Com o voto de minerva da presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, a Corte decidiu que o Judiciário tem o poder de afastar os parlamentares do mandato, mas as casas legislativas têm a palavra final. Na prática, por seis votos a cinco, a decisão confirmou que o Senado Federal deverá decidir se o senador Aécio Neves (PSDB) continua ou não nas funções do mandato. Após mais de 13 horas de sessão e muito embate, os ministros entenderam que medidas cautelares que possam comprometer o exercício do mandato precisam ser submetidas ao Legislativo.
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Sobre o recolhimento domiciliar noturno e outras medidas impostas a Aécio, de acordo com o voto da ministra Carmén Lúcia, não caberia interferência do Legislativo. Ela adequou o entendimento, porém, depois que os demais ministros disseram que tais sanções poderiam prejudicar o exercício pleno do mandato parlamentar.
Polêmica e questionamentos até o fim
O resultado do extenso julgamento foi alvo de discussão dos ministros antes da sua proclamação. Cármen Lúcia queria que somente o afastamento do cargo fosse submetido ao Legislativo.
Alexandre de Moraes ponderou que o recolhimento domiciliar noturno e a obrigação de não se afastar da comarca impediriam o parlamentar de exercer o mandato. Já Marco Aurélio Melo afirmou que as medidas cautelares transformariam o parlamentar em um “senador de segunda categoria”.
Separação dos poderes
A presidente do STF fez um discurso sobre a separação dos poderes e disse que não caberia ao Legislativo interferir em decisões judiciais. Porém, ela excepcionou a questão do mandato parlamentar. “Considero que o julgador, seja o STF ou órgão competente, poderá adotar (as medidas cautelares), mas no ponto específico (afastamento do mandato), como é algo entregue pelo eleitor, deverá encaminhar ao órgão competente para que se tenha a possibilidade de seguimento ou manutenção”, disse.
Antes, a ministra disse que as sanções penais são cabíveis a todos e que não há intocáveis na República. “Prerrogativa não é privilégio”, disse. Ela também afirmou que das decisões judiciais cabem recursos, mas não desacatos, para que não haja espaço para a impunidade.
Aécio Neves foi afastado do mandato e impedido de sair de casa à noite no âmbito da Operação Lava-Jato.
A decisão dos ministros do Supremo Tribunal Federal empatou por duas vezes.
Competência
Celso de Melo votou pela possibilidade de o Supremo Tribunal Federal afastar os parlamentares do mandato, sem a necessidade de o Congresso Nacional se posicionar. Segundo ele, cabe às casas legislativas relaxar as prisões em flagrante. “Estender essa competência e permitir a revisão por parte Legislativo das decisões jurisdicionais sobre medidas cautelares significa ampliar para além dos limites (esse poder)”. De acordo com ele, as decisões do Judiciário não estão sujeitas a revisão ou ratificação e sumetê-las a outros poderes seria uma degradação.
Antes de votar, Melo disse ter notícias de que o Congresso poderia descumprir a decisão do STF e fez um alerta. Segundo ele, o Supremo tem legitimidade para decidir sobre eventuais excessos e “no estado democrático de direito não há espaço para descumprimento de decisões judiciais”. O magistrado disse que não se pode minimizar o papel do Supremo Tribunal Federal.
Quando o julgamento estava em quatro a quatro, o ministro Marco Aurélio Melo desempatou. Para ele, as medidas cautelares não podem ser impostas aos parlamentares sem que o Legislativo decida sobre isso.
Críticas a Janot
Para justificar seu posicionamento, o ministro Gilmar Mendes fez várias críticas ao ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot e à delação da JBS, que culminou com a decisão da 1ª Turma do STF pelo afastamento do senador Aécio Neves (PSDB) do mandato. Ele votou pela impossibilidade de o STF suspender o mandato parlamentar como medida cautelar.
Toffoli votou pela possibilidade do afastamento de parlamentares do cargo somente em situações excepcionais.
Na mesma linha, Ricardo Lewandowski disse que a medida de afastamento deve ser submetida e aprovada pela maior parte dos integrantes a casa legislativa respectiva, que fará uma avaliação política. Para o ministro, as medidas cautelares devem ser permitidas em casos excepcionais, mas podem ser revistas pelo Legislativo.
Segundo a votar, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que algumas restrições são “idênticas a prisões cautelares”, e portanto não podem ser aplicadas pelo Judiciário sem ouvir o Legislativo.
Peixe pequeno
Os ministros Edson Fachin – relator da ação –, Luiz Fux, Luis Roberto Barroso e Rosa Weber tiveram o entendimento de que o Judiciário pode decidir pelo afastamento de parlamentares sem ouvir o Legislativo.
Rosa Weber alegou que a imunidade parlamentar visa proteger o mandato, e não o indivíduo. Segundo ela, submeter atos próprios do Judiciário a outro poder comprometeria o equilíbrio da harmonia entre os poderes.
Luis Roberto Barroso disse que retirar as sanções impostas ao senador Aécio Neves (PSDB) seria como reforçar a tese de que o STF só prende “peixe pequeno”.
Para ele, ao determinar o recolhimento domiciliar à noite, o STF apenas impede que o senador frequente “baladas e restaurantes”. “A pessoa não deve levar a vida como se nada tivesse ocorrido”, afirmou.