O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, prepara uma plataforma eleitoral que tem como desafio traduzir a melhoria dos indicadores econômicos em benefícios para a população mais pobre. Na tentativa de fugir do rótulo de candidato do mercado e angariar apoio para uma campanha à Presidência em 2018, Meirelles começa a fazer inflexão no discurso e diz agora que é favorável a um "reforço" nos programas sociais, principalmente no Bolsa-Família.
Para o ministro, o projeto lançado no governo do petista Luiz Inácio Lula da Silva e mantido pelo presidente Michel Temer deve ser ampliado e até mesmo reajustado "dentro das possibilidades orçamentárias". Em palestras, Meirelles vem destacando que não há dicotomia entre ajuste de contas públicas, desenvolvimento e programa social.
A mudança de tom é uma vacina contra as já esperadas críticas de que, se ele entrar na corrida eleitoral, será o "candidato do arrocho". Com uma retórica mais social, Meirelles luta para se consolidar como postulante de centro-direita na disputa, com aval do Palácio do Planalto, desbancando o governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP), que pleiteia essa vaga.
Munido do slogan "A melhor política social é o emprego", o ministro se movimenta para mostrar que sua preocupação vai além dos áridos temas econômicos, exibindo um estilo "gente como a gente".
No dia 4, por exemplo, após sair de uma palestra na Fundação Getúlio Vargas (FGV), no Rio, ele entrou em um supermercado com o ex-presidente do Banco Central Carlos Langoni e abordou consumidores que empurravam carrinhos de compra. "E os preços aí como estão? Pararam de subir?", perguntou ele, para espanto de fregueses que viram um Meirelles sorridente. A resposta não foi bem o que queria ouvir. "Continua tudo muito caro", disse um cliente. "Pela hora da morte", resumiu outro.
No supermercado, Meirelles constatou o que as pesquisas indicam: embora a inflação e os juros estejam em queda, os números não refletem uma sensação de bem-estar social. Ao contrário, há mau humor generalizado.
Equipe
A cena foi registrada por uma equipe de filmagem, que tem acompanhado os passos do ministro há cerca de um mês, desde que promoveu mudanças em seu perfil nas redes sociais. Segundo o Ministério da Fazenda, a equipe foi contratada por Meirelles para cuidar de sua conta no Twitter. Está à frente da equipe o publicitário Fábio Veiga.
Filiado ao PSD, Meirelles será a estrela do programa do partido, que vai ao ar na próxima quinta-feira, em rede nacional de rádio e TV. Ali vai vestir o figurino do gestor de resultados, que está conduzindo a transição do caos econômico para a retomada do crescimento e do emprego. "Só vai dar Meirelles", disse o presidente do PSD e ministro, Gilberto Kassab.
Com apenas 2% das intenções de voto, de acordo com as mais recentes pesquisas, o ministro da Fazenda se aproximou do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) - seu aliado na defesa da reforma da Previdência, que teve a votação adiada para fevereiro. Além disso, mantém diálogos frequentes sobre a construção de um projeto eleitoral com o PMDB de Temer, com o DEM e com siglas do Centrão, como o PRB, o PP, o PR e o PTB.
Em conversas reservadas, Meirelles não descarta a possibilidade de mudar de partido até março, mas somente se for necessário para empinar sua candidatura ao Planalto. Já avisou, também, que não aceita de jeito nenhum ocupar o posto de vice. A todos que lhe perguntam, abre um sorriso e encerra o assunto. "No passado, considerei seriamente a hipótese de ser vice, mas essa fase já passou", repete.
As articulações do DEM para lançar Maia à sucessão de Temer causaram estranheza à equipe de Meirelles. O presidente da Câmara vive dizendo que será candidato à reeleição, com o plano de continuar no comando da Casa, mas seus movimentos parecem mirar no Planalto.
"O eixo de poder passa pelo Rodrigo e os nomes da centro-direita precisam ser testados nos próximos meses", afirmou o líder do DEM na Câmara, deputado Efraim Filho (PB). Na semana passada, Meirelles se reuniu com o prefeito de Salvador, ACM Neto, outro "presidenciável" do DEM.
Retórica
Apesar da retórica otimista, governistas não acreditam mais que Temer emplacará a reforma da Previdência, em 2018. Nos bastidores, Meirelles afirma que, se as mudanças nas aposentadorias não forem aprovadas, a campanha será marcada por um clima de desconfiança, que tornará o desempenho da economia suscetível aos efeitos das pesquisas. A previsão negativa embute uma estocada no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que disse estar disposto a rever a reforma, caso seja eleito.
Quando empresários querem saber de Meirelles sobre sua disposição de atacar Lula no palanque, após ter sido presidente do Banco Central nas duas gestões do petista, ele não se faz de rogado. "Temos hoje posições diferentes sobre política econômica." E arremata: "E naquela época também tínhamos".
Convencido de que, para sobreviver na arena política, terá de apontar fragilidades dos rivais, o ministro da Fazenda põe na linha de tiro o deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ), pré-candidato à Presidência. "Para mim não está claro qual é a política econômica do Bolsonaro", disse, em entrevista a uma rádio.
A portas fechadas, Meirelles franziu o cenho, na sexta-feira, quando um amigo perguntou se ele admitia coincidências do destino reservadas a ocupantes da Fazenda. "Por quê?", reagiu o atual titular da pasta. "Porque Fernando Henrique ajudou a organizar a economia no governo Itamar Franco, após um impeachment, e chegou à Presidência", lembrou o interlocutor. Meirelles não esticou a conversa. "Foi ministro da Fazenda, candidato e ganhou. Ótimo!", concluiu, rindo. Ninguém ficou sabendo se ele acreditava ou não na repetição da história.
Procurado, Meirelles disse que só vai decidir se será candidato em março.