São Paulo, 23 - Paulo Dionísio de Vasconcelos tinha 34 anos e era segundo-secretário da embaixada brasileira em Haia, na Holanda, quando o encontraram em seu Lancia Fulvia com um corte profundo no pescoço. Era 4 de agosto de 1970. Em 24 horas, a polícia holandesa concluiu que se tratava de suicídio - havia uma lâmina de barbear em uma poça de sangue no carro e testemunhas diziam não ter visto ninguém, além do diplomata, no carro. Em sua rapidez, a apuração desprezou provas de uma chantagem ou conspiração contra o diplomata. Como as pistas que levavam a um homem em Londres nunca foram investigadas, o caso foi encerrado para o alívio do Itamaraty.
Era uma época em que diplomatas se haviam tornado alvo das guerrilhas latino-americanas. Eles foram sequestrados e mortos em 1970. Na Guatemala, o embaixador alemão ocidental Karl von Spreti foi sequestrado e morto por guerrilheiros. No Uruguai, o cônsul brasileiro Aloysio Gomide era mantido em cativeiro pelos Tupamaros e, no Brasil, o embaixador alemão Erenfried von Hollenben, sequestrado pela Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) e pela Ação Libertador Nacional (ALN), havia sido solto em troca da libertação de 40 presos políticos.
Europa
A violência política também explodia na Europa. Meses antes, uma bomba fascista deixara 17 mortos e 80 feridos na sede do Banco Nacional da Agricultura, em Piazza Fontana, em Milão. Assim, quando a notícia da morte de Paulo Dionísio chegou a Brasília, o Itamaraty logo se viu diante de mais uma crise - naquele momento, guerrilheiros Tupamaros mantinham em cativeiro o cônsul Gomide.
A conclusão da polícia holandesa, afastando a hipótese de homicídio, nunca respondeu ao que teria provocado um diplomata se matar às vésperas do nascimento da sua segunda filha. Seus diários nada revelam, exceto a preocupação banal com a conta de telefone de um inquilino que ele teria de pagar em Brasília.
É aí que o trabalho do repórter Eumano ganha relevo. O contraste entre a dedicação de diplomatas à perseguição de opositores do regime é realçado pelo descaso com que são tratadas várias cartas enviadas a Paulo Dionísio - algumas das quais chegaram à embaixada após sua morte - por um misterioso remetente de Londres. Elas acusam o diplomata de ter participado de uma conspiração que levou um homem à prisão na Inglaterra e exigem que ele entre em contato com um escritório de advocacia londrino. Apesar das boas conexões da embaixada brasileira coma polícia londrina, nada foi apurado. Eumano descobriu que o escritório existia, assim como os advogados. Mas o mistério permanece: por que o diplomata morreu? A diplomacia do regime não quis indagar até o fim.
A MORTE DO DIPLOMATA
Autor: Eumano Silva
Editora: Tema Editorial
208 páginas,
R$ 35,00