, estão, além de Palocci e Mantega, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o ex-presidente da OAS José Adelmário Pinheiro Filho, conhecido como Leo Pinheiro, e o ex-diretor da Petrobrás Renato Duque. Desses, só Mantega não está preso - ele chegou a ser detido em 22 de setembro, na 34.ª fase da força-tarefa, mas foi solto um dia depois.
Apontados por executivos e ex-executivos da Odebrecht e J&F como responsáveis pelas "contas" de propinas destinadas aos governos Lula e Dilma, que chegaram a ter saldo de mais de R$ 500 milhões, segundo relatos de delatores, Palocci e Mantega são considerados dois homens-bomba da República, que podem duelar indiretamente para ver qual deles fecha antes um acordo. Os recursos, segundo os colaboradores, eram destinados para políticos, partidos e campanhas, entre 2004 e 2014.
A delação da J&F, homologada no mês passado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), foi decisiva para que os petistas passassem a ser vistos como "delatores concorrentes". A reportagem apurou que, para a Lava Jato, não há espaço para Palocci e Mantega fazerem acordos de colaboração simultâneos.
Para a força-tarefa, Palocci e Mantega seriam também peças importantes para aprofundar investigações sobre o envolvimento de bancos no esquema de corrupção descoberto, além de fornecer a lista de empresas e negócios abarcados nos crimes.
Palocci - preso em 26 de setembro, na 35ª fase - tem proposta em consolidação, após contratar dois advogados de Curitiba, especialistas em delações premiadas, Adriano Bretas e Tracy Reinaldet. A defesa de Palocci não foi localizada para comentar o assunto.
O criminalista Fábio Tofic, defensor de Mantega, negou que seu cliente negocie um acordo. "Se alguém me provar que algum advogado esteve no Ministério Público em nome de Guido Mantega para negociar delação premiada, eu abandono o caso", afirmou o advogado.
Negativas
O MPF informou que não comenta acordos e investigações em andamento. Os ex-presidentes Lula e Dilma, por meio de seus advogados, têm negado envolvimento em crimes e recebimento de propina. O presidente Michel Temer afirma, por meio de sua assessoria de imprensa, que nunca recebeu qualquer dinheiro ilícito.
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