O governo corre contra o relógio para aprovar a reforma da Previdência ainda este ano na Câmara, na esperança de a matéria ser analisada, sem sustos, no Senado, no início do ano que vem.
Mas, a depender dos senadores, o script imaginado está longe da realidade possível. Eles não estão dispostos a chancelar, às cegas, o eventual texto que vier a ser aprovado pelos deputados. “O sistema é bicameral.
O Senado vai debater e, se chegarmos à conclusão que são necessárias mudanças, elas serão feitas e o texto voltará para a Câmara”, avisou o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE). Se houver mudanças, o texto volta à Câmara.
Na esperança de diminuir atritos, Temer resolveu honrar o acordo feito com os senadores e mandou as mudanças na reforma trabalhista por meio de uma medida provisória e não projeto de lei, como queria o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
“O que ele quis mostrar? Que cumpre acordos políticos firmados. E que, ao atender o Senado, espera reciprocidade, na forma de rapidez, quando a reforma da Previdência chegar à Casa”, analisou um interlocutor político especializado na relação entre os poderes.
Paralelo a isso, o governo desidratou a proposta original, restringindo a reforma à idade mínima para aposentadoria (65 anos para homens e 62 anos para mulheres, com o estabelecimento de uma regra de transição); reduzindo o tempo de contribuição (25 para 15 anos); definindo um teto único de R$ 5,4 mil para aposentadorias nos setores privado e público; e excluindo os trabalhadores rurais e os inscritos no Benefício de Prestação Continuada (BPC). Pelos novos cálculos, a economia com esse texto segue importante, mas cai pela metade: R$ 400 bilhões em 10 anos, em vez dos R$ 800 bilhões planejados antes das alterações.
O Planalto e a equipe econômica têm pressa porque sabem que o calendário eleitoral coloca ainda mais pressão nessa tramitação. A Casa será renovada em 2/3 nas eleições do ano que vem, e muitos parlamentares pensam em concorrer aos governos estaduais.
A percepção no Legislativo é de que os senadores já assumiram um ônus pesado ao aprovar a reforma trabalhista e a PEC dos Gastos, tornando-se alvo de minorias barulhentas e com poder de influenciar votações.
Carentes
Outro ponto é que boa parte das lideranças políticas da Casa — a começar pelo próprio Eunício — é do Nordeste, uma das regiões mais carentes do país que ainda é reduto eleitoral do PT. Uma das vozes mais ativas contra o governo e a reforma é a do senador Renan Calheiros (PMDB-AL).
Ao lado do filho Renanzinho, governador de Alagoas, ele foi o anfitrião de Lula na excursão que o petista fez pelo Estado na caravana realizada após a condenação a nove anos e meio de prisão pelo juiz Sérgio Moro. “Não podemos ter pressa. Precisamos fazer uma reforma que seja, de fato, boa para o país. A gente morre e o país fica. Por isso, temos que fazer algo consistente”, completou Eunício.
Sem retorno
O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), trabalha com a ideia de que o texto não retorne para a Câmara. Ele reconhece que 2018 será complicado. Em março abre-se uma janela partidária, em abril é o prazo para desincompatibilizações e, a partir daí, as convenções, as alianças e os acordos políticos começarão a tomar conta da agenda política.
Jucá já está às voltas com as dificuldades na aprovação do projeto de lei da privatização da Eletrobras, na qual tem a certeza de que enfrentará problemas não apenas na oposição, mas também com integrantes da base.
Nomes como Eduardo Braga (PMDB-AM), Renan, Kátia Abreu (PMDB-TO) e Roberto Requião (PMDB-PR) farão bastante barulho. Em relação às palavras de Eunício quanto à reforma da Previdência, a análise de interlocutores do líder governista é de que o peemedebista busca se posicionar entre seus pares, tentando passar uma imagem de independência em relação ao Planalto.
Eunício ainda não decidiu se tentará novamente concorrer ao governo do Ceará — em 2014 foi derrotado por 50 mil votos — ou busca a reeleição para o Senado, o que lhe daria o direito de pleitear mais dois anos como presidente da Casa.
“Não falamos por hipótese, apenas quanto ao mérito. Após os deputados votarem a reforma, reunirei a bancada para definir nossas propostas”, confirmou o líder do PMDB na Câmara, Raimundo Lira (PB).
“Mas é evidente que esse tema é delicado, e suscita uma série de questionamentos, e traz problemas para o consenso”, admitiu o peemedebista. O presidente nacional do DEM, senador José Agripino (RN), endossa as palavras de Eunício e Lira.
“O Senado precisará discutir um tema, apresentar suas propostas e construir uma reforma que seja boa para o país”, resumiu ele. “Pode ser que a Câmara, se conseguir votar, aprove um texto sem retoques e não precisemos alterar nada. Mas, ainda assim, é de esperar um debate intenso ”, adiantou o senador do DEM.
A novela de uma reforma ministerial
O presidente Michel Temer pode rever a estratégia de fazer uma ampla reforma ministerial até meados de dezembro, como pretendia inicialmente. Alguns aliados alertaram que talvez o mais prudente, agora, seja promover mudanças pontuais, aproveitando, sobretudo, o desembarque dos ministros do PSDB.
E deixar para abril do ano que vem, prazo legal para desincompatibilização dos ministros candidatos, a reforma mais efetiva. A linha de corte das eleições ainda é considerada o principal critério, defendido pelos principais auxiliares de Temer: os ministros Moreira Franco (Secretaria-Geral) e Eliseu Padilha (Casa Civil). Alguns ministros ainda não decidiram se serão ou não candidatos, caso de Henrique Meirelles (Fazenda), Gilberto Kassab (Comunicações) e Marcos Pereira (Indústria e Comércio Exterior).