Devido à falta de chuvas, os poços tubulares e mananciais que abasteciam Ibiracatu, no Norte de Minas, secaram. A população está sendo atendida em intervalos de três ou quatro dias com a água “buscada” por caminhão-pipa a 50 quilômetros de distância, no município vizinho de São João da Ponte. O sol forte também dizimou plantações, o que elevou o desemprego. Não bastassem essas agruras, os 6.150 moradores de Ibiracatu enfrentam outra angústia: a falta de um prefeito com mandato definitivo. Também não sabem quando será a nova eleição na cidade, uma das 10 em Minas governadas interinamente pelo presidentes da câmara municipal.
O ex-prefeito Orivaldo Alves de Oliveira (PP, ex-PR), que concorreu sub judice e venceu as eleições em 2016, foi impedido de tomar posse por problemas no registro de sua candidatura e na prestação de contas em mandato anterior. Com o impedimento de Orivaldo, assumiu a prefeitura em 1º de janeiro o vereador José Amador Mendes da Silva (PT), presidente da Câmara Municipal.
“Quando assumi, achei que ficaria dois meses (no cargo). Mas já se passaram mais de seis meses e até hoje nada foi definido”, afirma. “Assumi interinamente, mas com o mesmo espírito como se fosse para quatro anos, administrando os recursos com muita responsabilidade”, pondera o petista.
Por outro lado, ele admite que a interinidade acaba dificultando o trabalho como gestor. “Como o município só tem a prefeitura como empregadora, vou em busca de empresários, oferecendo algum incentivo, como a isenção de impostos, para que eles possam trazer empreendimentos para gerar empregos. Mas eles também ficam inseguros”, relata Amador.
Por causa do agravamento do problema da seca e falta de renda no campo, o prefeito interino recebe diariamente uma legião de pessoas em busca de emprego e de auxílio da prefeitura. Ele é procurado não somente no gabinete na acanhada sede da prefeitura (instalada numa casa antiga), mas na rua mesmo, como testemunhou a reportagem do Estado de Minas na última quarta-feira.
O prefeito interino “atendeu” na rua em frente à prefeitura o agricultor José Neto, o seu Zezinho, de 85 anos, que percorreu a cavalo cinco quilômetros de seu sítio na região da Fazenda Buritis até a cidade para pedir socorro. “Só tenho água para mais alguns dias e não sei como fazer”, disse, explicando que nos últimos meses recorreu a uma cisterna de captação de água da chuva que recebeu de programa federal, mas o volume do reservatório está chegando ao fim. “São cinco anos de seca seguidos. O capim acabou. Nunca vivi uma situação dessa”, lamentou o agricultor. O prefeito interino prometeu mandar água para seu Zezinho até este fim de semana.
PREOCUPAÇÃO COLETIVA Diante das incertezas, moradores afirmam que “a cidade parou”. “Parou a educação. Parou a saúde. Tá tudo parado na cidade. Quando chega alguém na prefeitura para cobrar as coisas, alegam que o prefeito não pode resolver porque é interino. A população sofre muito com isso”, lamenta a professora Eliane Pereira dos Santos, de 23.
“Esse negócio de prefeito ‘por enquanto’ é muito ruim. As pessoas vão lá na prefeitura em busca de ajuda e não conseguem nada”, emendou a aposentada Maria Gonçalves Pereira, de 66. O servente de pedreiro Adriano Rutheles Rodrigues Amorim reforça: “Está muito difícil. Na prefeitura, sempre dizem que não podem fazer nada e que as verbas não vêm porque o prefeito é interino”. Ele que defende a realização de nova eleição o mais rápido possivel.
Renê Ferreira Miranda, antigo comerciante de Ibiracatu, reconhece que o fato de o candidato mais votado na eleição de 2016 não ter sido empossado “atrapalhou o município”. Mas, acha que o prefeito interino deve continuar no cargo até o fim do mandato de quatro anos. “Não precisa ter mais eleição. Isso custa caro para o município”, opina. Renê tem a concordância do operador de máquina Denildo Antunes Guimarães: “É melhor deixar como está”.
José Amador afirma que a alegação de que “a cidade parou” é coisa espalhada pela oposição. Ele argumenta que mantém a prefeitura em funcionamento com o pagamento dos servidores em dia e que está indo atrás dos governos estadual e federal em busca de recursos para perfuração de poços tubulares e outras ações de combate à seca. Também garante que a educação “funciona perfeitamente” e nega a falta de medicamentos na unidade de saúde.
O prefeito interino disse que “nunca imaginaria” que um dia fosse assumir a chefia do Executivo. Mas gostou da função e admite que pretende concorrer à nova eleição de prefeito. Já Arley Ferreira Lima, que disputou e perdeu o pleito anulado de 2016, representando o grupo de Amador, atualmente, ocupa o cargo de secretário municipal de Planejamento e anunciou que não vai concorrer novamente, devendo declarar apoio ao nome do prefeito interino.
NOVO PARTIDO O ex-prefeito Orivaldo, que administrou a cidade por dois mandatos (2001/2008), venceu a eleição de 2016 com 2.410 votos (contra 1.979 votos de Arley). Ele foi impedido de tomar posse pela Justiça Eleitoral porque, durante a eleição, o partido em que estava filiado, o PR, lavrou ata da sua comissão provisória no município dando apoio ao adversário. O ex-prefeito também teve rejeitadas as contas de 2003 e 2004.
Orivaldo se prepara enfrentar novo pleito na cidade. Ele disse que foi vítima de “golpe” da direção do PR e que agora não tem mais problemas porque se filiou ao PP. Argumenta ainda que recorreu à Justiça comum contra a rejeição de suas contas. Sustenta que as contas foram rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) por “falhas simples” e de “ordem técnica”, que foram sanadas, sem causar danos ao erário. E, nesse caso, caberia à Câmara Municipal a aprovação. “As contas foram reprovadas pelos vereadores por questão política, para inviabilizar minha candidatura novamente. Além disso, para a reprovação, seriam necessários os votos de dois terços dos vereadores, o que não ocorreu”, alega Orivaldo.