Brasília - A Câmara paga aposentadoria de até R$ 23.344,70 por mês para deputados cassados. Os benefícios são provenientes de um plano de previdência abastecido, em parte, com recursos públicos. Nove parlamentares que perderam o mandato por envolvimento em esquemas de corrupção ou improbidade administrativa recebem os pagamentos mensais - o valor mais baixo é de R$ 8.775,38.
As aposentadorias somam R$ 126.960,94 por mês e seu pagamento não é ilegal. Dos beneficiários desse montante, cinco deputados foram cassados em razão do escândalo dos anões do Orçamento - grupo acusado de receber propina de prefeitos e governadores em troca de liberação de recursos da União nos anos 1990 - e dois por causa do mensalão - esquema de compra de apoio político no Congresso, segundo a acusação, durante o primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O petista José Dirceu, cassado em 2005 por envolvimento no mensalão e agora condenado a 30 anos de prisão na Operação Lava-Jato, pode ser o próximo a receber o benefício.
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Além dos pagamentos feitos aos parlamentares cassados, a Casa também reserva uma pensão de R$ 937 à família de um deputado que era aposentado e perdeu o mandato durante a ditadura militar.
Procurados, os parlamentares cassados disseram que pagaram pelo direito de receber aposentadoria e rechaçaram o rótulo de "privilegiados".
A maior aposentadoria paga aos cassados é a do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), que perdeu o mandato em 2005 no mensalão.
Hoje, o teto da Previdência Social para aposentadoria do trabalhador da iniciativa privada, pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), é de R$ 5.531,31.
Regra
Até 1997, deputados e senadores se valiam de um plano fechado de previdência com regras mais benevolentes do que as atuais. Pelas normas antigas, do Instituto de Previdência dos Congressistas (IPC), o deputado com oito anos de mandato e idade mínima de 50 anos já podia pleitear o benefício. O valor da aposentadoria era proporcional ao tempo de mandato. Se ele tivesse completado o mínimo de oito anos, teria direito a 26% da remuneração mensal de parlamentar.
Com o fim do IPC, extinto em 1999 depois de registrar um rombo de R$ 520 milhões, a Câmara e o Senado ficaram responsáveis diretamente pelo pagamento dos benefícios.
Atualmente, parlamentares podem requerer a aposentadoria integral desde que comprovem 35 anos de contribuição e 60 anos de idade. O Plano de Seguridade Social dos Congressistas (PSSC) prevê o pagamento proporcional de aposentadoria conforme o tempo de mandato. O salário de um deputado é de R$ 33.763. Segundo o site da Câmara, só compensa a adesão ao plano caso o parlamentar fique ao menos cinco anos no exercício do mandato.
As contribuições funcionam com regras semelhantes às das entidades de previdência privada, nas quais os participantes pagam uma cota e a entidade patrocinadora contribui com uma cota equivalente.
Direito de receber
Deputados cassados aposentados pela Câmara afirmaram que pagaram pelo direito de receber os benefícios e rechaçaram o rótulo de "privilegiados". "Contribui todo mês", disse Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), que perdeu o mandato durante o escândalo dos anões do Orçamento.
Ele é um do caso dos parlamentares que se aposentaram com as regras do plano antigo, mais benevolente aos deputados. Hoje deputado estadual no Rio Grande do Sul, Ibsen Pinheiro recebe aposentadoria de R$ 12.070,27 por mês. O peemedebista cumpriu quatro mandatos e pagou o plano de previdência nos três primeiros. O deputado destacou que seu benefício é proveniente de um fundo privado.
Jerônimo Reis (PMDB-SE) foi cassado em 2010 por improbidade administrativa e recebe R$ 18.690,24. Segundo o deputado cassado, foram três mandatos de contribuição com parcelas superiores a R$ 3 mil. O ex-parlamentar defende a reforma do sistema previdenciário. "A gente sabe que a nossa Previdência não aguenta", disse Reis.
Hoje comerciante no município de Lagarto (SE), Reis não se considera um privilegiado.
Reis também concorda com a concessão do benefício a Dirceu. "Se ele tem direito, é um direito", afirmou.
Maior beneficiário entre o grupo de deputados cassados, Roberto Jefferson (PTB) afirmou que prestou serviços como deputado por 24 anos e contribuiu para o plano durante todo o período. Antes de assumir a função, Jefferson explicou que contribuiu por 20 anos para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) como empregado da iniciativa privada e autônomo. Seu benefício é maior, segundo sua assessoria de imprensa, porque ele se aposentou por motivo de doença e por isso não recolhe Imposto de Renda.
Algoz de Dirceu no escândalo do mensalão, Jefferson também demonstrou concordar com o pleito do petista. "Por que seria diferente para o ex-ministro José Dirceu, se ele contribuiu de fato para o INSS como deputado?", respondeu via assessoria de imprensa. O Estadão/Broadcast procurou os outros ex-parlamentares, mas não conseguiu localizá-los.
Pensão
A única pensão paga pela Câmara a parlamentar cassado com direito a aposentadoria é para viúva de Francisco Pinto (MDB-BA), morto em 2008. Durante o regime militar, ele foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a seis meses de detenção e perda dos direitos políticos por "ofensa moral" ao general Augusto Pinochet, ditador chileno. Pinochet estava no Brasil para a posse do general Ernesto Geisel, em 15 de março de 1974.
O parlamentar perdeu o mandato por ter feito um discurso criticando a presença de Pinochet no País.
Na véspera da posse de Geisel, o deputado, conhecido pelos colegas como Chico Pinto, foi à tribuna da Câmara criticar a ditadura chilena. "Para que não lhe pareça, contudo, que no Brasil todos estão silenciosos e felizes com sua presença, falo pelos que não podem falar, clamo e protesto por muitos que gostariam de reclamar e gritar nas ruas contra a sua presença em nosso País", discursou.
O STF condenou Chico Pinto por insulto um chefe de Estado estrangeiro. Ele voltou à Câmara em fevereiro de 1979, após ser eleito no ano anterior. Foi reeleito em 1982 e, em 1984, votou a favor da emenda Dante de Oliveira, que previa o restabelecimento das eleições diretas. A viúva de Chico Pinto, Thaís Alencar, não foi encontrada pelo Estadão/Broadcast para comentar o assunto. Ela recebe R$ 937 por mês. .