MPF-RN denuncia Cunha e Alves por corrupção passiva e lavagem de dinheiro

Para a entidade existia entre os dois - que foram presidente da Câmara dos Deputados - uma 'parceria criminosa'.

- Foto: Agência Câmara
O Ministério Público Federal do Rio Grande do Norte (MPF-RN) denunciou os ex-presidentes da Câmara Henrique Eduardo Alves, ex-ministro dos governos Dilma Rousseff e Michel Temer, e Eduardo Cunha, ambos do PMDB, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Para o MPF, entre Cunha e Alves existia uma "verdadeira sociedade ilícita ou parceria criminosa". Os dois já estão presos.

Segundo a denúncia, entregue nesta terça-feira, 20, à Justiça Federal, os dois ex-deputados, entre 2012 e 2014, solicitaram e receberam vantagens indevidas por meio de doações eleitorais, oficiais e não oficiais, "em razão da atuação política e parlamentar de ambos em favor dos interesses de empreiteiras".

Os ex-parlamentares são acusados de receber, juntos, pelo menos R$ 11,5 milhões em propinas de empreiteiras. Além disso, mais de R$ 4 milhões teriam sido repassados a dois clubes de futebol a pedido de Alves.

Cunha e Alves foram alvo da Operação Manus, desdobramento da Lava Jato deflagrado no último dia 6 de junho para investigar rombo no FI-FGTS da Caixa e desvios de R$ 77 milhões na Arena das Dunas para a Copa de 2014. Alves foi preso pela Polícia Federal em casa, em Natal, e Cunha já estava custodiado no Complexo Médico Penal do Paraná.

Também foram denunciados o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro e o executivo da Odebrecht Fernando Ayres por corrupção ativa e lavagem de dinheiro; e o empresário e ex-secretário de Obras de Natal Carlos Frederico Queiroz Batista da Silva, conhecido como Fred Queiroz, e o empresário Arturo de Arruda Câmara, sócio da Art&C Marketing Político Ltda, por lavagem de dinheiro e organização criminosa. Segundo a acusação, os dois últimos teriam usado a campanha de Alves a governo do RN como "mecanismo de lavagem de dinheiro proveniente do crime de corrupção passiva".

Propinas


A denúncia apresentada pelo MPF tem 88 páginas e contém provas como mensagens de celulares, prestações de contas eleitorais, dados bancários e telefônicos, depoimentos, delações, diligências de campo e outros documentos. Nela, os procuradores afirmam que uma das estratégia dos ex-deputados era disfarçar a propina por meio de doação eleitoral e citam quatro empreiteiras. Leia na íntegra o documento.

Segundo os procuradores, a OAS repassou, ao todo, R$6,85 milhões diretamente aos ex-deputados ou a diretórios do PMDB - sempre com aval de Léo Pinheiro.
Em troca, Cunha e Alves agiram no favorecimento da empreiteira, para aprovar um projeto de lei que acabaria com as restrições da empresa na privatização dos aeroporto de Galeão, no Rio de Janeiro, e Confins, em Minas Gerais. Alves também atuou no Tribunal de Contas do Estado (TCE-RN) para liberar financiamento do BNDES na obra da arena de Dunas, em Natal.

Já a Odebrecht, diz a denúncia, repassou o total de R$ 3 milhões para contas diretas das campanhas ou por meio de diretórios do partido. Segundo o MP, parte desses valores teria sido pago pela Odebrecht já que Léo Pinheiro não poderia fazer o pagamento na ocasião. Isso levaria à "posterior compensação entre as empreiteiras", diz o documento. Desse montante, R$ 2 milhões foram acertados por Fernando Luiz Ayres, por caixa dois, para a privatização da Companhia de Água e Esgoto do Rio Grande do Norte, que seria interesse da própria Odebrecht.

Cunha e Alves também receberam propina para agir em prol dos interesses da Carioca Engenharia, por meio de doações legais no valor de R$ 400 mil para a campanha de Alves. A denúncia aponta, ainda, que a Andrade Gutierrez doou R$1,25 milhão ao diretório do partido - R$ 100 mil diretamente para a conta de Alves - para que Cunha atuasse na alteração de medida provisória sobre tributação do lucro de empresas brasileiras no exterior.

Sobre o crime de lavagem de dinheiro, o MPF afirma que os repasses para a campanha de Alves eram feitos através de esquema montado com empresários, entre eles Queiroz e Arruda, que chegaram a usar empresas familiares, de aliados e de fachada para ocultar e dissimular a prestação de contas eleitoral. Os dois teriam contribuído com a estrutura organizada para lavagem por meio de "prestações de contas eleitorais, dos valores ilicitamente obtidos", diz a denúncia.

Condenações

A Procuradoria da República do RN requer a condenação de Henrique Alves por 12 crimes de corrupção passiva e 12 de lavagem de dinheiro; de Cunha por 11 crimes de corrupção passiva e 11 de lavagem de dinheiro; e de Léo Pinheiro por 7 crimes de corrupção passiva e 8 vezes de lavagem de dinheiro. Apenas Fred Queiroz e Arturo Arruda foram denunciados por organização criminosa pois, segundo o MPF, os ex-deputados e os executivos da OAS e Odebrecht já respondem por esse crime em outras ações.

Fernando Ayres, lembra a denúncia, fez acordo de colaboração premiada e, por isso, as penas serão aquelas previstas no acordo homologado pelo Supremo Tribunal Federal.

Os seis acusados foram condenados a pagar R$15,5 milhões por "reparação dos danos materiais e morais causados por suas condutas".

Defesas

Procurados, os advogados José Luis Oliveira Lima, de Léo Pinheiro, Rodrigo Rios, de Eduardo Cunha, e Marcelo Leal, de Henrique Eduardo Alves, disseram que ainda não tiveram acesso à denúncia. Lima e Rios afirmaram que só vão se manifestar nos autos.

O advogado Artêmio Azevedo, responsável pela defesa de Arturo de Arruda Câmara, disse que todo o valor pago a seu cliente foi decorrente de prestação de serviço ao então candidato a governador, Henrique Eduardo Alves. "A relação é somente de trabalho, e muito trabalho, e o valor está dentro do padrão normal de uma campanha

A defesa fez questão, ainda, de destacar que Arturo é um "reconhecido publicitário e profissional de altíssimo valor" e disse que vai demonstrar esse serviço "com notas fiscais e com a contabilidade da empresa".

A Andrade Gutierrez respondeu que "segue colaborando com as investigações em curso dentro do acordo de leniência firmado pela empresa com o Ministério Público Federal e reforça seu compromisso público de esclarecer e corrigir todos os fatos irregulares ocorridos no passado".

Já a Odebrecht disse que "entende que é de responsabilidade da Justiça a avaliação de relatos específicos feitos pelos seus executivos e ex-executivos" e disse que a empresa está colaborando com a justiça "no Brasil e nos países em que atua. Já reconheceu os seus erros, pediu desculpas públicas, assinou um acordo de leniência com as autoridades brasileiras, da Suíça, República Dominicana e com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, e está comprometida a combater e não tolerar a corrupção em quaisquer de suas formas."

A OAS e a Carioca Engenharia informaram, por meio de suas assessorias, que não vão comentar o caso.

A reportagem ainda não conseguiu contato com as defesas dos outros denunciados.

(Elisa Clavery).