Brasília – Com arrecadação em queda e despesas crescentes, o governo federal provê cada vez menos, embora continue gastando demais. Os cortes orçamentários atingem em cheio a prestação de serviços públicos e os programas sociais. Ao cidadão brasileiro recai o peso da fatura, mais alta por conta do aumento de impostos. Na saúde, o valor pago para o Programa de Atenção Básica despencou 80% entre janeiro e julho deste ano em relação ao primeiro semestre de 2016. A fiscalização da Polícia Rodoviária Federal caiu 28,6% nos últimos dois meses ante igual período de 2016, e as agências reguladoras não têm recursos para garantir que as empresas ofereçam serviços de qualidade à população. A Polícia Federal chegou a ficar sem verba para confeccionar passaportes e um funcionário do Ministério do Trabalho vazou que a fiscalização de trabalho escravo estava paralisada por falta de dinheiro. O Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) reduziu drasticamente os recursos para atendimento dos segurados.
A precariedade do serviço de atendimento por telefone saiu caro para o açougueiro Asiel Roberto da Silva, que quebrou a clavícula esquerda em uma queda, há 45 dias. Com o atestado médico em mãos, tratou de agendar a perícia médica, por meio do telefone 135. Ele diz que foram R$ 30 em créditos do celular somente para conseguir o agendamento. Segundo ele, a atendente do INSS não sabia quais os documentos o segurado deve ter em mãos no momento de agendamento do serviço. “Por causa disso, demorei muito para conseguir marcar a perícia”, lamenta.
DESPESAS
O secretário-geral e fundador da Contas Abertas, Gil Castello Branco, explica que o governo está fazendo ajuste fiscal nas despesas discricionárias (que não são obrigatórias) porque nos gastos primários a parte da Previdência Social compromete uma fatia cada vez maior do orçamento: de 53,7% em 2016 passará a 56,8% este ano. “A folha salarial representa outros 12,54% e houve aumento, por conta dos reajustes, de 11% de um ano para o outro, de R$ 147 bilhões para R$ 162 bilhões”, diz.
Como a receita minguou e cairá mais R$ 150 bilhões até 2018, conforme estimativa do ministro do Planejamento, Dyogo de Oliveira, o governo tenta minimizar o rombo ao cortar 30% das despesas discricionárias. O valor pago passou de R$ 55,4 bilhões de janeiro a julho do ano passado para R$ 38,8 bilhões no primeiro semestre deste ano. O alvo principal são os investimentos, mas sobra também para programas sociais e serviços essenciais. “Esse corte não faz nem cócegas no tamanho do rombo. E tem onde cortar mais. São 28 ministérios, 20 mil cargos de assessoramento. Se contar gratificações e comissões, vai a 100 mil cargos. O Congresso custa R$ 28 milhões por dia e o Judiciário paga auxílio-moradia para quem mora na mesma cidade”, comentou. O contingenciamento atingiu também as agências reguladoras, responsáveis por fiscalizar serviços essenciais, como telecomunicações, energia elétrica, transportes e saneamento. Algumas não têm mais dinheiro para pagar terceirizados, diárias, motoristas e fazer o atendimento.
AÇÕES
Os órgãos públicos minimizam os impactos dos cortes. O Ministério da Saúde diz que conseguiu descontingenciar R$ 6,3 bilhões do orçamento, o que garantiu, em 2016, a manutenção de todas as ações do Sistema Único de Saúde (SUS) previstas. “Sobre Atenção Básica, recentemente a pasta destinou R$ 1,7 bilhão para qualificar e ampliar o atendimento à população, ação que permitirá o custeio de novas ações no programa”, afirma, em nota.
O Ministério do Trabalho explica que tem buscado, junto ao Ministério do Planejamento, alternativas para que a área de fiscalização continue atuando. Já o INSS garante que o orçamento de R$ 1,5 bilhão permite a manutenção dos serviços prestados sem que haja perda na qualidade e prejuízos para o cidadão. Em 2015, o valor era de R$ 1,65 bilhão e, em 2016, de R$ 1,63 bilhão. “A autarquia vem promovendo mudanças nos seus fluxos e processos de trabalho com o objetivo de otimizar a aplicação de recursos públicos e gerar economias significativas”, justifica, em nota. Outras pastas procuradas pela reportagem não responderam.