Brasília, 20 - Em um julgamento de grande importância para a sequência das investigações criminais no País, o Supremo Tribunal Federal (STF) discutirá nesta quarta-feira, 21, os limites da atuação do juiz nos acordos de delação premiada. O tema irá a debate no plenário da Corte como uma questão de ordem apresentada pelo ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato, diante de críticas ao perdão judicial concedido aos delatores do Grupo J&F, holding da empresa JBS. A Corte também julgará um pedido do governador de Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB), que diz que Fachin não deveria ter sido nomeado relator da JBS por prevenção, como foi, e que deveria ter havido sorteio entre todos os ministros.
Pilar da Lava Jato, o instituto das delações premiadas vem sofrendo o maior questionamento desde que foi regulamentado, em 2013, na esteira da homologação das delações do grupo que controla a marca Friboi, que baseia o inquérito que ameaça o mandato do presidente Michel Temer (PMDB) e motivou a prisão do ex-assessor especial da presidência Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) e o afastamento do senador Aécio Neves.
Responsável pela homologação destas delações e condutor das investigações relacionadas, Edson Fachin justificou que enviou a questão de ordem ao plenário "para o bom andamento do processo". Segundo ele, o objetivo é garantir "o princípio da segurança jurídica". A questão de ordem foi formulada pelo próprio ministro diante da petição do governador de Mato Grosso do Sul (PSDB).
No julgamento, o Supremo deverá decidir se o juiz pode intervir nos acordos de colaboração propostos ou se deve apenas verificar se tudo foi feito dentro do que diz a lei. Por exemplo, se pode discutir com a PGR a respeito dos benefícios concedidos já no momento antes de homologar, ou se isso só deverá ser feito na fase final do processo, quando da fixação das penas aos investigados.
Os ministros também poderão decidir se cabe ao relator fazer a homologação em uma decisão individual ou se deve levar ao plenário para que seja uma decisão colegiada.
Embora não comente o caso publicamente, ao homologar as delações dos acionistas e executivos do grupo J&F, Fachin citou expressamente decisão do plenário da Corte segundo a qual a homologação "limita-se a aferir a regularidade, a voluntariedade e a legalidade do acordo, não havendo qualquer juízo de valor a respeito das declarações do colaborador". O relator da Lava Jato grifou, em seu despacho, trecho sobre a não realização de "juízo de valor" sobre os fatos delatados.
Para o advogado Gustavo Passarelli, que representa o governador de Mato Grosso do Sul, o benefício dado aos irmãos Joesley e Wesley Batista fere o princípio da legalidade. Ele destaca que, de acordo com a lei das delações premiadas, o MP só pode deixar de processar um delator se ele "não for o líder da organização criminosa".
"Dentro do cenário das delações que eles próprios fazem, existe uma organização, uma estrutura organizacional da empresa da qual eles eram os líderes. Por isso reputamos como indevido o benefício de não serem processados", afirmou o advogado ao Estado. A defesa pretende "que seja revista a homologação com o recordo do acordo para o MPF com as devidas readequações, para que não conste do acordo o benefício do não oferecimento de denúncia".
Nesta segunda-feira, o ministro Luiz Fux disse que o Judiciário "pode eventualmente avocar para si o poder de homologar" as delações premiadas. A afirmação vem em meio à polêmica do acordo firmado entre a Procuradoria-Geral da República (PGR) e executivos do Grupo J&F, dos irmãos Batista.
(Breno Pires, Rafael Moraes Moura e Isadora Peron)